"As primeiras paixões deixam sempre lembranças pueris da inocência da infância. Há muitas, hoje em dia talvez cada vez menos, que perduram no tempo e nos acompanham até à idade adulta. O futebol é um destes casos. Há quem se desiluda e se distancie da coisa amada por uma série de vicissitudes que a rodeiam. Mas está semana, quem gosta de futebol, em dois dias seguidos, recebeu dois beijos na boca daqueles que reacendem qualquer fogo.
Ainda nos estávamos a levantar da primeira vénia ao Liverpool e já estávamos a vergar outra vez as costas para a fazer ao Tottenham.
Entre reds e spurs podemos encontrar muitos heróis da nossa meninice, como o Homem (que pareceu) invencível aos olhos dos jogadores do Barcelona, Origi no quatro golo dos rapazes de Anfield ou o Tom Sawyer Lucas Moura em correrias loucas para os três golos loucos que deixaram o Ajax a limpar... lágrimas. Mas também do lado dos derrotados se pode encontrar traços da infância. No Barça, aquela tendência infalível de dar a bola ao melhor da rua (Messi) quando estávamos apertados; nos holandeses aquela irresistível pulsão de irmos para a frente fazer o último golo e nos esquecermos que um sofrido deixa o refresco de prémio do outro lado. Todas estas memórias de infância são boas, doces.
Muito mais amargo continua a ser quem consegue ultrapassar recalcamentos de infância e culpa tudo e todos pelos seus desaires, menos o principal réu - ele próprio. Mas isso é por cá. Lá fora, os homens da bola devem ter tido infâncias muito mais felizes. Ou cresceram. Esta parece ser a hipótese mais viável."
Hugo Forte, in A Bola
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