Últimas indefectivações
quinta-feira, 13 de maio de 2021
Fim de época...
Benfica 82 - 95 Sporting
26-32, 16-20, 14-30, 26-13
Derrota esperada, com um 3.º período horrível, num jogo onde ficou demonstrado que não temos 'equipa' a defender e a atacar! E com o adversário acima dos 50% nos triplos!
Fala-se em revolução na secção, e se acontecer já vem atrasada! Só espero que desta vez, não se faça sabotagem interna ao treinador que vier... como aconteceu na última vez!
Fim de semana preenchido
"As épocas nas diversas modalidades coletivas encaminham-se para o seu epílogo, com algumas delas já concluídas ou decididas. Entre estas últimas destacamos os títulos nacionais conquistados no voleibol, nos homens, e basquetebol (inédito), futsal (tetra) e polo aquático (bi), nas mulheres, além do desempenho meritório, também no feminino, da nossa equipa de voleibol, que, em ano de regresso muito aguardado à Primeira Divisão, terminou o Campeonato no 4.º lugar.
Ao longo dos próximos dias serão várias as nossas equipas em ação, sendo que grande parte do mediatismo recairá, naturalmente, no dérbi do futebol sénior (sábado, 18h00, na Luz). O objetivo é vencer. A equipa B visitará a Académica (domingo, 16h30) e a equipa feminina receberá o Clube Condeixa (domingo, 16h00) na penúltima jornada da fase de apuramento do campeão.
Em hóquei em patins, no Luso, a nossa equipa entrará no rinque às 21h00 de sábado para tentar carimbar o acesso à final da Liga Europeia tendo por adversário o Sporting. Recordamos que nos apurámos para a final four após a eliminação de Barcelona e Liceo da Coruña. A final está agendada para domingo, no mesmo local. A equipa feminina será a anfitriã do desafio com o CH Carvalhos (domingo, 15h00).
E hoje haverá ainda outro dérbi, mas em basquetebol. Trata-se do terceiro jogo das meias-finais dos play-offs da Liga Placard. Em caso de triunfo benfiquista, o quarto jogo está agendado para sábado (16h30).
No andebol haverá clássico na Luz (sábado, 14h30), englobado na 27.ª jornada. Estamos a quatro pontos da liderança (em igualdade pontual com o segundo classificado), com 24 vitórias e apenas duas derrotas. No mesmo dia, a equipa feminina receberá o ND Santa Joana (19h00). Também a quatro pontos da liderança, mas com menos um jogo disputado, a luta pelo título, que não conquistamos desde 1993, continua acesa.
No futsal disputaremos, com o Braga, na Luz (sábado, 20h30), o segundo jogo dos quartos de final dos play-offs. Na primeira partida, realizada em Braga, vencemos por 1-4. Se necessário, o terceiro jogo acontecerá no dia seguinte, também na Luz (20h00).
Serão muitos os jogos para apoiarmos, mesmo que à distância, o Glorioso.
De Todos Um, o Benfica!"
Excepções!!!
"12 mil ingleses nas bancadas do Dragão para ver a final da Champions League. A que horas é que o SL Benfica exige adeptos na final da Taça de Portugal e alteração do horário? Vai ter de ser o SC Braga a fazer barulho outra vez?"
Alibi...!!!
"Ontem, a Liga de clubes anunciou que os jogos da 34.ª e última jornada da I Liga portuguesa de futebol vão poder contar com 10% da lotação dos estádios, com adeptos da equipa da casa e teste negativo à covid-19.
Resumindo: FC Porto e Sporting jogarão nos seus estádios com o apoio dos seus adeptos. O SL Benfica não, pois defrontará o Vitória de Guimarães no Estádio D. Afonso Henriques.
Um factor tremendamente injusto para as equipas que jogam fora e que ainda procuram atingir objectivos. Há equipas a lutar por um lugar de acesso directo à Liga dos Campeões, por lugares europeus e pela fuga à descida de divisão, e, desta forma, as que jogam em casa irão ter essa - inequívoca - vantagem.
Paulo Meneses, presidente do Paços de Ferreira, afirmou que esta manobra é uma tentativa de branquear as celebrações do título do Sporting, com milhares de pessoas nas ruas sem distanciamento. O BnrB concorda e acrescenta: será, igualmente, para justificar público na final da Liga dos Campeões que se irá disputar no Estádio do Dragão?"
A equipa que foi autora da sua própria História
"Nesta época não tem havido muitos motivos de orgulho para os benfiquistas. No entanto, no último fim-de-semana, escreveu-se mais uma página na história do SL Benfica. A equipa de basquetebol feminino da história do Sport Lisboa e Benfica conquistou nos Açores o primeiro campeonato da sua história, ao derrotar o União Sportiva numa final emocionante, que se resolveria apenas na “negra”.
O SL Benfica refundou o basquetebol feminino na última década, alcançando duas subidas de divisão em dois anos. Após o regresso ao escalão maior do basquetebol nacional, o SL Benfica andou várias épocas mergulhado no meio da tabela, tendo finalmente nesta época construído uma equipa capaz de lutar por títulos, numa época que culminou com a conquista de uma inédita dobradinha.
Para esta temporada, a equipa procedeu a uma alteração no comando técnico da equipa, com Isabel Ribeiro dos Santos a ser substituída por Eugénio Rodrigues. O treinador de 51 anos, chegou do Olivais FC, clube ao serviço do qual conquistou todos os troféus oficiais a nível nacional.
Os reforços do plantel seriam a base Carolina Gonçalves que chegaria do Algés; a jovem Ana Barreto vinda da Quinta dos Lombos; a extremo internacional portuguesa Laura Ferreira, que regressou a Portugal depois de ter jogado nos EUA e em Espanha; e as norte-americanas Japonica James e Altia Anderson, ambas oriundas do college.
Começada a época, a equipa não demorou muito tempo a mostrar que era das equipas mais fortes do campeonato e que a conquista de títulos era um objectivo real. O primeiro ponto alto da temporada, chegaria no dia 14 de Março de 2021, onde a equipa de basquetebol feminino do SL Benfica conquistou a primeira Taça de Portugal da sua história.
Depois de ter eliminado o CR Esgueira e o Guifões nas primeiras eliminatórias, o SL Benfica organizaria a Final Four no seu pavilhão, derrotando o União Sportiva nas semi-finais, num jogo frenético que terminaria apenas prolongamento com uma vitória por 86-77. Na final, o SL Benfica derrotaria o Vitória SC de uma forma expressiva por 85-63, conquistando o primeiro troféu da temporada.
O SL Benfica terminaria a Fase Regular da Liga Skoiy no segundo lugar em igualdade com o União Sportiva (18 vitórias e 4 derrotas, mas com desvantagem no confronto directo), tendo de defrontar o AD Vagos nos quartos-de-final do play-off. O SL Benfica derrotaria o clube do distrito de Aveiro com duas vitórias sem resposta por 50-72 em Vagos e por 93-78 na Luz.
Seguindo-se a Quinta dos Lombos nas meias-finais, o SL Benfica conseguiria uma vitória surpreendentemente tranquila em Carcavelos por 43-63. Porém, no segundo jogo, a equipa sofreu um duro revés com a grave lesão da poste Altia Anderson (que falharia o resto da época), acabando por ser derrotada por 64-69. A equipa encarnada acabaria por levar a melhor na “negra” com uma vitória por 75-73.
A final seria disputada contra o União Sportiva, que tinha eliminado o Guifões e o Vitória SC nas rondas anteriores, para além de deter o factor-casa, também possuía o peso histórico a seu favor, visto que conquistara três dos últimos cinco campeonatos.
No entanto, em mais uma prova de superação, o SL Benfica realizou uma das melhores exibições da temporada no primeiro jogo na Luz, ao derrotar as açorianas por 91-72, num jogo onde, mesmo com a ausência de Altia, conseguiram equilibrar a luta nas tabelas, com as açorianas a terem apenas mais três ressaltos no jogo que as encarnadas.
No segundo jogo a ser disputado nos Açores, com a presença de público nas bancadas, a equipa da casa mostrou que não estava na final por acaso, conseguindo uma vitória por 85-72. Apesar de termos assistido a um confronto equilibrado, a diferença esteve sobretudo na eficácia no lançamento de três pontos, com a equipa do União Sportiva a ter um total de 16 lançamentos triplos convertidos e 47% de eficácia.
Com a “negra” a ser disputada no dia seguinte, assistimos a mais um jogo muito equilibrado em que o desgaste físico e mental se fez sentir em ambas as equipas. Com a vantagem a alternar entre ambas as equipas, o resultado final seria selado com um triplo de Joana Soeiro ainda a mais de três minutos do fim.
Daí para a frente, assistimos a um período em que as jogadoras de ambas as equipas acusaram o cansaço, jogando mais com o coração do que com a cabeça. No último suspiro do encontro, a norte-americana Nausia Woolfolk rouba a bola a Laura Ferreira e faz o lançamento de 3 pontos sem qualquer oposição, mas a bola não cai no cesto, Mariana Carvalho ganha o ressalto defensivo e soa a buzina final. 73-76 a favor das encarnadas, com a equipa visitante a fazer a festa juntamente com a meia-dúzia de adeptos benfiquistas que marcaram presença no Pavilhão Sidónio Serpa.
A equipa do Sport Lisboa e Benfica fez história em dose dupla, ao conquistar o primeiro campeonato e a primeira Taça de Portugal da sua história, obtendo assim a sua recompensa pela sua qualidade, pela sua entrega e pela sua atitude competitiva. Agora, há-que dar o breve destaque às figuras desta equipa.
A base e capitã Joana Soeiro era o motor da equipa dentro da quadra. Dona de uma visão de jogo apuradíssima, a base internacional portuguesa faz muitos estragos com os seus passes teleguiados, seja no pick n’roll ou em transições ofensivas a lançar as colegas em profundidade. Joana Soeiro terminou a época como a jogadora com maior média de assistências no campeonato (5,5).
Na sombra da capitã, estava a jovem Marta Martins. A atleta formada no clube era uma das principais jogadoras na rotação, sendo que pela sua forma de jogar, nota-se que tem aprendido muito com Joana Soeiro. Dona também de uma grande visão de jogo e capacidade de passe, Marta Martins teve a quarta melhor média de assistências no campeonato (3,5), mas das jogadoras que ocupavam o Top-5 nesse dado estatístico, era aquela com a média de minutos de jogo mais baixa (22 minutos).
Na posição de base-extremo, Mariana Carvalho era a habitual dona do lugar no onze. A jovem de 20 anos é uma jogadora bastante versátil ofensivamente, sendo capaz de pontuar tanto na penetração e ataque ao cesto, como no lançamento exterior. Terminou a época com 50% de eficácia no lançamento de dois pontos e 37% de eficácia nos triplos. Na sua sombra havia Carolina Gonçalves, que seria também uma aposta habitual na rotação, até que uma lesão no ombro a afastou da competição desde Fevereiro.
Na posição 3 estava uma das jogadoras mais importantes da equipa. A luso-brasileira Laura Ferreira foi uma das contratações sonantes da equipa e rapidamente se assumiu como uma jogadora importantíssima no modelo de jogo da equipa. Sendo uma jogadora completa e fundamental nos dois lados do campo, a extremo de 25 anos é daquelas jogadoras que não se importa de se “sacrificar” em prol do colectivo, cabendo-lhe muitas vezes a tarefa de marcar as jogadoras adversárias mais perigosas. Laura Ferreira é daquelas jogadoras que joga para a equipa e não para as estatísticas.
A norte-americana Japonica James foi uma das grandes figuras da equipa e do campeonato. Dona de uma presença física impressionante, a extremo-poste possuía algumas limitações técnicas, procurando usar o físico para se superiorizar na lua nas tabelas e no jogo de costas para o cesto. Foi a MVP do jogo do título (22 pontos e 9 ressaltos) e foi ainda a jogadora com a terceira melhor média de pontos (17,8), quarta melhor média de ressaltos ofensivos (3,8) e a segunda melhor eficácia no lançamento de dois pontos (57%).
Por outro lado, a poste Altia Anderson era um excelente complemento a Japonica. Não sobressaía em nenhum gesto técnico do jogo em particular, mas sabia fazer um pouco de tudo e que aparecia quando a equipa mais precisava. Terminou a época com médias de 12 pontos, 7,5 ressaltos e um desarme de lançamento.
Na rotação, há um destaque para mais duas jogadoras. Mariana Silva era a principal opção para a rotação interior e não sendo tão reconhecida como outra jogadoras, era uma jogadora muito importante para a equipa, como ficou provado com o título de MVP na final da Taça de Portugal. Apesar de ser uma jogadora alta, também é muito rápida e muito habilidosa com a bola na mão, sobretudo a fazer fintas curtas em zonas debaixo do cesto, sendo uma jogadora muito eficaz nos lances livres e nos lançamentos de meia distância. Uma Mariana Silva inspirada em jogos de alto nível é meio caminho andado para a vitória.
Destaque ainda para Ana Barreto. Uma jovem de apenas 17 anos, que ao longo da época foi ganhando espaço nas opções do treinador, sendo uma jogadora que foi opção nos jogos de maior grau de dificuldade de modo a continuar a crescer e a aprender. Será uma jogadora a ter em atenção e que tem tudo para se tornar um caso sério no curto/médio-prazo.
No planel encarnado ainda havia ouras jovens jogadoras que não jogavam com tanta regularidade, tais como Cyntia Dias, Chana Paxixe, Ângela de Castro e Carolina Aguiar. Mas não posso deixar de mencionar a veterana Sofia Ramalho Gomes. Aos 40 anos, a base poveira regressou ao activo e mesmo sem jogar com muita regularidade, teve um papel importantíssimo no balneário e na liderança do grupo de trabalho, sendo um grande auxílio para a equipa técnica nesse aspecto.
Quanto ao treinador Eugénio Rodrigues, só tenho a dizer que é o homem forte por detrás deste projecto. Um treinador que concilia as competências técnico-tácticas, as capacidades de liderança e o compromisso e a identificação com o SL Benfica e com a equipa que liderava, construindo uma equipa unida, coesa, agressiva defensivamente e muito inteligente e gerir os momentos do jogo e a controlar a posse de bola.
Como disse a capitã Joana Soeiro: “equipas não se sagram campeãs em finais. Elas vão se tornando grandes dia após dia, trabalhando arduamente e ultrapassando cada obstáculo em vez de os usar como desculpa para desistir das suas ambições.”
Esta citação também diz muito da entrega, espírito de equipa e compromisso desta equipa, que não se deixou abater pelas adversidades, indo sempre à luta com as armas que tinha, conseguindo uma Dobradinha bastante saborosa. Agora, é preciso dar continuidade a este projecto. Continuando a manter esta base e apostando na competência e na dedicação, o futuro desta modalidade poderá vir a ser muito risonho."
Dentes voando em redor do quatr’olho
"Jef Jurion, que jogava sempre com óculos de massa, foi o primeiro a chegar junto ao companheiro que parecia ter sido atacado por rinocerontes
No dia 30 de setembro de 1964, no Bosuilstadium, em Antuérpia, havia dois moços que sentiam ligeiramente deslocados. O primeiro chamava-se Guy Delhasse, tinha 31 anos, e era guarda-redes. Nunca foi grande espiga, assinale-se, mas ainda assim pôde orgulhar-se por ter representado a seleção belga por sete vezes. As coisas não lhe correram de feição e dos sete perdeu seis jogos, sofrendo nada menos de 15 golos, mais do que um por partida, algo que, como se calcula, não o mergulhou num oceano de popularidade.
Nesse tal dia de setembro, iniciou o encontro contra os agora oficialmente designados por Países Baixos, como se o diacho da Bélgica fosse algum tipo de Países Altos, carregados de montanhas nevadas e de vales repletos de glaciares. Seria o penúltimo jogo de Guy pela Bélgica e tinham-lhe feito a vida negra na noite anterior com uma série de partidas e de pilhérias de levar ao desespero o mais pachorrento dos frades capuchinhos enviados para o Congo do Rei Leopoldo em serviço de missionário. A razão era infantilmente simples: Delhasse pertencia ao FC Liégeois e os outros dez que o treinador Constant Vanden Stock anunciara para entrarem em campo como titulares – George Heylens, Laurent Verbiest, Jan Plaskie, Jan Cornelis, Pierre Ranon, Jef Jurion, Jaques Stockman, Johan Devriendt, Paul Van Himst e Wilfried Puis – faziam parte da equipa do Anderlecht.
A despeito de os companheiros o fazerem sentir mais deslocado do que nunca, Guy engoliu as larachas e as ironias e foi-se a jogo com a coragem que costumava fazer parte da sua idiossincrasia. O encontro foi rijo, a raiar a violência, algo próprio de vizinhos que olham de esguelha um para o outro. Ferveu canelada, o árbitro italiano Lo Bello, um dos mais conceituados da sua era, ia fazendo reparos a todo o instante, mas as orelhas moucas de belgas e holandesas iam tornando a tarefa de dirigir o encontro cada vez mais difícil.
Estávamos em cima do intervalo quando Hennie van Nee, um avançado trapalhão do Heracles, de Almelo, entrou pera grande área belga com a delicadeza de uma manada de rinocerontes. Guy Delhasse nunca fora homem para se encolher, muito menos numa altura em que andava há dois dias a sofrer a galhofa por parte dos companheiros vaidosamente bruxelenses. O joelho de van Nee entrou-lhe pela placa dentária frontal espalhando em redor um incisivo central, um canino, o primeiro e o segundo pré-molares e um terceiro molar, deixando-lhe o beiço de baixo ao pendurão, agarrado à cara por uma ligeira fita de pele e o septo nasal numa posição deveras curiosa.
Guy não queria acreditar no que lhe tinha acontecido. Decorria o último minuto da primeira parte e começou a perspetivar toda a panóplia de cirurgias a que teria de ser submetido. Para o seu lugar entrou mais um jogador do Anderlecht, como se está mesmo a ver, um tal de Jan Trappeniers. Os olhos de Guy encheram-se-lhe de lágrimas reconhecidas enquanto a maca que o conduzia para fora do relvado ia sendo rodeada pelos seus companheiros folgazões, já sem muita vontade de rir, e dispostos a distribuir-lhe toda a solidariedade que, de repente, se soltara das suas almas arrependidas. Um gesto bonito, bem ao contrário da cara com que Guy passou a usar depois das diversas intervenções cirúrgicas.
O primeiro dos seus colegas a dirigir-se ao local em que Guy Delhasse vertia sangue como se lhe tivessem aberto as torneiras das carótidas, foi uma espécie de companheiro de desventuras – Jef Jurion. Era o capitão de equipa, mas não escapava, de forma alguma das facécias que os camaradas prepararam requintadamente para ele e para a sua galopante miopia.
Armand Joseph Jurion nasceu no dia 24 de janeiro de 1937, em Sint-Pieters-Leeuw. Aos cinco anos já não enganava ninguém: era a estrela da miudagem do Ruisbreck e não tardou a assinar contrato com o Anderlecht, ganhando a titularidade mal cumpriu 16 anos. Ainda me recordo de o ver jogar, aqui e ali, nas raríssimas transmissões televisivas que a RTP dava à malta à laia de rebuçados. Fortemente míope, Jurion não passava despercebido a ninguém dentro do relvado por ser o único jogador que utilizava óculos, daqueles de massa ou de casca de tartaruga.
De tempos a tempos, aproveitando o seu sono mais profundo, o caixa d’óculos ficava sem a caixa e sem os óculos, o que o impedia de jogar. A deficiência nunca minou a sua autoridade sobre os companheiros que, rapidamente, faziam voltar ao normal o mau feitio que a qualquer momento despontava. Depois, de óculos postos, gerindo o jogo como um médio de enorme qualidade, estava-se nas tintas para que lhe chamassem quatr’olhos. A bola era toda dele, mesmo que não a visse muito bem."
Sol na eira e chuva no nabal
"A hesitante reflexão que se segue (que, como obra de nabo, nunca poderia sair coisa por aí além), foi-me cochichada, noite dentro, pela barulheira ensurdecedora provocada pelo raivoso rosnar da matilha de comentadores, cuja principal nota comportamental parece ser a piromania - tudo no rescaldo do não menos hesitante critério do árbitro do último clássico da Luz entre o Sport Lisboa e Benfica e o FC Porto.
O que se pedia ao senhor árbitro, Artur, de seu nome, é que como rei se portasse, e, ao rei, bem sabemos que é a equanimidade e a imparcialidade o que, acima de tudo, se lhe pede - e que não tenha medo.
Pois medo foi o que mais parece ter abundado - até um cheiro nauseabundo se ter espalhado pelas bancadas frias de ausência. Um medo, aliás, que, uns dias antes, um grupelho de rufias a soldo de uma gratuita agitação, tratou de potenciar e dramatizar, espalhando intimidatórias frases pelos muros fronteiros ao centro de treino dos árbitros na Maia.
Ah, mas ele é imune a essas ameaças- proclamaram os iluminados da bola. Mas, como? Ninguém é - só um louco, ou alguém totalmente desprovido de consciência.
Antes do jogo, todos, em uníssono, o confirmaram no seu trono como o Rei Artur da arbitragem nacional. Mas, da mesma forma que o lendário herói britânico nunca existiu na realidade, também este nosso herói de Portus+cale (Porto belo, onde se procedia à descarga das pipas de vinho e, sabe-se lá, se de bolos também, porto que daria o nome de Portugal) , também este herói, dizia, nunca existiu- só como Artur concedemos que exista, de facto. Aliás e em rigor, nem como verdadeiro árbitro existe - que, para sê-lo realmente, teria que, à semelhança do que, na abertura da Olimpíada clássica, faziam os Hellanodikai, molhar as mãos no sangue do sacrifício e jurar arbitrar as provas com imparcialidade - e aí, o problema, justamente.
A inviabilidade funcional e deontológica - mãos sujas - advém do facto de este senhor ter as mãos na massa em dois tabuleiros em simultâneo: na tesouraria da Liga e no tabuleiro, propriamente dito, da sua pastelaria (que tem na sua localização a sua maior fragilidade).
Quando se jogam tantos milhões em noventa minutos, fazer vista grossa a uma entrada mais agressiva pode, num balanço final das hipóteses, significar um rombo de quarenta milhões.
Querer conciliar o inconciliável (“coincidentia opositorum”, Nicolau de Cusa) é pretender que o semáforo esteja simultaneamente verde e vermelho: estampanço pela certa! A sabedoria popular já há muito que lavrou a sentença para esta conduta excessiva: “quem tudo quer tudo perde”.
A atestar os perigos associados à condição de árbitro-empresário, já tivemos os episódios de vandalismo no talho do Mota - precedente que seguramente fez tocar todas as campainhas de alarme do sistema nervoso do Artur, menos o único que, face àquela entrada, deveria ter tocado - o apito. Mas uma pastelaria vale bem um silêncio!
É certo que todo o cidadão tem o direito de ser empresário, mas à hora de de conjugar a sua actividade empresarial com a profissão de árbitro de futebol profissional, deve estreitar o seu critério e ampliar a sua prudência:
Por que não uma funerária? Com certeza que ninguém iria arrear no defunto. Ou por que não uma sucateira? Seguramente que nenhum desses vândalos iria desperdiçar energia a partir o que já partido está.
O que parece certo é que o árbitro do clássico, ao tremer como tremeu, mais do que o celebrado Rei Artur, ele foi simplesmente o Sr Dias da Pastelaria.
Dia amargo do Soares!"
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