"Jorge Jesus fica ou não fica? Vai ou não para o Sporting? Aventura-se ou não no estrangeiro?
Vão Luís Filipe Vieira e Jorge Jesus acabar por se entender e assinar novo contrato no Benfica? Vai Jesus aceitar um salto no desconhecido mas ao mesmo tempo o enorme desafio de ajudar a transformar, por exemplo, o Sporting, o clube de que se fala como um dos que mais desejam o actual treinador encarnado? Estará Jorge Jesus a pensar seriamente na oportunidade de ir, por fim, trabalhar lá fora, num qualquer clube estrangeiro desde que de topo?
É verdade que, por vezes, nas perguntas também se encontram algumas respostas, mas não sendo o caso, a verdade é que ninguém pode saber, de momento, o que vai ou não acontecer com a relação de Jorge Jesus com o Benfica e, em particular, com Luís Filipe Vieira.
Podemos até ser levados a crer que o mais natural, o mais lógico, o mais esperado seria ver Jorge Jesus continuar a prolongar o seu contrato com a equipa que acaba de fazer bicampeã nacional. Mas não podemos ignorar os pequenos ou grandes sinais, deixados, por exemplo, no último domingo, sinais esses de sentido relativamente contrário pelo menos no que possa dizer respeito ao estado de espírito do próprio Jorge Jesus.
Será normal termos visto um Jesus tão contido em Guimarães, logo após terminar o jogo? Recordemos: enquanto os jogadores se juntavam próximo da bancada onde estava a maioria dos adeptos benfiquistas, Jesus irritou-se, primeiro, com uma figura do grupo (dizem-me que talvez o roupeiro...), a propósito não se sabe de quê, e foi, logo depois, para um dos bancos de suplentes, abraçou e beijou Rui Costa, sentou-se ao lado deste por alguns minutos, até abandonar o relvado e ser visto a entrar, sozinho, no túnel.
Mais tarde, já no Marquês de Pombal, será que também faz sentido termos visto Jesus entrar um pouco à frente do presidente Vieira naquele corredor vermelho pelo qual entraram um a um, muito à americana, portanto, os jogadores? Julgo que não faz sentido.
Num momento de tão fervorosa celebração - o Benfica não era bicampeão rigorosamente desde maio de 1984, para sermos precisos... - o que se esperaria era ver treinador e presidente de punhos erguidos e unidos, realmente eufóricos e não - como se viu sobretudo Jesus - tão contidamente felizes.
Provavelmente, as imagens de Guimarães, especialmente as imagens da bárbara e chocante agressão de que um pai e um avô foram vítimas diante das crianças da família por um agente da PSP que realmente merece todo o castigo que legalmente venha a ser-lhe aplicado, provavelmente, dizia, essas imagens terão arrefecido alguma euforia dos responsáveis encarnados, se realmente foram vistas antes da chegada dos novos bicampeões a Lisboa.
Admito, portanto, que até o presidente Luís Filipe Vieira pudesse reflectir no Marquês muito do choque por tudo o que soube ter-se passado em Guimarães, de tal forma que talvez já nessa altura tivesse tomado na sua cabeça a decisão (absolutamente relevante) de convidar aquela mesma família a estar presente, este sábado, na entrega da Taça de campeão à equipa, em pleno relvado da Luz.
Em todo o caso, é impossível não reconhecer que Jorge Jesus estava, desta vez, muito diferente do Jorge Jesus que no Marquês festejou louca e genuinamente o título há um ano. Muito diferente.
E quem sabe se uma das razões não estará, na verdade, nalguma mágoa que eventualmente possa Jesus sentir por não ter visto ainda o seu futuro resolvido no que ao Benfica diz respeito?!...
Claro que tem o Benfica, e em particular o presidente encarnado, todo o direito de escolher o momento de falar com o treinador, e ainda todo o direito de querer, eventualmente, encerrar o ciclo de seis anos com Jorge Jesus e abrir nova etapa com novo treinador. Vieira tem, no mínimo, o direito a sentir a consciência tranquila por ter sido o único responsável pela continuidade de Jesus nos últimos dois anos, e logo dois anos de tantos sucessos. Essa consciência tranquila ninguém, em boa verdade, pode tirar a Vieira, porque ele foi contra tudo e contra todos quando segurou Jesus após época de final intensamente dramático.
Acontece que os cenários mudam e hoje, ironia das ironias, todos parecem querer Jesus.
Percebe-se.
Em seis anos, Jesus ganhou três campeonatos para o clube, mais quatro Taças da Liga (pode ainda conquistar a quinta), uma Taça de Portugal e uma Supertaça, que não sendo um título reconhecido pela FIFA - chamam-lhe troféu - é, em Portugal, e para todos os efeitos evidentemente, um título.
Além disso, levou a equipa a duas finais da Liga Europa - a antiga Taça UEFA mas agora muito mais difícil de conquistar por ter muito mais jogos e mais exigentes -, finais europeias a que o Benfica não ia desde 1990, quando a equipa de Eriksson perdeu em Viena a Taça dos Campeões Europeus para o Milan.
E estas duas finais de Jesus não foram na verdade duas finais quaisquer.
Foram duas finais com dimensão, se considerarmos que a primeira foi com um poderoso Chelsea, que bem podia ter sido uma final da Liga dos Campeões, sem esquecer ainda que o Chelsea era aliás, na altura, o detentor do título máximo da UEFA;
... e que a segunda, tendo sido com um Sevilha menos mediático (mas que volta, este ano, à grande decisão), foi uma final atingida após superar uma fortíssima Juventus, como agora se comprova na presente edição da Liga dos Campeões.
Jesus ainda conduziu o Benfica uma vez aos quartos de final da Champions, em 2012, caindo mais uma vez aos pés do Chelsea (que viria a vencer a prova) numa eliminatória que levou o treinador encarnado a ter o seguinte desabafo: «Saímos muito frustrados. Sentimos que fomos muito melhores do que o Chelsea nas duas mãos. Não merecíamos perder.»
Jesus pode ter cometido (e cometeu certamente) erros ao longo destes seis anos, terá feito avaliações menos corretas e tomado algumas más decisões.
Mas dizer-se que com Jorge Jesus o Benfica não deixou marcas no futebol europeu é, no mínimo, muito injusto.
Só por ter deixado, aliás, é que Jesus é desejado lá fora. Porque o campeonato português, como sabemos, não tem grande expressão europeia. Infelizmente!"
João Bonzinho, in A Bola