"O tenente-coronel levou a mal. O tenente-coronel amuou. O tenente-coronel não apitou. O tenente-coronel não admite que questionem a sua competência. O tenente-coronel é, no entanto, um incompetente. O tenente-coronel é um militar que não quer saber das hierarquias. Para o tenente-coronel não há coronéis nem generais. Há ele e a sua petulância. O tenente-coronel não é um militar culto porque, como dizia o coronel Aventino Teixeira, militar culto só se for autodidacta. Por seu lado, o holandês-devorador-de-camarão-de-Espinho não gostou, ao que fazem crer certos repórteres de trazer por casa, das marisqueiras de Monte Carlo. D. Palhaço não teve desta vez influência suficiente para o arrastar para um repasto de lagosta, e o holandês-degustador-de-percebes-das-Berlengas também não apitou. Isto é, não apitou ao gosto dos habitantes desse país infecto e infectado chamado Palhaçaria, no qual vigora a lei de Oeste de Pecos e onde tudo vale menos praticar honestidade.
Aceitemos: foi uma semana de gargalhadas. Até D. Palhaço conseguiu ter graça no seu discurso arrastado e meio aéreo, tão próprio de quem tem assistido, de há muitos anos a esta parte, à invasão das circunvoluções do cérebro por uma numerosa comunidade de fungos. Que ele se tivesse posto na formatura de lado a lado com o tenente-coronel, não é de estranhar. Que o tenente-coronel estivesse de cócoras, também já é hábito. Quanto ao holandês-mastigador-de-ameijoa-da-Culatra, não faltará a oportunidade de apaziguar a situação. Dentro em pouco tempo será de novo encontrado numa marisqueira de Matosinhos a arrotar a navalheira e em estúpida galhofa com os empregados de D. Palhaço, achincalhando o infeliz esforço de uns espanhóis de segunda. E ninguém passará mais cartão ao tenente-coronel."
Afonso de Melo, in O Benfica