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sábado, 27 de dezembro de 2025

Até o Espanhol!!!

CAN 2025: valor económico vs rendimento em campo


"Os números do mercado ajudam a contextualizar a CAN, mas raramente explicam o que acontece dentro do campo. Os dados do Transfermarkt mostram diferenças enormes no valor económico das seleções ainda em competição — e é precisamente aí que o futebol africano desmonta leituras simplistas.
Marrocos lidera a hierarquia económica com um valor global a rondar os 435 milhões de euros, seguido de perto pelo Senegal (405 M€), Costa do Marfim (370 M€) e Nigéria (281 M€). No papel, este quarteto confirma o estatuto de favorito. No campo, essa condição só se valida quando o coletivo acompanha o talento individual.
Mais abaixo surgem realidades distintas. O Egipto, avaliado em cerca de 136 M€, mantém-se competitivo graças à sua organização, experiência e inteligência de jogo. A República Democrática do Congo, com aproximadamente 133 M€, continua a provar que clareza tática e compromisso coletivo conseguem equilibrar diferenças financeiras relevantes.
O contraste torna-se ainda mais evidente quando olhamos para seleções como a África do Sul (44 M€), Angola (52 M€) ou Tunísia (69 M€), equipas cujo rendimento em campo supera claramente o valor económico atribuído pelo mercado. Do outro lado, seleções como Botsuana (3 M€), Tanzânia (6,7 M€) ou Uganda (8,3 M€) competem com limitações claras, mas sustentadas em organização e dignidade competitiva — valores que não entram em avaliações financeiras.
Em maio de 2023, quando em Dallas iniciámos o primeiro estágio com a Seleção Nacional da Nigéria e tivemos o primeiro contacto com os jogadores, tive uma percepção muito clara: o valor económico individual é determinado pelo contexto e pela sociedade. Os jogadores são, antes de tudo, humanos que fazem aquilo que mais gostam e para o qual estão naturalmente preparados.
Lembro-me da primeira palestra. À minha frente estava um grupo cujo valor global rondava os 400 milhões de euros. Victor Osimhen, avaliado na altura em cerca de 120 milhões, era apenas um miúdo-homem com um coração gigante e uma vontade imensa de vencer. Esse valor não existe isoladamente — é o coletivo que o constrói.
O valor económico ajuda, cria margem e oferece soluções. Mas não ganha jogos sozinho. Na CAN, o mercado não entra em campo. Entram homens, decisões e identidade. É aí que o rendimento real se separa do valor económico."

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Agentes de futebol e licença FIFA: entre a intenção regulatória e a inutilidade prática


"A FIFA voltou a prometer ordem num setor historicamente caótico: o mercado dos agentes de futebol. Exames, licenças, formação contínua e um foro próprio pareciam anunciar uma nova era de profissionalização e controlo. Mas entre o anúncio e a realidade prática, o Regulamento de Agentes de Futebol acabou por tropeçar e hoje levanta uma pergunta simples, mas incómoda: para que serve, afinal, a licença FIFA?
Aprovado em dezembro de 2022 pelo Conselho da FIFA, no Qatar, o novo Regulamento de Agentes de Futebol (FFAR) foi apresentado como um «instrumento equilibrado e razoável para proteger a integridade do futebol e o bom funcionamento do sistema de transferências». O discurso institucional apontava para maior transparência, profissionalização da atividade e proteção dos intervenientes mais frágeis do sistema. Ou seja, um regulamento embrulhado em boas intenções.
O FFAR entrou parcialmente em vigor em janeiro de 2023 e, na íntegra, a partir de outubro do mesmo ano, reintroduzindo um sistema de licenciamento obrigatório, sujeito a exame de acesso, formação contínua e um sistema próprio de resolução de litígios, através da criação da Câmara de Agentes no Tribunal do Futebol da FIFA.
A realidade, porém, rapidamente se encarregou de expor as fragilidades deste modelo.
Em dezembro de 2023, na sequência de várias impugnações apresentadas por federações e associações de agentes e, sobretudo, após a decisão do Tribunal de Dortmund que decretou uma providência cautelar suspendendo a aplicação de determinadas normas, a FIFA decidiu suspender parcialmente o regulamento.
Essa decisão foi formalizada através da Circular n.º 1873, de 30 de dezembro de 2023, aguardando-se agora uma pronúncia definitiva do Tribunal de Justiça da União Europeia sobre a legalidade das regras suspensas.
Nesse contexto, a FIFA recomendou que as federações membro suspendessem temporariamente as disposições em causa dos seus regulamentos nacionais, salvo se estas coincidissem com normas imperativas do direito interno.
Nesta senda, em Portugal, a Federação Portuguesa de Futebol reconheceu essa realidade, suspendendo as normas do FFAR abrangidas pela providência cautelar que não sejam simultaneamente impostas pela legislação nacional, mantendo-se em vigor as regras estruturantes já previstas na Lei n.º 54/2017, de 14 de julho.

Na prática o que quer isto dizer?
Significa que a regulação da atividade de agente continua a assentar, sobretudo, no direito interno, sendo a licença FIFA um requisito de valor jurídico limitado e de utilidade funcional discutível enquanto o núcleo do FFAR permanecer suspenso.
Importa ainda sublinhar que a suspensão do regulamento não se limitou a disposições controversas, como o teto remuneratório ou as regras de pagamento das comissões. Atingiu, de forma particularmente significativa, um dos pilares estruturantes do novo modelo: a Câmara de Agentes.
O FFAR previa, no seu artigo 20.º, um quadro disciplinar e jurisdicional próprio, com um foro especializado para resolver litígios entre agentes, jogadores, treinadores e clubes. Dada a complexidade dos contratos neste setor, incluindo os celebrados entre agentes e clientes, as situações raramente são tão simples quanto parecem.
A Câmara de Agentes surgia, assim, como resposta necessária à crescente litigância do setor, oferecendo, pelo menos, alguma segurança quanto ao foro para apreciar litígios relacionados com agentes, oferecendo previsibilidade, especialização e uniformidade nas decisões.
Todavia, com a suspensão do artigo 20.º do FFAR, os agentes ficam num verdadeiro vazio jurídico.
A licença subsiste formalmente, a formação contínua está em curso, mas o sistema que justificaria essa exigência encontra-se inoperante.
É certo que não é incomum que tais litígios sejam submetidos ao Tribunal Arbitral do Desporto (CAS), quando o contrato prevê expressamente que este seja a instância final de resolução.
Contudo, nem sempre os custos e a celeridade do CAS são compatíveis com este tipo de disputas, situação semelhante a outros mecanismos de arbitragem. Os encargos processuais podem escalar rapidamente e o simples acesso a uma audiência pode levar tempo considerável, quanto mais a obtenção de uma decisão final e a resolução efetiva do litígio.
Perante este cenário, as perguntas impõem-se quase naturalmente: qual é, hoje, a utilidade prática da licença FIFA? Serve para legitimar um sistema regulatório que não se aplica? Para certificar agentes num quadro jurídico suspenso? As respostas, essas, continuam adiadas...
A suspensão parcial do FFAR transformou a licença FIFA naquele típico presente de Natal que não serve, mas não dá para trocar ou devolver.
A médio prazo, a grande incógnita reside no desfecho do contencioso europeu. Caso o TJUE venha a declarar ilegais partes substanciais do regulamento, a FIFA será forçada a repensar profundamente o modelo. Até lá, agentes, clubes e jogadores operam num regime híbrido, fragmentado e instável, em que a licença FIFA existe apenas como um mero selo formal, mas desprovido de conteúdo normativo relevante.
Assim, num contexto em que as principais normas estão suspensas, em que a Câmara de Agentes não funciona como sistema eficaz de resolução de litígios e em que os ordenamentos jurídicos nacionais continuam a assumir o papel central na regulação da atividade, o Agente de Futebol não deixa de parecer aquele parente adulto que se senta na mesa das crianças na ceia de Natal: presente, reconhecido por todos, mas claramente deslocado."