Últimas indefectivações

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Golos traiçoeiros

"Está na moda um jogador transferido não festejar um golo que venha a marcar contra a sua anterior equipa. É, para alguns, uma espécie de amálgama de virtudes: a gratidão, o profissionalismo, o pudor. Os adeptos da nova equipa são compreensivos e os da anterior não sibilam perante tal 'deslealdade' de se lhes marcar um golo.Sobretudo quando ainda estão frescos na memória os óculos tão apaixonados que davam ao emblema do precedente clube na sua suada camisola. Em suma, um comportamento cauteloso qb e uma atitude pc. Todas as semanas temos exemplos empolgantes destes comoventes resguardados. Confesso que sou indiferente a estas expressões de 'bigamia' clubista. Um fingimento, no meio de tantos, que se vêm observando no futebol!
Caso diferente é o do golo marcado por um jogador ao seu clube contratual que, antes, o havia emprestado ao clube oponente. Neste caso, compreendo o recato da coreografia do golo, entalado que está a jogador entre o patrão de facto. Mas daí até se insinuar 'falta de profissionalismo' do atleta que marca ao seu clube de origem vai a distância entre desportivismo e um insuportável facciosismo.
No domingo o excelente jogador Tozé emprestado pelo Porto ao Estoril foi encarregado de marcar um penalty. Decisão destemida e, ao mesmo tempo, venenosa. Marcando - como foi o caso - uma traição para os mais sectários; falhando, um atoarda de suspeições ainda que injustas. Por esta e por outras razões, deveria haver duas regras: 1) jogador do clube 'comodatário' não joga contra o clube 'comodatário'; 2) deveria haver um limite para estes 'comodatos'. Acabavam-se as dúvidas e suspeições."

Bagão Félix, in A Bola

Saber jogar mal

"Lembro-me bem quando Jesus chegou ao Benfica e logo prometeu que, com ele, a equipa ia 'jogar o dobro'. A promessa, é um facto, não se concretizou. O Benfica de Jesus, quando comparado com o do inenarrável Quique Flores, não jogou o dobro, mas sim, no mínimo, o quádruplo. Por estranho que possa parecer, jogar bem passou também a ser o principal dos problemas do Benfica das últimas temporadas.
Não me entendam mal. Como qualquer adepto, sou muito sensível à nota artística e o futebol precisa de equipas capazes de dar espectáculo. O problema é que o Benfica dos últimos anos tem dificuldade em jogar mal. E uma equipa para ganhar títulos precisa mesmo de saber jogar mal - gerir resultado e manter os ritmos dos jogos em cadência baixa.
Tem sido sempre assim com Jesus: temos a avalanche ofensiva, com um carrossel estonteante que deixa os adversários à banda; já quando é preciso controlar o jogo, o Benfica apresenta problemas. Na maior parte das partidas, a questão nem se coloca. O balanceamento atacante da equipa revela-se a melhor defesa e a qualidade individual e a organização colectiva chegam e sobram para as encomendas.
Este ano, contudo, a questão é diferente. Com um plantel mais curto, com menos talento em posição-chave e com muitas rotinas ainda por aprimorar, o Benfica vai precisar de saber jogar mal para conquistar títulos. Como, aliás, se viu na Choupana este fim de semana: assim que demos a volta ao marcador, passámos a sofrer.
Construir uma equipa 'resultadista', capaz de gerir jogos, é o principal desafio que se coloca a Jesus, hoje. Convenhamos que, mesmo assim, é uma tarefa comparativamente pouco exigente. Afinal, o que é ensinar a jogar mal quando comparado com o que foi montar o carrossel atacante que caracteriza o Benfica dos últimos anos?"