"«O homem é mortal pelos seus temores e imortal pelos seus desejos», já dizia Pitágoras, há 2500 anos. Na crónica desta quinta-feira do Livro do Desassossego, o que têm em comum um filósofo grego e uma receita de culinária?
Morrer não é o oposto de viver.
Morrer é oposto de nascer. O oposto de viver é o esquecer. É por isso que Diogo Costa viverá para sempre, porque nunca ninguém mais vai esquecer a defesa majestosa com que negou o golo a Sesko, muito menos as três grandes penalidades superiormente defendidas — sim, defendidas, não foram falhadas — no desempate com a Eslovénia e que têm já lugar entre os feitos inéditos e extraordinários numa grande competição como um Europeu. Um momento em que vi um homem carregando todo o peso de um País, num daqueles momentos que podem definir não apenas um jogo, mas também uma carreira e até uma vida inteira, tornar- se muito maior do que a soma das suas forças e competências. Puro instinto, pura concentração, pura elasticidade, pura crença. E não fosse ter de entrar em direto para o programa de rescaldo e teria ficado sozinho, num canto, apenas a chorar, comovido por Diogo Costa me ter mostrado a transcendência do ser humano. Mais do que épico, mais do que heroico, foi belo.
Cinco séculos antes do nascimento de Jesus já o filósofo grego Pitágoras defendia que «o homem é mortal por seus temores e imortal por seus desejos». Por isso vi Ronaldo ser devolvido à condição dos simples mortais — sem perder o direito ao lugar que conquistou enquanto maior jogador da história do futebol — e Diogo Costa entrar no Olimpo.
É por momentos como aquele que eu amo o futebol. Muitas vezes, toda uma vida contada num único jogo. O jogo como palco de heróis que soçobram em lágrimas; de alegrias, de dramas, de um carrossel de emoções; sacrifício, compromisso, solidariedade, talento. Um jogo como espaço intrinsecamente democrático, onde muitas vezes não vence o mais forte, mas quem mais quer; onde há sempre um Éder em metamorfose, de patinho feio a cisne. Um jogo como espaço tribal, da irmandade dos jogadores à comunhão dos adeptos, onde o abraço não questiona género, orientação sexual, credo, nível de escolaridade ou estatuto económico e social.
Não, Portugal não fez, esteticamente, um grande jogo. Sofreu mais do que devia e está longe de jogar o que pode. O selecionador geriu mal as substituições. Não marcamos um golo há mais de quatro horas! Mas o que andaremos todos a discutir para sempre são os penáltis defendidos por Diogo Costa. Tal como a defesa sem luvas do Ricardo.
Receita para o jantar de sexta-feira
Tome nota desta receita para confecionar na noite de amanhã. Mesmo que não seja grande cozinheiro, vai ver que não é difícil:
1 — Refogue, num tacho com azeite, 100 gramas de cebola, quatro dentes de alho e uma folha de louro.
2 — Tire a pele a 400 gramas de tomate, limpe-o de grainhas, pique em pedaços pequenos e junte ao refogado. Deixe cozinhar, mexendo de vez em quando até o tomate estar macio.
3 — Acrescente um galo cortado em pedaços, tempere com 1 colher de sopa de sal e deixe cozinhar, com o tacho tapado, durante cerca de 10 minutos, com lume brando.
4 — Adicione água quente até cobrir o galo, volte a tapar e deixe ferver suavemente durante mais 20 minutos. Acrescente um pouco mais de água a ferver de modo a ficar com cerca de três vezes e meia o volume do arroz. Retifique o sal, se for necessário, e assim que retomar fervura introduza o arroz. Mexa e tape.
5 — Passados 13 minutos, acrescente o sangue do galo, previamente misturado com vinagre. Misture beme deixe ferver mais 1 a 2 minutos. Retire do lume e sirva de imediato.
Mais do que o 4x3x3 ou o 3x4x3, se o Ronaldo e o Pepe devem ou não ser titulares, este arroz de cabidela ainda me parece ser a melhor receita para vencer a França. Se não resultar, pelo menos ficamos bem jantados… E guarde uma boa garrafa de vinho para abrir após o jogo. Abra mesmo que Portugal perca. O sabor é o mesmo e é quando precisamos mais..."