Últimas indefectivações
sábado, 7 de outubro de 2023
É preocupante!
"Pode o futebol de hoje resistir a tantos e tão graves erros da videoarbitragem?
A questão não é se o futebol está melhor depois da criação do VAR; a questão é como apesar de haver VAR se cometem, afinal, ainda tantos erros. Essa é a questão. Que o futebol está melhor com a videoarbitragem, ninguém, evidentemente, contesta. Também era melhor que não estivesse. Mas mesmo com a videorbitragem têm sido cometidos tantos e tão graves erros no futebol que o adepto não acredita. E esse é um problema difícil de entender e, sobretudo, de explicar.
Se os árbitros são profissionais e têm obrigação, por estatuto, qualificação e competência, de tornar mais verdadeiro o que se joga e como se joga num campo de futebol, sobretudo ao mais alto nível competitivo, então por cada erro grave que possam cometer na videoarbitragem deveria corresponder uma punição exemplar financeira e desportivamente. Ainda se entende quando os lances avaliados são subjetivos - agarrão mútuo, contacto alegadamente inevitável, duelo dividido na luta pela bola, carga com mais ombro ou menos ombro, enfim, são naturalmente muitas as jogadas de análise mais difícil, e isso percebe-se. Mas como compreender quando a falta é objetiva?
No campo, o árbitro terá sempre alguma desculpa, alguma atenuante. Não viu, não lhe pareceu, foi tão rápido que ficou confuso, por milésimo de segundo equivocou-se. A história do futebol, sem auxílio das tecnologias, é tão imperfeita como a própria história de todos nós. Não fez Maradona um golo com a mão no Mundial do México, em 1986, vindo, depois, a tornar-se campeão do Mundo?
Mas as novas tecnologias permitem hoje dar ao jogo mais verdade desportiva, tendo em conta que o jogo se tornou, entretanto, muito mais um espetáculo televisivo e passou a exigir, também por isso, que o tribunal do vídeo pudesse julgar as infrações do jogo de forma justa e rápida.
Se, no campo, o árbitro continua a ter, pois, algumas atenuantes, o vídeo árbitro não tem desculpa a não ser por qualquer problema ou falha da tecnologia. Tem tudo ao dispor: as imagens, o tempo, as repetições. E levanta a questão: como pode não ver o que toda a gente vê?
No Sporting-Casa Pia desta época, inédito o erro do videoárbitro, que falhou grosseiramente na colocação das linhas do fora de jogo e permitiu que fosse válido o golo irregular de Paulinho; no Farense-Sporting do último fim-de-semana, outro exemplo de erro grosseiro do videoárbitro ao decidir (como foi possível?) confirmar uma grande penalidade inexistente sobre o sportinguista Edwards e assim permitir aos leões chegar à vitória.
Queixa-se, por outro lado, o Benfica, e justamente, de uma grande penalidade não assinalada em Milão, no jogo com o Inter, que o videoárbitro devia ter visto e não viu (como é possível?) por clara rasteira de Barella na perna direita de David Neres, quando o resultado estava ainda em 0-0. E pode, igualmente, queixar-se o FC Porto de uma grande penalidade não assinalada por puxão de camisola de Jules Koundé a Taremi, no jogo com o Barcelona. Puxar a camisola, rasteirar a perna, colocar mal as linhas do fora de jogo, ver Edwards ir ao encontro da perna do adversário e não o adversário ir ao encontro do pé de Edwards, não tem nada de subjetivo. São erros graves porque os lances avaliados são objetivos. Por negligência, incompetência, distração, impre- paração ou qualificação inadequada, têm-se sucedido erros tão inacreditáveis que arriscam, na verdade, fazer profundamente mal ao jogo e colocar em causa (não como esconde-lo) a credibilidade do próprio jogo.
O futebol que se joga ao mais alto nível, nas principais Ligas e nas grandes competições internacionais, não pode admitir, hoje, com a tecnologia ao dispor, falhas tão grosseiras. Elas matam o jogo. Como exigir que o protocolo do VAR seja alargado a mais situações do jogo quando as poucas que estão protocoladas já suscitam tanta controvérsia e incredulidade?
São ainda demasiados os casos que nos têm deixado perplexos, e as referências a algumas situações mais evidentes e recentes servem para ilustrar a mais do que compreensível desilusão e angústia dos adeptos.
Sublinho: num momento em que já devíamos estar apenas concentrados nas teses sobre o alargamento da ação da videoarbitragem sobre o jogo, ainda nos debatemos, afinal e lamentavelmente, na injustificada quantidade de erros cometidos pelos árbitros que julgam na privacidade de uma sala equipada com todas as condições, altamente tecnológica e muito dispendiosa. Um luxo que obviamente já trouxe muito de bom ao jogo, mas que, por maior que pareça o paradoxo, continua a falhar de forma incompreensivelmente gritante, como voltámos a ver esta semana, em claro prejuízo de Benfica e FC Porto, que viram duas grandes penalidades por assinalar (em Milão e no Porto) quando os seus jogos da Champions (com Inter e Barcelona) estavam ainda 0-0.
Só isso explica as derrotas de encarnados e azuis e brancos? Não, evidentemente que não. Mas não me venham com a conversa de que um erro do árbitro é como um erro de um jogador e que se os treinadores erram os árbitros também podem errar. Dantes isso ainda era tema. Agora já não. Já não é comparável o que se vive no campo com o que se vive na sala da videoarbitragem. Pior: repare-se como a grande maioria dos mais graves erros cometidos hoje no futebol pela arbitragem têm, todos, o cunho do videoárbitro.
É muito inquietante!
Já passou, entretanto, uma semana, e talvez muitos não tenham dado por isso, mas o Dragão de Ouro Rui Moreira (distinguido em 2010 como Sócio do Ano e, já mais recentemente, na qualidade de líder da distinguida Câmara Municipal do Porto) parece não ter tido direito a convite para marcar presença na Gala dos Dragões de Ouro com que o FC Porto celebra o aniversário ou então declinou o convite que eventualmente lhe terá sido feito.
Em qualquer caso, a verdade é que a ausência de Rui Moreira não podia deixar de ter sido a mais notada, tratando-se de um homem da cidade e do clube desde sempre.
Confesso admirador do presidente do FC Porto, adepto de bancada e acérrimo defensor do emblema, agora também membro do Conselho Superior dos azuis e brancos e ainda o presidente que voltou a abrir ao clube, e às celebrações do clube, as portas da Câmara Municipal da cidade (durante anos fechadas por Rui Rio, seu antecessor), Rui Moreira foi parecendo ao longo dos últimos anos das poucas figuras consensuais de um Norte cada vez com menos referências públicas.
Honra lhe seja, Rui Moreira nunca teve realmente medo de dizer o que pensa sobre a vida da cidade e do FC Porto, mesmo quando aconselharia o bom senso que tivesse evitado alguns dos comentários que fez ultimamente, em particular sobre o treinador dos dragões. Não lhe ficaram bem, porque ainda que se sinta um adepto comum, Rui Moreira sabe (com todo o respeito) que deixou de ser um adepto como outro qualquer.
Desconheço se Rui Moreira esteve (como de costume) ou não, no Estádio do Dragão, na última quarta-feira, a assistir ao FC Porto-Barcelona. Pelo menos, não dei conta que tenhas estado (como era mais habitual) num dos lugares de destaque da Tribuna Presidencial.
Seja como for, e mesmo admitindo a possibilidade de compromissos políticos o terem impedido de ser visto num e noutro lugares, a verdade é que a ausência, sobretudo, da Gala dos Dragões de Ouro será, muito provavelmente, resultado do ambiente hostil que parece estar reservado ao presidente da Câmara da cidade na relação com as mais altas figuras do FC Porto depois do líder da autarquia ter dito o que disse recentemente do treinador, acusando-o de ser um «falhado» e sem «fair-play».
Na gala dos Dragões de Ouro, aliás, nem Rui Moreira nem o treinador portista estiveram, afinal, no Coliseu da cidade, mas Rui Moreira não estava, como o treinador, em Lisboa a preparar o clássico com o Benfica, jogado no dia seguinte.
Resta saber se o divórcio de Rui Moreira, figura pelo menos até há pouco tempo tão estimada pelo universo portista, é apenas com o treinador ou também, e finalmente, já com a liderança estrutural do clube, a pensar na agitação que não deixará de surgir quando, no próximo ano, se atacarem as eleições para a presidência do FC Porto.
A meio da década passada, Rui Moreira não tinha dúvidas. «(…) Muito do renascimento do Porto tem que ver com o que o clube tem feito. Se todas as nossas atividades, indústrias e instituições estivessem ao nível do FC Porto, estaríamos muito melhor. O FC Porto é um exemplo», dizia o homem que foi capaz de conquistar a Câmara Municipal das cidade lutando fora dos aparelhos partidários.
O que mudou, entretanto? Rui Moreira ou o FC Porto? Ou alguém acredita que foi apenas a mudança dos tempos que fez com que mudassem as vontades?!...
PS: Ninguém, certamente, poderia prever que apenas o SC Braga viesse, esta semana, a salvar a honra do convento português nas competições da UEFA. Mas foi. O que também não deixa de ser preocupante!"
Comédias!!!
"O Vitor Pinto, subdiretor do Record, está profundamente indignado com o árbitro do jogo entre o FC Porto e o Barcelona, no Estádio do Dragão, por este ter sido visto a rir no final do encontro.
Sinceramente, não vejo onde está o problema. Certamente que o árbitro estaria a comemorar o facto de ter acertado em todas as decisões.
Veja lá, senhor Vitor Pinto, que uma vez até vi um árbitro assistente a festejar efusivamente com o punho cerrado por ter anulado um golo ao Benfica! Mas rapidamente me explicaram que esse comportamento era normal, porque ele estava apenas a celebrar ter acertado na sua decisão."
"Sai mais um Dragão de Ouro, para este miserável!"
"Até a filha de 7 anos - veja-se bem!! - ele tenta humilhar e intimidar. Passou de arguido a acusado pelo Tribunal.
Idolatrado pelo seus seguidores, não admira que só no FCPorto ainda tenha adeptos e lhe dêem um teto para trabalhar!"
É este animal que uma enorme falange de adeptos do FC Porto idolatra
"Um energúmeno agora acusado pelo Ministério Público dos crimes de violência doméstica agravados contra a ex-mulher e a filha menor de apenas 7 anos, agindo, segundo os procuradores, com a intenção de "humilhar, intimidar e importunar a menor vítima", submetendo-a a maus tratos, bem como à ex-mulher.
«O que anda com os sábios ficará sábio, mas o companheiro dos tolos será destruído». É uma questão de tempo até que um dos maiores responsáveis pelo estado de putrefacção do futebol português pague pelos seus crimes. E tarde a justiça chegará."
A Europa antes do Mundo
"Sete anos seria um prazo decente para um novo aeroporto e uma rede de alta velocidade
Portugal organizará, dentro de sete anos, um Campeonato do Mundo de futebol e para aqueles que desde já criticam, porque iremos ter demasiados jogos em Espanha (incluindo a final), muitos em Marrocos e alguns até na América do Sul, talvez seja bom lembrar que Portugal não tem dimensão demográfica, económica e até política para poder organizar sozinho um grande evento desportivo, como o Campeonato do Mundo de futebol ou uns Jogos Olímpicos. Quem acha que sim, não sabe o que é um Mundial de futebol, nem uns Jogos Olímpicos, nem, sequer, conhece Portugal.
A notícia é, pois, de celebrar. Sobretudo se pensarmos que a organização, mesmo que em regime de cooperação, de um Campeonato do Mundo de futebol pode implicar uma aproximação decisiva do país à Europa. Devemos aliás recordar que, apesar das muitas críticas feitas pelo que diziam ser o esbanjamento de meios financeiros na realização da Expo-98, Portugal ganhou respeito mundial pela sua capacidade de organização de grandes eventos e ganhou toda uma zona urbana moderna e funcional que substituiu uma lixeira pantanosa e imunda. E também podemos recordar que o tão detestado Euro-2004, mais a enormidade da despesa da construção dos novos estádios, muitos dos quais com Euro ou sem Euro teriam de ser construídos pelo Benfica, Sporting, FC Porto, Boavista ou Vitória de Guimarães, constituiu um ponto fundamental de viragem de um turismo incipiente e avulso por uma indústria moderna e profissional, que nos trouxe e continuará a trazer uma onda constante de turistas de todo o mundo, que contribui para uma parcela essencial do PIB e do crescimento da nossa economia.
Com a organização do Mundial de 2030, Portugal tem uma oportunidade única para balizar investimentos que, apesar de serem há muito tempo urgentes, têm continuado adiados pelo peso da tradição de uma cultura mesquinha e miserabilista que vê sempre despesa onde deve ver investimento. Sete anos seria um prazo decente para construirmos o novo aeroporto de Lisboa e um início de rede de comboios de alta velocidade que nos aproxime da Europa e nos afaste do do velho isolamento da «ocidental praia lusitana». Portugal precisa deste Mundial até para estabelecer metas objetivas e datadas para o seu desenvolvimento."
Risco desportivo
"O relatório e contas da Braga SAD de 2022-2023 trouxe um lucro inédito na ordem dos 20.3 milhões de euros e trouxe a novidade da sua acionista Qatar Sports Investments (QSI) ter reforçado a posição no respetivo capital social para 29,60%. No último trimestre de 2022, a QSI entrou no capital da sociedade desportiva bracarense através da compra de 21,67% de ações que pertenciam à Holding do universo da Olivedesportos. Com tanta exigência para se evitar conflitos de interesses e bradar a tão propalada transparência em torno das sociedades desportivas, ainda hoje não se percebe como é que se permite a um veículo da Olivedesportos poder ser acionista deste tipo de sociedades quando a Sport TV Portugal, S.A. é detida, em 75% do seu capital social, pelas três maiores operadoras nacionais (ZON, MEO e Vodafone) que, por sua vez, também patrocinam sociedades desportivas. Proteção de direitos adquiridos? Talvez. Mas já ninguém se lembra que o monopólio atual das transmissões televisivas das duas ligas profissionais nacionais ainda se encontra nas mãos deste grupo? Futuramente, perante a oficialização daquele que será o formato da execução da centralização dos direitos televisivos na Liga de Clubes, resta saber se a Olivedesportos, através dos seus acionistas da Sport TV ou de outros investidores, terá capacidade financeira para entrar em cena visto que os valores a pagar vão encarecer. Regressando a Braga, não nos devemos esquecer que quem controla a QSI é o próprio Estado do Catar. Logo, os direitos de voto na sociedade desportiva minhota a este pertencem. É uma estratégia forte e interessante. Porém, arriscada pois dependerá sempre do nível de submissão a que se sujeitaram perante quem investe. Tome-se como ponto de partida o mercado da Braga SAD para esta época: fizeram 6 aquisições num total de 17.8 milhões mas venderam outros 6 pelo total de 11.1 milhões. A aposta é claramente desportiva por ter aumentado o valor de mercado do plantel para 126.20 milhões. Mas a 1.ª liga tem uma hierarquia consumada por 3 ordens supremas com mais do dobro do valor em plantéis (SLB com 359.63, FCP com 289 e SCP com 280.30). O investimento não pode ser pontual. Tem que ser feito para durar."
Dos impropérios da avó Rosa ao São Geraldo do avô Adelino
"Quem luta para ter comida para pôr na mesa sabe que o fracasso não é opção e que as desculpas não matam a fome
A minha avó Rosa, benfiquista, tinha uma interpretação muito singular do papel do adepto. A cada jogo do Benfica, cada vez que abria a boca era para criticar os jogadores… do Benfica! A cada passe mal feito, a cada golo sofrido, a cada resultado negativo, a minha avó refilava com eles com a convicção que eles estavam mesmo a ouvir. «Cabaneiros», gritava, palavra que em criança desconhecia e que vim a saber poder ser «vadio, preguiçoso». Se fosse viva, teria havido sermão e missa cantada durante o jogo com o Inter e ninguém teria escapado. Já nos golos e vitórias do Benfica, era inexpressiva, do género não fizeram mais do que a obrigação deles. Aliás, se os adeptos que vão ao estádio fossem todos como a minha avó, a Luz seria um cubo de gelo a cada vitória das águias.
Subjacente a esta emotividade irracional estava uma convicção profunda: se para a avó Rosa o Benfica é o melhor e conta com os melhores, a antecipação de um jogo estava imune aos imponderáveis do futebol. Vencer era uma inevitabilidade. Logo, não havia ansiedade ou dúvida. No Totobola, as opções eram apenas «1» ou «2» consoante o Benfica jogasse na Luz ou fora. E quando o choque com a realidade a fazia confrontar-se com um mau resultado, a culpa era invariavelmente dos jogadores, porque não há sorte ou azar que possa contra a lei de quem é mais forte e dá tudo em campo. Nunca lhe ouvi uma reclamação contra os árbitros ou adversários.
Tentar explicar-lhe que o Inter é uma das grandes equipas europeias e que tem um orçamento superior ao Benfica seria ainda pior. Desculpas, diria ela, irritada. A vida numa pequena aldeia perdida do Minho, num Portugal então a preto e branco, tinha-lhe ensinado tudo sobre como fazer muito com pouco. No seu papel de matriarca, sabia que quando a luta diária era ter pão na mesa, o fracasso não era opção. E que as desculpas não matam a fome.
Retorcido? Talvez exagerado, mas, à maneira dela, o que falamos é de critério de exigência. Que me obriga a responder a uma simples pergunta: «Fiz mesmo tudo para evitar o insucesso?» Só depois posso cobrar os erros dos outros. O que nunca acontece, se formos verdadeiros no exercício. Há sempre culpas ou falhas nossas no insucesso, tornando inútil — e por vezes hipócrita — o exercício de atirar pedras ao telhado do vizinho.
Num outro patamar, mas igualmente singular, a minha mãe, também benfiquista, deve acreditar que receberá um dia o Nobel da Paz pela promoção da concórdia entre adeptos. Não insulta ninguém, compreende os jogadores e tem sempre uma palavra de conforto. A derrota dos adversários não lhe dá gozo nenhum, não raras vezes se junta aos netos a festejar as vitórias de Sporting e FC Porto. A minha avó nunca o disse, mas, avaliando a forma como olhava a minha mãe nestes momentos de concórdia, deve ter-se culpado de alguma falha na educação da filha, muito mole para o gosto dela.
Ser do SC Braga por 'nacionalidade'
Para o meu avô Adelino, ser adepto de um clube não era uma questão de opção, mas de, num certo sentido, de nacionalidade. Se ele era de Braga, o SC Braga era a sua nação e olhava de soslaio para mulher e filhos, que renegaram a nacionalidade para apoiarem nações estrangeiras…
Se ele tivesse visto a brilhante vitória do SC Braga em Berlim, haveria se estar orgulhoso. Feliz por presenciar um novo milagre de São Geraldo — padroeiro da cidade, foi arcebispo de Braga, morreu a 5 de dezembro de 1108 — que, reza a lenda, fez nascer fruta em terreno coberto de densa neve. O avô Adelino haveria também de se sentir guardião do espírito e da simbologia da Torre de Menagem. Depois, recolheria ao quarto para voltar à leitura. Talvez para reler as aventuras de Zé do Telhado, famoso salteador do século XIX, entretanto apelidado de Robin dos Bosques português. Guardo ainda hoje o livro de José Manuel de Castro sobre a vida de Zé do Telhado, edição no mínimo com uns 50 anos, como herança do meu avô. A quem estarei eternamente grato por ter incutido em mim o gosto pela leitura e por uma boa história, que ele me dava a conhecer pelos livros e pela forma exímia como as contava aos netos.
Chocolates à conta do FC Porto
O meu tio João, que viveu connosco até se ter casado, via o papel de adepto como o de afirmação de uma identidade. Seduzido pelo discurso de Pinto da Costa, adepto do FC Porto se consolidou. Cada vitória e cada título era bem mais do que um jogo de futebol, era a própria vida jogada em 90 minutos. Nas semanas europeias, cada vitória dos dragões era prenúncio de quintas-feiras, dia de folga do meu tio, mais felizes. Comprava-me uma tablete de chocolate ou uma sombrinha de chocolate Regina. Teria ficado triste com a derrota com o Barcelona, atenuada por ser com um clube que também gostava pelos pontos em comum no que à afirmação de uma região diz respeito. Haveria de ter reconhecido o esforço dos jogadores e algum azar num empate que esteve tão perto. Talvez isso lhe bastasse para manter a vontade de me comprar um chocolate.
Sportinguista não praticante
Na brincadeira, dizia que o meu pai era um sportinguista não praticante. Torcia pelo Sporting, à maneira dele e para ele. No futebol como na vida. Homem de pouquíssimas palavras, mas de grandes gestos e que está na origem da minha primeira zanga com Deus, tão injusto achei ter-mo levado quando ele tinha apenas 48 anos. Tudo o que aprendi do meu pai foi por aquilo que o vi fazer. Não dava conselhos, dava exemplos. E ensinou-me duas lições essenciais: como ser um Homem e como Amar uma mulher. Bastava estar atento ao que ele fazia. Confesso, fui um aluno medíocre, ainda hoje tenho de ir à oral, incapaz de dispensar logo no exame escrito.
A reação dele ao jogo de ontem do Sporting seria de absoluta serenidade. Quem, literalmente, tinha andado à luta em criança por um pedaço de pão de milho e aos 12 anos recebia as primeiras migalhas de salário a lavar pratos num restaurante, tinha colocado no topo a fasquia da gestão das emoções, abaixo da qual o sucesso e insucesso tem de ser relativizado."
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