"Mundial de Clubes
O Flamengo de Jorge Jesus até podia ter vencido o Mundial de Clubes. A vitória do Liverpool foi magra, mas o fosso entre os dois clubes é grande. O fosso não é apenas entre os dois clubes que se enfrentaram. É entre o futebol cada vez mais rico e universal dos grandes clubes europeus e o futebol fragilizado e cada vez mais regional das potências sul-americanas.
Jesus tentou superar o abismo atlântico entre as duas equipas com recurso às suas macumbas tácticas e apelando ao espírito de sacrifício e à disciplina dos seus jogadores. Se olharmos para o resultado, o objectivo foi alcançado. Perder 1-0 com este Liverpool não envergonha ninguém. Em certos momentos, o Flamengo chegou a estar por cima do jogo.
Porém, nunca foi tão ameaçador como o Liverpool. Só uma noite perfeita do Flamengo poderia ter dado a taça ao clube carioca. Aos pupilos de Klopp, bastou uma noite assim-assim. É essa a triste realidade para os clubes sul-americanos.
No entanto, o jogo de Doha pode também ser visto como um triunfo do futebol brasileiro no que tem de melhor: os seus jogadores. Alisson e Firmino (Fabinho está lesionado) contribuíram para a vitória do Liverpool e, do outro lado, à excepção de Pablo Marí e De Arrascaeta, todos os outros jogadores eram brasileiros, entre reformados e traumatizados do futebol europeu, outros que fizeram toda a carreira no Brasil, alguns que ainda esperam por uma oportunidade no Velho Continente e jovens promessas com muito futuro.
Nenhum deles é titular na selecção brasileira.
Sem tirar mérito a Jorge Jesus, que outro país do mundo poderia fornecer tanto e tão barato talento? Os brasileiros orgulham-se, e com toda a justiça, dos cinco campeonatos do mundo, mas, perante uma abundância quase pornográfica de talento, a questão devia ser outra: só cinco?
Taça da Liga
Outrora vilipendiada por todos aqueles que a não conseguiam ganhar, a Taça da Liga (que é Allianz e já foi Carlsberg, CTT, da Carica, da Cerveja, Lucílio Baptista, entre outras denominações menos caridosas) tem vindo a conquistar um prestígio que a coloca quase ao nível de um Mundial de Clubes.
Os que antes se lhe referiam com sarcasmo, tributam-lhe agora uma profunda reverência, em nome do respeito pelo futebol e pelo espírito de competição. O Porto já não quer aliviar o calendário sacrificando a menos importante das quatro competições nacionais, o Sporting deixou para trás os tempos das finais traumáticas contra Vitória de Setúbal e Benfica, o Braga procura enriquecer o seu palmarés em casa e, este ano, o Vitória de Guimarães está decidido a ir ao “sambódromo” fazer a festa.
Os treinadores põem um ar muito sério quando falam da “final four” e não estranharia se o Presidente Marcelo distribuísse comendas não apenas aos vencedores, mas a todos os finalistas.
Canelas
No sábado, contra o Benfica, Guedes, avançado do Vitória de Setúbal, marcou o mais fabuloso golo de canela da história do futebol mundial. Mas as canelas que preocupam o Benfica são outras. Canelas é uma pequena localidade do concelho de Vila Nova de Gaia que, à parte do seu curioso nome, nada tem que a distinga. Melhor dizendo, nada tinha até ao aparecimento musculado do Clube Futebol Canelas 2010.
O Canelas tem como líder espiritual Fernando Madureira, conhecido chefe dos Super Dragões desde o Neolítico e fiel depositário de um legado futebolístico ancestral que teve como expoente máximo Paulinho Santos.
A paulatina ascensão do Canelas no panorama do futebol nacional, embora o clube ainda milite no Campeonato de Portugal, deve-se a uma combinação perfeita de artes marciais, manobras de guerrilha urbana e técnicas de intimidação dos adversários que, em alguns casos, preferiram não jogar contra o Canelas, evitando dessa forma uma sempre incómoda visita às urgências do hospital público mais próximo.
O apuramento para os quartos-de-final da Taça de Portugal é, até agora, o feito mais notável desta simpática agremiação. Mas, como qualquer clube ambicioso, o Canelas quer ir mais longe. Madureira, também chamado “Macaco”, deseja com todas as forças receber o Benfica em casa.
Diz o jogador do Canelas que quer dar o conhecer o ADN do clube, de preferência com os dentes cravados na cabeça de algum jogador do Benfica. O mais célebre canelense não está sozinho nesse desejo.
Quem não gostaria que os caprichos do sorteio pusessem frente a frente os dois clubes? Quem não gostaria de testemunhar a hospitalidade do Canelas?
Quem não gostaria de assistir a um embate entre dois estilos futebolísticos tão opostos? Entre duas filosofias tão distintas?
Ao que consta, só os dirigentes do Benfica estão preocupados com um possível encontro com o Canelas e até já terão mostrado disponibilidade para, em alternativa, jogarem contra uma selecção de ex-combatentes do Daesh. Exageros, claro está. Tenho a certeza de que um eventual jogo entre Canelas e Benfica será um óptimo espectáculo de divulgação da modalidade. Depois logo se verá de que modalidade."