"Falar de Eusébio é fácil, mas retratar a admiração que o Mundo lhe dispensa, hoje, como há 50 anos, ou seja, transmitir a imagem verdadeira do que ele continua a representar, aqui, como em qualquer lugar, ou mais em qualquer lugar do que aqui, é missão a que não me atrevo, pela razão simples de temer não ser capaz de honrar pela palavra escrita a elevação de situações que esta profissão que amo me permitiu testemunhar. Recordo-as apenas:
Nova Iorque, espera no aeroporto para regressar a Lisboa. Passa um grupo de freiras, com destino à Índia. Perguntam: quem são? É a equipa de futebol do Benfica. Ah!, Benfica, está aí o Eusébio? Gostávamos de tirar uma fotografia com ele. Infelizmente, Eusébio não estava. Reacção entusiasmada do nosso Alfredo Farinha: é espantoso, estas irmãs de certeza que nunca o viram jogar...
Bucareste, ainda no tempo de Ceausescu, com as longas e demoradas filas no controlo de passaportes. Eusébio aguarda pela sua vez... até ser reconhecido. Polícia intervém e o «senhor Eusébio faz o favor de nos acompanhar». Esperam os outros, Eusébio, não. Nem na Roménia do ditador.
Manchester, final da Champions. Está lá Eusébio em iniciativa promocional. O interesse é enorme e a organização tem de arranjar uma sala só para ele ser entrevistado por televisões, rádios e jornais maioritariamente britânicos. Confidencia-me: «não percebo isto, nunca consegui ganhar em Wembley e gostam de mim»...
Roma, Eusébio recebe o galardão de Cavaleiro de Roma. A sua presença agita o centro da capital italiana. Aparece a polícia, Eusébio viaja para o local da homenagem, e um jovem, 16-17 anos, grita: «Eusébio, és grande!». Também eu pensei: este miúdo nunca o viu jogar...
Londres, Eusébio, entre figuras sonantes, é incluído na feira da promoção da final da Champions. Centenas de pessoas aguardam mais de uma hora ao frio por um autógrafo, uma fotografia, um sorriso.
Cá dentro, vemo-lo como Eusébio. Nós acentuamos-lhe os pecados; eles valorizam-lhe as virtudes. Eusébio é maior do que País, é um venerável cidadão do Mundo."
Fernando Guerra, in A Bola