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terça-feira, 2 de junho de 2015

César e a taça que não apareceu...

"Foi único! Adeptos do Benfica e do Sporting unira-se no Jamor contra aqueles que insultaram Mário Wilson de «palhaço». O «Velho Capitão» respondeu no campo, com a educação de que sempre fez alarde.

Está chegando a hora, ai, ai, ai, ai, como dizia a velha marchinha brasileira. Está chegando a hora de mais uma final da Taça de Portugal e, por isso vamos lá relembrar umas histórias a propósito, com o Benfica com pano de fundo, claro está.
Não precisam de me recordar que este ano não há Benfica na final da Taça, isso não é motivo para desprezar as crónicas que aí vêm. A verdade é que se há clube que pode falar de cátedra das finais da Taça de Portugal (Campeonato de Portugal inclusive), esse clube é o Benfica, tamanha a enormidade das suas conquistas, 28 vitórias, 9 finais perdidas, 18 meias-finais perdidas, um exagero se comparado com qualquer um dos seus rivais.
Por isso, aceita-se: o Benfica é o rei das Taças (e Campeonatos) de Portugal. Não há discussão!
E assim sendo, vamos até um dia especial e estranho: dia 7 de Junho de 1980.
No Estádio Nacional apresentaram-se o Benfica e a sua maior vítima em finais de taças: o FC Porto (um destes dias farei aqui a contabilidade de tal abissal diferença).
Dia estranho porque pela primeira e única vez na história do futebol português adeptos de Benfica e Sporting se uniram contra um inimigo comum, aquele que dizia que queria ver Lisboa a arder e atravessava a Ponte D. Luís com uma dose de raiva de fazer inveja à velha Padeira de Aljubarrota.
O calor era terrível. Lembro-me bem. Uma fornalha no Estádio Nacional.
Alberto, o poço-de-força, cedo partiu uma perna num choque com Frasco. Saiu de campo deitado na maca e o ambiente, que já era fervente, entrou em ebulição. Ainda não estavam decorridos 10 minutos.
Dizem as crónicas que estavam 80 mil pessoas nas bancadas. O Jamor aguentava com tanto? Não tenho dúvidas que sim - não havia cadeiras a separar as pessoas, todos se apertavam para dar lugar a mais uns poucos.
Pietra foi enorme! Meu bom e querido amigo Pietra! Poucos como ele sabiam o que era a alma. Ainda o vejo no filme da memória correndo acima e abaixo, tornado o campo pequeno, esse que era um campo grande...
E Bento? O maior adversário de Gomes, marcador de todos os golos. E Humberto? O imperial Humberto Coelho.

Uma taça escondida num saco de plástico
Era um tempo de ódios, esse tempo desta final.
«O treinador do Benfica não passa de um palhaço que já está despedido», atacou José Maria Pedroto, treinador do FC Porto, no seu estilo de espadachim cavalheiresco de pacotilha.
Mário Wilson, o treinador do Benfica, respondeu no campo. Mais uma vez.
É verdade que sairia no final da época para dar o lugar ao húngaro Lajos Baroti, outro cavalheiro, mas de estirpe mais fina. Todavia não saiu sem dar a sua resposta.
Aos 36 minutos, César, César Martins de Oliveiria de nome completo, nascido em São João da Barra no dia 13 de Abril de 1956, recebe a bola à entrada da área e faz o gesto de redopiar e chutar em arco. Remate por alto, sobre Fonseca, golo de bater em todas as redes, manso, clássico, inevitável.
Esbracejam os portistas. Reclamam por tudo e por nada.
Toni e Shéu são donos do meio-campo. Repartem a força e a técnica.
Frasco, Sousa e Romeu são insuficientes para o labor dos encarnados.
Pedroto arrisca a entrada do brasileiro Bife para o acompanhamento de Gomes.
Bife - José Silva de Oliveira, nascido em Vera Cruz, no interior do Estado de São Paulo, morto em Cuibá, em 2007, vitima de uma crise hepática.
De pouco serviu Bife.
Respondeu Mário Wilson com o possante Reinaldo, homem da Guiné.
O jogo divide-se em pequenas batalhas ao comprimento e largura do campo, mas o Benfica leva a melhor em todas.
A vitória será sua: 1-0. Esse golo fantástico de César.
Em redor do estádio drapejam as bandeiras verdes-e-brancas e vermelhas-e-brancas. José Maria Pedroto e o seu aprendiz Pinto da Costa conseguiram o que pretendiam: unir o país contra o FC Porto. A partir de agora serão sempre vítimas. Até quando são algozes.
Iremos esperar vinte e quatro anos para que um processo profundo desmascare tal falácia.
Outro César foi figura. César Correia de Faro, um árbitro medíocre e timorato que permitiu toda a espécie de confrontos.
O FC Porto já havia perdido o campeonato para o Sporting - o célebre tri que deu para vender t-shirts da Tri-naranjus (e ainda se riem de festejos antecipados...), e perdia agora a Taça para o Benfica.
Era preciso trabalhar muito mais nos bastidores.
Também medrosos, sem autoridade, os dirigentes da Federação Portuguesa de Futebol decidem não entregar a Taça de Portugal no final do jogo. Um funcionário de nome Telmo guarda-a num saco de plástico e desaparece em direcção à Praça da Alegria.
A alegria dos benfiquistas não tem taça. Ela virá para às suas mãos uns dias mais tarde, envergonhadamente como é próprio dos cobardes.
Mas tem o seu lugar guardado, ao lado das outras, suas irmãs, polidas à custa do suor dos que a conquistaram."

Afonso de Melo, in O Benfica

Bicampeões regionais entre stickadas e invasão de campo!

"Vitória numa final violenta que contribuiu para a conquista definitiva do troféu mais antigo de hóquei em campo

Pela primeira vez, foram cobrados bilhetes num desafio de hóquei em campo. Porém, isso não impediu que uma numerosa assistência acudisse ao Estádio das Amoreiras, a 27 de Maio de 1928, para o desafio final do Campeonato de Lisboa entre o Benfica e o Amoreiras.
O Benfica preparava-se para revalidar o título, esperando-se uma bela demonstração da modalidade. Era isso que os 3 golos do Benfica na primeira parte deram a entender. Mas tal não aconteceu no segundo tempo... Após o golo do Amoreiras, os nervos tomaram conta da partida. Ao verem as suas hipóteses de vitória reduzidas, os jogadores do Amoreiras excederam-se no jogo violento, que os árbitros não souberam reprimir eficazmente. Mas o pior estaria para vir! Quando o capitão benfiquista José Prazeres se preparava para marcar um canto, foi atingido no braço por um stick de um adversário, obrigando-o a abandonar o campo bastante magoado. O Benfica passou a jogar com 10 jogadores, mas continuou a dominar a partida.
Porém, o caos já estava instalado! O sucedido só veio agravar ainda mais o clima de violência. O resto do desafio pareceu mentira, com cenas dignas de filme. Os ânimos aqueceram ainda mais, viam-se sticks pelo ar, os jogadores do Benfica responderam e o árbitro, benevolente até então, decidiu expulsar um jogador de ambas as equipas. A assistência, indignada, reclamava intensamente, até que impacientes começaram a invadir o campo! Foi mesmo necessário recorrer a intervenção policial para acalmar os ânimos do público.
Restabelecida a ordem e com os jogadores prontos para recomeçar a partida, os árbitros decidiram suspender o jogo a apenas 6 minutos do seu fim. Ficou o título pendente, aguardando a decisão da Federação que veio a considerar, perante o contexto, o resultado válido. Faltava só um título para a posse definitiva da Taça Hockey Club de Portugal, numa altura em que era necessário três conquistas consecutivas. Este troféu, o mais antigo da modalidade, foi definitivamente conquistado na época seguinte e pode ser encontrado na área 1. Ontem e hoje do Museu Benfica - Cosme Damião."

Ana Filipe Simões, in O Benfica

Don Joseph

"1. Foi necessária a intervenção do FBI e da procuradoria-geral dos Estados Unidos para que fosse mostrado o cartão vermelho a Blatter. Eleito pela quinta vez consecutiva com o menor número de votos de sempre e, sobretudo, sem o apoio dos países da UEFA, o reconduzido presidente da FIFA vai ter um mandato atribulado, que dificilmente levará a termo. Desde logo, porque tem gente poderosa contra si - Obama, Merkel, Cameron -  e depois porque os processos para ele mais espinhosos, relacionados com a atribuição dos Mundiais de 2018 à Rússia e de 2022 ao Catar, estão ainda em fase de investigação, embora a prova já recolhida o incrimine em muita coisa. Neste momento só Vladimir Putin o apoia, ao mesmo tempo que pede a Washington que acabe com as tentativas de exercer justiça fora das suas fronteiras. A guerra é planetária. Até o relatório do ex-procurador norte-americano Michael Garcia, contratado a contragosto pela FIFA para se pronunciar sobre a transparência na escolha dos países organizadores daqueles eventos, continua no segredo dos Deuses há largos meses.
2. Em vez de se demitir, mal estalou o escândalo há uma semana, Joseph Blatter, qual bode alpino que nunca se detém perante os obstáculos, transformou-se assim numa espécie de capo mafioso do tipo Al Capone, Don Frank Costello, Don Vito Genovese e Don Salvatore Rina. É preciso dizer que na FIFA House ninguém faz perguntas ou se atreve a contradizer o chefe; ninguém consegue ler um balanço sem um descodificador (e, mesmo assim, fica sem saber que fatia dos 232 milhões de euros gastos em remunerações da Administração (!) toca a Don Joseph). Resta-nos agora aguardar pela vendetta do dirigente suíço, que poderá ser cruel para a Europa: menos um clube, no mínimo, no próximo Mundial, possibilidade de um play-off internacional contra outro continente, menos elementos, no Comité Executivo... A aproveitar seria o exército afro-asiático que o sustenta e defende. E se, em represália, a UEFA abandonasse a FIFA e se autonomizasse?"

Manuel Martins Sá, in A Bola