Últimas indefectivações

terça-feira, 27 de março de 2018

Uma relação íntima com o golo...

"Arsénio não era alto mas foi enorme. Tinha nele uma potência reservada que explodia em trovões chutados com violência e precisão. Um dia fez seis no Estoril. E fez quatro nas Antas, no dia da inauguração.

Uma vez, em Fevereiro de 1951, o Benfica foi ao Estoril, ao Campo da Amoreira, ganhar por 7-0. Convenhamos que, nesse tempo, o Benfica ganhava com mais frequência por 7-0 do que hoje. Mas não deixava de ser aquilo que podemos classificar de uma cabazada das valentes.
Mas esse jogo teve algo de especial. Uma espécie de outro jogo dentro do jogo. O jogo de um homem contra as balizas e contra o tempo. Aliado da bola e da sua ânsia absoluta pelo golo.
Falo de Arsénio.
Fala-se pouco de Arsénio e é um injustiça.
Arsénio foi grande. Ou melhor: foi enorme.
Nessa tarde de Fevereiro ventou com força. O vento furioso de Arsénio! Cinco-golos-cinco! Como nos cartazes das touradas: e só começou depois da meia hora - 32 minutos. Depois 48, 49, 59 e 84.
Só que, mais tarde, os cinco-golos-cinco passaram a seis-golos-seis!
O inicialmente atribuído a José Águas (40 minutos) foi emendado: tinha sido Arsénio o seu autor.
A façanha agigantou-se.
Agora acrescente-se um pormaior, como diria o Carlos Pinhão: era o que faltava reduzir Arsénio ao dia em que se tornou uma tempestade na Amoreira, em Fevereiro de 1951.
Em 1951, já Arsénio Trindade Duarte tinha oito épocas de Benfica: chegou em 1943. Ainda ficaria até 1955, saindo para a CUF, do seu Barreiro natal (tinha jogado no Barreirense antes de trocar o encarnado às riscas brancas pelo encarnado por inteiro), para ir depois fazer umas perninhas ao Montijo e ao Cova da Piedade.
Foi aprendiz de serralheiro e vinha de cacilheiro para Lisboa.
Era um daqueles homens de ir sempre: ir pela vida mesmo que tivesse de caminhar contra a vida.
O golo!
falei acima da injustiça de atirar Arsénio para uma espécie de terceiro plano da história das grandes figuras do Benfica.
Vamos e venhamos: Arsénio é de primeiríssimo plano!
Assim mesmo, com ponto de exclamação.
Morreu cedo como morrem aqueles que os deuses preferem. Tinha 60 anos.
A morte não pode atirá-lo para o olvido.
Não era alto, Arsénio. Mas forte, de uma daquelas potências reservadas, quietas, à espera do momento de desferir o seu golpe.
Marcava golos atrás de golos: mais de 230 com a camisola do Benfica.
É muito golo...
Arsénio tinha o dom do golo, a empresa do remate fácil e certeiro.
Um dia foi às Antas: 28 de Maio de 1952.
28 de Maio é um dia sinistro na História de Portugal desde 1926!
Ainda assim, dia escolhido para a inauguração do estádio do FC Porto.
O Benfica foi convidado: os clubes tinham relações de amizade, laços de respeito, bem diferente do que acontece neste futebol de hoje, futebol da idade da pedra.
E o Benfica ganhou. Ou melhor, trovejou: oito-a-dois.
O Benfica a trovejar nas Antas, bancadas e relvado novinhos em folha, e Arsénio a relampejar por entre os trovões.
Golos de quem tem fome deles: quatro.
Dois anos antes fizera um decisivo, na final da Taça Latina, contra o Bordéus, o do empate (1-1) que obrigaria a dois prolongamentos até Julinho decidir que o troféu ficava em Portugal pela primeira e única vez.
Só por pura estultícia se pode menorizar a Taça Latina na História do Futebol. Ou por aquele desdém que nasce na falta de pudor.
Só por estultícia se pode menorizar Arsénio na História do Benfica.
Ele foi enorme, apesar do seu metro e setenta e um de altura.
Havia nele uma noção prática da baliza. E uma relação íntima com a bola que se afeiçoava aos seus pés como um cachorrinho abandonado à espera daquele momento em que, num golpe de magia simples, a transformava em golo..."

Afonso de Melo, in A Bola

'O Melhor do Mundo'

"Um nome sugestivo para um extraordinário concurso, um valioso troféu e um grande clube.

Para assinalar o seu sétimo aniversário, o Diário Popular organizou um concurso-inquérito sugestivamente designada 'O Melhor do Mundo'. E, como a 'Voz do Povo é voz de Deus'... e melhor do mundo é o Benfica!
Foi em Março de 1949 que, com a premissa de consagrar 'o esforço dedicado e perseverante das agremiações desportivas do País em prol da educação física', o vespertino Diário Popular começou a anunciar 'o maior concurso de todos os tempos!'.
Para participar, era necessário recortar do jornal emblemas e quadras referentes a 'algumas das mais importantes associações desportivas do país', colá-los numa caderneta, fazendo-os corresponder, a indicar o nome do clube a que pertenciam. As cadernetas incluíam ainda as questões 'Qual o clube da sua simpatia?' e 'Qual o desportista que mais admira?', de reposta facultativa, para auferir quais os clubes e os atletas preferidos dos portugueses.
A possibilidade de concorrentes, atletas e clubes 'ganharem prémios valiosíssimo' fez de 'O Melhor do Mundo' um 'extraordinário êxito'. 'Mais de 50.000 pessoas, espalhadas do Norte ao Sul, e até mesmo nos territórios ultramarinos' participaram. E foi 'fraquíssima a densidade de boletins deixados em branco', apenas menos de 2% dos concorrentes optou por não responder ao questionário.
A entrega dos prémios ocorreu a 22 de Setembro, no Teatro Politeama, 'num ambiente verdadeiramente apoteótico'. Depois do sorteio dos prémios dos concorrentes e de 'uma brilhante parada de artistas de prestígio', 'Beatriz Costa fez a entrega dos prémios dos atletas e aos clubes premiados'. Francisco Ferreira, com 16741 votos, foi considerado o atleta preferido dos portugueses e 'a majestosa taça «O Melhor do Mundo» reservada ao clube mais popular', foi entregue ao Sport Lisboa e Benfica. Com 19876 votos, o Clube foi eleito o vencedor absoluto do inquérito. 'E viu-se bem pela ovação que coroou a entrega do valioso troféu, que o melhor do mundo é o Benfica'.
Criada pela Topázio, marca de renome da prataria nacional, a Taça «O Melhor do Mundo» é um dos muitos objectos do acervo do Sport Lisboa e Benfica que, não integrando a exposição permanente do Museu Benfica - Cosme Damião, se encontra em reserva no Departamento de Reserva, Conservação e Restauro."

Mafalda Esturrenho, in O Benfica

A ética é diferente em tempos de guerra?

"Bem pode Marcelo referir com ‘punhos de renda’ que no futebol há que moderar diálogos em defesa do espectáculo ou apelar aos políticos para comportamentos exemplares.

uns tempos, a propósito de discussões futebolísticas, um bom amigo comentava o facto de eu achar que ‘não vale tudo’ – no futebol como na política. Para ele, a «ética em tempos de guerra é diferente da ética em tempos de paz». Fiquei atónito. Percebi que nesta era em que os populismos se sobrepõem com facilidade a pensamentos racionalistas e estruturados, ainda há quem defenda as teorias de que «no amor e na guerra tudo é permitido», mesmo sabendo que violência gera violência. 
Na certeza de que muitos me consideram um tipo ‘ultrapassado’, por invocar valores e princípios éticos, dei por mim a pesquisar na net o que poderão ser os valores éticos em tempos de guerra. Li sobre tratamentos humanitários, sobre suspensão de valores, sei lá... Senti-me confuso! Até que deparei com algo que me fez sentido: a guerra é algo tão primitivo, que os únicos valores éticos a observar nos tempos atuais consistiriam em terminar com as próprias guerras! João Paulo II assim o defendeu, referindo que «toda a guerra, de si, já contraria a ética».
Fiquei reconfortado. Não estou sozinho na defesa de padrões idealistas, quantas vezes inatingíveis. Mas revejo-me em valores assim, conforto-me no meio de autênticos pirómanos que tudo ateiam à nossa volta. Quer no futebol, quer na política, os fins justificam os meios, os combates ganham-se sem perdão, como nos circos romanos. Os princípios e valores passaram a ser «se formos perseguidos por comportamentos menos éticos ou mesmo legalmente puníveis, nada como nos tornarmos perseguidores e aniquilarmos quem nos critica»!
Os exemplos são diários, as fugas para a frente são ‘o pão nosso de cada dia’, com uma comunicação social ávida de ‘sangue’, dando mais protagonismo a certos figurões da nossa praça – todos eles vítimas de sistemas ‘persecutórios’, seguramente resultantes de leis aberrantes. Uma característica todos têm em comum: além de narcisistas, são populistas! Bem falantes, clamam inocências contra evidências, dormem mais descansados que todos aqueles que os ouvem. Intuito? Poder! Continuar, prorrogar ou regressar, num país em que esperam que o tempo apague da memória colectiva os actos imputados.
Bem pode Marcelo referir com ‘punhos de renda’ que no futebol há que moderar diálogos em defesa do espectáculo (afinal, hoje uma indústria) ou apelar aos políticos para comportamentos em que os portugueses se revejam. Bem como estabelecer pontes e compromissos estruturais em defesa do povo português. Em ambientes belicistas, como os actuais, a única linguagem de ética, talvez audível, seria: 
1. No futebol, aquela que a UEFA usa: dureza nas punições, que transforma dirigentes e treinadores portugueses em autênticos ‘cordeiros’;
2. Na política, o aparecimento de novas forças políticas com ideologias renovadas, e com novas gerações que cerceiem os populismos desenfreados."

Faz de conta

"Tem-se escrito tanto e tanto sobre o BES e o Novo Banco, navegando entre um extremo e outro do enaltecimento ou da reprovação, consoante os interesses pessoais de quem emite esses juízos de valor.
Num período em que o que podemos designar por Grupo Benfica deixa praticamente de ter qualquer dívida perante entidades bancárias, eis que surge uma notícia aterradora - O Novo Banco poderá ser o accionista 'trust' da Sporting SAD.
Que já o era já nós sabíamos pela singela razão dos célebres VMOC, ou, o que é a mesma coisa, dos Valores Mobiliários Obrigatoriamente Convertíveis. Como já estamos fartos de ver, esta convertibilidade obrigatória é daquelas obrigações muito à portuguesa - estás obrigado a fazer isto, mas nunca o vais fazer!
Por esta razão, eu preferia chamar a isto VMPB, ou, o que é a mesma coisa, Valores Mobiliários Para o Bochecho. Ainda acrescentaríamos infinitamente inconvertíveis. É bom que os legisladores criem um novo instituto jurídico com estas características.
A entrada de novos investidores na Sporting SAD estava prevista desde final de 2014, mas, até ao momento, mantém-se inalterada.
O Novo Banco terá emprestado 18 milhões de euros à Sporting SAD. O valor terá sido, disponibilizado à SAD até à entrada de um novo accionista com a garantia de que o banco pudesse reaver o dinheiro acrescido de juros de 1%. O novo accionista ficaria com 21,2% da sociedade.
A primeira pergunta que se coloca é a seguinte:
Como é possível que o Novo Banco, que resultou de uma resolução do Banco de Portugal, possa meter-se nisto e ainda por cima empresta dinheiro a 1% de juros?
Será que todos e cada um de nós não quereríamos empréstimos com taxas de 1%? Será isto legal?
O Novo Banco comunicou à Comissão de Mercado e Valores Mobiliários a venda da sua surcursal na Venezuela.
Na verdade, informou que o valor de venda dos activos e passivos da Sucursal na Venezuela do Novo Banco ao BANCA-MIGA, Banco Universal, C.A., da Venezuela, ascendeu a 11.707.500 mil bolívares venezuelanos (aproximadamente 272 mil euros ao câmbio DICOM-BCV de 28 de Fevereiro de 2018). Uma fortuna!
Curiosamente, ou não, o BES Miami foi vendido à Venezuela, por 10 milhões de dólares, cerca de 9,1 milhões de euros, ao grupo venezuelano Benacerraf.
Mas ainda existe a célebre história dos fundos venezuelanos ligados ao petróleo.
Em 2014, dois fundos estatais da Venezuela, o Bandes e o Fonden, investiram um total de 800 milhões de dólares em dívida ao Grupo Espírito Santo. Depois, quando começaram a tornar-se públicos os problemas com o risco de pagamento de dívidas de papel comercial, dois administradores do BES assinaram cartas conforto supostamente garantindo o pagamento de metade daquele investimento, 400 milhões de dólares. Logo que os auditores tornaram conhecimento dessas cartas de conforto, obrigaram o então BES a constituir uma provisão no mesmo valor, o que agravou os resultados do primeiro semestre de 2014, que conduziram ao reconhecimento de uma perda nas contas do BES no valor de 267 milhões de euros, com referência a 30 de Junho de 2014. Os 267 milhões de euros eram então o equivalente aos 400 milhões de dólares, sendo que mais 400 milhões de dólares estavam por garantir.
Só que, depois da cisão entre 'banco bom' e 'banco mau' (respectivamente, Novo Banco e BES), o Banco de Portugal considerou que as cartas de conforto não tinham validade jurídica enquanto garantia. E passou o crédito para o 'banco mau'.
O Grupo Novo Banco apresentou um resultado negativo antes de impostos de 355,6 milhões de euros em 30/9/2017.
Não nos podemos esquecer de toda a movimentação financeira do BES para o BES de Angola, que era gerido pelo detentor actual de uma participação substancial na Sporting SAD, a Holdimo, no valor de 20 milhões, correspondente a 30% do capital da Sporting SAD, conforme explicamos (...).
Quem andou, anda e vai andar a pagar isto tudo são os contribuintes, ou seja, todos nós.
Este tipo de situações são as mais corriqueiras num país que vive num estado de permanente guerra, ódio, inveja e faz de conta.
Faz de conta que nada se passa!
Faz de conta que somos todos amigos!
Faz de conta que somos ricos!
Faz de conta que arguido é condenado!
Faz de conta que a coisa se passou como a testemunha diz!
Faz de conta que não existem processos kafkianos!
Faz de conta que os condenados são culpados, e os absolvidos, inocentes!
Faz de conta que nós somos os mais, e aqueles, os bons!
Faz de conta que a economia é inteligente!
Faz de conta que somos todos donos do saber e da verdade!
Faz de conta que e tudo dr.!
Faz de conta que aquele tipo é porreiro!
Faz de conta que não desejamos mal uns aos outros!
Faz de conta que a Casa de Papel não é mais do que aquilo que todos somos!
Faz de conta que só os outros é que cometeram crimes e fomos sempre todos uns santinhos!
Faz de conta que se mente mais na rua que no tribunal!
Faz de conta que o dinheiro do Novo Banco não foi posto na Sporting SAD!
Faz de conta... faz de conta... faz de conta!

Até para semana."

Pragal Colaço, in O Benfica

Bruno de Carvalho nunca soube...

"Não será bom para o futebol português nem para a sua competitividade ver o Sporting a lutar pela permanência daqui a uns anos.

Bruno de Carvalho nunca soube o que foi ser campeão. Felizmente, ao contrário, a imensa maioria do povo português sabe o que é ser campeão nacional de futebol, pelo menos nos últimos 15 anos. Tanto assim é que o próprio treinador do Sporting Clube de Portugal já foi no Sport Lisboa e Benfica campeão por três vezes.
Como é óbvio, a título de registo de interesses, sou do Benfica, pelo que nada me move contra Bruno de Carvalho; antes pelo contrário, a ele agradeço a constante motivação que fornece aos adversários, por um lado, e por outro a instabilidade que cria ao seu Sporting.
Sou dos que entendem que Jorge Jesus é um dos melhores treinadores de futebol do mundo, pelo seu saber e pela sua ambição, pelo que a questão que se coloca é: até quando Jorge Jesus aguentará perder títulos e campeonatos por causa do seu presidente?
Bruno de Carvalho nunca soube o que é ser campeão nem nunca saberá pela simples razão de “que aqueles que se dedicam demasiado às pequenas coisas tornam-se, normalmente, incapazes das grandes”.
O seu drama é poder ficar para a história como John May ou o dr. Reinhardt Schwimmer, ambos vítimas de Al Capone no famoso massacre de São Valentim. Contudo, Bruno de Carvalho tem ainda uma grande luta pela frente que é conseguir que o seu Sporting fique à frente do Sporting de Braga.
O Sporting não é um clube pequeno de todo, antes pelo contrário, há que reconhecer o seu mérito e a sua história que, não se comparando com Benfica ou Porto, também é grande. O real problema da instituição Sporting Clube de Portugal é a sua direcção e o caminho que ela toma, porque quando uma grande instituição é gerida por pessoas menos capazes, e menos bem formadas, tende a diminuir-se.
Não será bom para o futebol português nem para a sua competitividade ver o Sporting a lutar pela permanência daqui a uns anos. O futebol é uma festa e um grande desporto, o respeito pelo próximo nunca fez mal a ninguém e há que praticar os bons costumes mesmo em competição."

Claques: inacção e caos ou competência?

"Ao longo de décadas, foram várias as vezes que ministros europeus se reuniram para analisar questões de violência associada ao desporto, particularmente ao futebol. A visibilidade e mediatização do futebol facilitaram as escolhas de quem pretende protagonismo de qualquer forma. 
Desde o século passado que surtos de vandalismo irromperam por diversos estádios, deixando marcas dramáticas (incluindo mortes) sem que um programa comum fosse aplicado a nível global.
O risco, o medo, o silêncio e a necessidade de protecção, foram afastando adeptos e simpatizantes. É certo que outros vieram…
Repentinamente, embora preparadas ao longo de anos, surgem ondas de violência, de intolerância, de guerrilha permanente, muito pela incapacidade de governantes e dos dirigentes que tutelam o futebol que não conseguem definir rumos eficazes (mesmo que vantajosos unicamente para si próprios). Há uma encenação generalizada, há focos decididos em alimentar polémicas, há promessas nunca cumpridas após eleições, há muita incompetência e nenhuma coragem. A necessidade de integração, a divulgação sistemática de imagens violentas, o faz-de-conta de quem tem obrigação de pensar, prever e agir, a facilidade e velocidade com que qualquer notícia se mundializa sem sequer ser escrutinada, alimentam impulsos, fomentam reacções, “institucionalizam” comportamentos violentos.
Líderes de ocasião fomentam ódios, constroem muros ferozes, surgem confrontos (sem razão fundamentada, mas só porque sim), destroem-se em segundos valores essenciais da humanidade, num paradoxo incompreensível: numa época de globalização, prometida como sucesso para todos, cada vez mais se potenciam conflitos locais e injustiças. Claro que a corrupção, os investimentos que ninguém controla (nem parece querer controlar) e que viajam para paraísos fiscais, as enormes diferenças de regimes tributários e mesmo de legislação diversa, funciona como desresponsabilização política.
De grandes frases, de gestos magnânimos e emocionantes, de selfies, está a ilusão fortificada para construir nova realidade… que continua, algumas vezes, triste, dramática, em mentiras sucessivas. Criticar não é dizer mal, como se quer fazer crer para impor a unanimidade.
Criticar não é somente ver os defeitos e qualidades dos outros, mas também os próprios e acima de tudo descobrir pistas e caminhos para evoluir. A necessidade de tolerância é fácil de entender e de praticar: basta aceitarmos que todos têm direito à liberdade de expressão.
O tempo de ócio que muitos preenchem com desporto (como prática ou como observador/assistente) passou a tempo de “negócio”, de confronto e não de apoio ou prazer. A emoção de assistir a um jogo é extremada com tempo desperdiçado em protestos contra adversários, contra arbitragem (e VAR), contra “golpes” orquestrados pelos que são identificados como ilegítimos senhores do poder. A violência é também uma questão de educação que se propaga sem controlo.
Boicotes políticos, nacionalismos exacerbados, desemprego e injustiças sociais são, entre muitos outros, os principais adversários comuns.
São eles que perpetuam as cegueiras explosivas de fundamentalismos clubísticos ou outros.
A criminalidade tem aí um amplo espaço de crescimento. Ainda há dias, as televisões transmitiram imagens, junto ao campus judicial de Lisboa, de uma situação de risco social e de falta de segurança pública.
Aí reside também um dos grandes focos de instabilidade: a justiça carece de uma imagem de competência, de rigor, de excelência e imparcialidade. Actualmente, a sua imagem pública (por diversos casos lamentáveis) está bastante desvalorizada, sendo um grave problema para o país. A frustração, a falta de melhores condições de vida, a ausência de trabalho com estabilidade para ambicionar um projecto de vida, representa um foco infeccioso para situações de violência. A inacção (ou desempenhos contraditórios) de ministros, de secretários de Estado, do IPDJ, da FPF e da LIGA, são sempre rastilhos para grandes explosões.
Em qualquer pirâmide, a segurança do topo depende da estabilidade da base.
Não fazer diagnósticos precisos e não definir planos competentes e eficazes, com visão alargada, é não cumprir integralmente a missão que lhes foi confiada.
Melhorar condições sociais, erradicar injustiças e abandonos humanos intoleráveis, não criar situações que favoreçam conflitos desnecessários entre gerações, penalizar actos violentos, atacar a corrupção, revelar, com atitudes e obras, vontade em desenvolver o país, não facilitar enriquecimentos ilícitos, nem abandonos dos mais idosos e do interior, cada vez mais desertificado, são algumas das medidas urgentes que ajudarão também a pacificar o futebol.
Quem dirige instituições tem de ser merecedor de admiração pela sua capacidade de inovar, competência e seriedade. No futebol, ao contrário do que se passa na política, não pode haver famílias que se protegem e que são donas do destino da nossa “jangada de pedra”.
Curiosamente, passado o período revolucionário, constata-se o regresso dos lóbis e famílias que sempre controlaram o país. As provas estão à vista: a desigualdade é enorme; há um elevado índice de pobreza mesmo em cidadãos com emprego (salários muito baixos e precariedade).
O país, os portugueses, merecem lideranças mais coerentes, cumprindo a palavra dada e sem mistificações, por mais sustentadas em relatórios que tratam do virtual.
As claques são também uma consequência de um país que se deixou andar ao sabor da corrente e dos ventos, dos favores e benesses, das borlas substanciais e das decisões diversificadas, sem critério uniforme nem rumo definido.
Num apontamento jornalístico de 1935, enviado por um amigo, com o título “A acção das claques” conseguimos ler: “Não é desconhecida a utilidade e o valor de uma claque que sabe transmitir aos homens do seu club preferido, por aplausos e incitamentos vibrantes, em ocasiões de desânimo, o seu entusiasmo e a sua fé por uma vitória ou por um resultado honroso; sabe-se quanto pode influir numa equipa ou no só homem, em luta, o amparo da multidão, incutindo-lhe valor para prosseguir ou para levantar o seu moral em momentos de desfalecimento. É, por isso, meritória e necessária até, a acção dos suporters dos clubes. Mas essa acção nunca poderá ou não deverá ser feita com o menosprezo para o adversário nem utilizar-se de um vocabulário agressivo (…) Seja a claque forte, altiva, transbordante de entusiasmo, mas, e sobretudo, digna cada uma das cores que defende.” (lamento desconhecer o autor pois merece reconhecimento)
Contudo, quando entidades oficiais tratam claques de forma diferenciada, nada mais fazem do que atirar achas para uma fogueira já enorme e que urge ser controlada.
Responsabilizar, criar regras precisas, valorizar imagens e coreografias criativas e atitudes positivas de apoio, manter a dignidade na defesa do clube sem perder tempo útil no jogo de apoiar positivamente até ao fim, distinguir-se por acções de solidariedade e contributos para o desenvolvimento do futebol, são hoje alguns dos desafios que merecem ponderação.
Insultar adversários é perder tempo precioso de apoio à própria equipa.
Saber que em vez de multas constantes, de atitudes infelizes, existirão claques legalizadas, distinguidas e reconhecidas, não é só um benefício para o futebol, mas também uma das mudanças que temos de ensinar e exigir aos políticos que juraram pela sua honra cumprir as funções que lhes foram confiadas. Aos que não o souberem fazer, substituição imediata e decisiva."

As saudades que tenho de ver Portugal jogar bem à bola!

"Tenho saudades de Rui Costa. Muitas!
De Luís Figo e João Vieira Pinto. De Pedro Barbosa, Capucho e Sérgio Conceição.
De Paulo Sousa, o geómetra.
Da gola amarela, a caminhar para o dourado, a debruar o vermelho escuro. Classe. Classe sobre classe.
O verde, também com amarelo, antes das meias vermelhas. Números bem vivos, à frente perto das quinas, e atrás, a não deixar ninguém ao engano.
É natural que hoje tenha mais saudades do que nos outros dias. Hoje batem com mais força, como costuma dizer-se.
Tenho sobretudo saudades do futebol que Portugal jogava, que para os outros fazia da equipa de todos nós o Brasil-da-Europa.
De um 10 capaz de desenhar meias-parábolas de ruptura, de extremos habilitados para perfurar duas linhas defensivas rivais. De avançados inteligentes, preocupados em baixar para haver homem-extra na construção. De médios-defensivos com classe, sempre no sítio certo, capazes ainda de participar no ataque, se lhes pediam.
Sinto especialmente hoje falta desse futebol, que não deu ao país título algum após a maioridade, mas quem o viu alinhavar-se por esses relvados fora com pontos únicos de brilhantismo não irá conseguir esquecer.
Lá por ter resultado uma vez, no meio de traças de inspiração bíblica, não vão convencer-me certamente que esta é a formula certa para campeões, ou, pior, a receita mais portuguesa jamais criada.
Cruijff dizia, com todos os dentes que tinha, enquanto diluía lentamente um pirolito ao canto da boca, que a Holanda tinha saído mais vencedora de 74 do que a campeã Alemanha. Tão ganhadora que criou raízes em Barcelona e foi transplantada depois para a selecção espanhola e para a Alemanha. Tinha obviamente razão.
Também compreendo Pep Guardiola quando assume que jogar bem só por jogar bem nada significa, é necessário vencer. Vencer e jogar bem é sempre a medida perfeita. Vencer com um estilo e uma cultura próprios. Vencer, mas não só vencer. Jogar bem, mas não só jogar bem. Jogar bem sem vencer era como o tiki-taka sem objectivo.
Odeio o tiki-taka, é uma porcaria e completamente desprovido de sentido.
Escrevo esta crónica depois de um 0-3 profundo antes do Campeonato do Mundo, perante a Holanda mais afastada da prima de 74 que houve. Depois de quatro médios centro num meio-campo de quatro, com um único Quaresma a cair nos flancos para dar largura e tentar reatar a ligação com Cristiano. Escrevo-o depois de um particular sim, com meses de avanço, se alguém quiser provar que estou errado. Pouco me importa o resultado. Importa-me sim o que não conseguimos fazer.
Preocupa-me que nos tenhamos esquecido de como é jogar bem.
Que achemos que só se ganha assim.
Que reneguemos o futebol que é o nosso ADN.
Ou que sejamos estúpidos o suficiente para pensar que ainda não esgotámos toda sorte do mundo, naquela prova de fé de Éder em Paris.
A defender mal, com uma defesa para lá da data de validade, com um meio-campo sem rasgo e criatividade, e a depender de Cristiano como nunca, os deuses teriam de estar a compensar-nos por todas as nossas vidas passadas para que o raio caísse duas vezes no mesmo sítio.
Tenho saudades de quando jogávamos bem à bola.
Agora, se ganharmos outra vez a jogar com nota medíocre até posso ficar feliz e festejar por uns dias. Só que, passada a euforia e ressaca, voltarão as saudades.
E o Portugal de 2018 não será mais, para todos os outros, do que um agonizante regresso ao passado, que ninguém, mais uma vez, tentará imitar."

Benfiquismo (DCCLXXXIX)

Dar música...

Guedes...

Marcelo gastou latim e perdeu tempo...

"A clubite está a dar uma contribuição negativa à sociedade, tornando-a intolerante e radical. Não é esse, de todo, o papel do desporto...

O futebol dos clubes regressa no próximo fim de semana e até 20 de Maio, dia da Final da Taça de Portugal, não haverá interrupções. Ou seja, sem pausas para recarregar baterias, vêm aí, até à festa do Jamor, as últimas sete jornadas da Liga, as segundas mãos das meias finais da Taça e os desafios da Liga Europa. Por aquilo que foi possível constatar nos últimos dias, estes jogos decisivos vão ser disputados tendo como pano de fundo um ambiente tóxico, de cortar à faca, onde a calúnia e a provocação têm lugar marcado.
Está à vista de todos que, quando o Presidente da República, na Gala das Quinas de Ouro, fez um apelo à elevação e à compostura, gastou latim e perdeu tempo. O futebol português, por mais que a Federação Portuguesa de Futebol se multiplique em iniciativas de primeiro mundo, por mais que a Selecção Nacional seja campeã europeia e esteja no pódio do ranking da FIFA, ou que tenhamos uma formação que revela competência, visão e modernidade, vai sempre empanar na mais velha de todas as questões, a clubite, desta feita elevada à potência da insanidade, numa senda feita de desespero que só desqualifica quem a pratica. Portugal vive dias complicados por causa do futebol, há demandas em tribunal, as autoridades investigam vários casos e a própria integridade do sistema judicial foi colocado em causa. Tudo isto configura uma situação de tal forma séria que a única coisa responsável a fazer é deixar que as polícias, o ministério público e os juízes façam o seu trabalho, sem ruído adicional.
Infelizmente, é o contrário que se verifica e nada nos faz crer que até ao fim da época haja alguma redução neste clima de afronta e ódio, nesta linguagem entre o impróprio e o bélico, absolutamente fora da tradição do desporto.
No fim da época, como sempre, só um clube será campeão, e apenas um outro será dada uma hipótese de nadar na piscina dos grandes e os restantes vão contar os trocos para a Liga Europa.
Até meados de Maio tudo estará resolvido. Depois desse momento, será preciso viver numa sociedade onde a terra foi toda queimada, as pontes destruídas e qualquer política de diálogo será vista como uma concessão e uma fraqueza. É este o contributo que queremos que o futebol dê a Portugal e aos portugueses?

Ás
Cristiano Ronaldo
A exibição de Portugal frente ao Egipto estava a ser cinzenta e parecia que os campeões da Europa teriam de conformar-se com uma derrota desprestigiante. Porém, Cristiano Clark Kent Ronaldo trocou de roupa na cabina telefónica e já na pele de Super Homem marcou dois golos e deu a vitória a Portugal. Um fenómeno, uma alegria, uma bênção.

Ás
João Sousa
Depois de um apagão que o fez descer até a 80.ª posição do ranking ATP, o tenista português renasceu e apurou-se ontem para a quarta ronda do torneio de Miami após derrotar o norte-americano Donaldson. Este sucesso, após vitórias recentes sobre Zverev o Goffin, prenuncia o regresso do melhor João Sousa.

Ás
Rodrigo Freudenthal
Os Lobos estiveram longe de apresentar na Polónia a sua melhor versão, mas acabaram por vencer na bola de jogo, graças a um ensaio do belenense Rodrigo Freudenthal, conquistando assim o Europe Trophy (III Divisão). Para ganhar à Alemanha e regressar ao Championship, vai ser preciso jogar muito mais e melhor.

O bom exemplo que vem de uma rivalidade acesa
«Disse que estava a brincar (Hamilton afirmou que ia tirar-lhe o sorriso do rosto) e eu acredito nele»
Sebastian Vettel, piloto da Ferrari
Vettel e Hamilton, os dois melhores pilotos de F1 da actualidade, já tiveram alguns desentendimentos que podiam ter acabado mal. Pelos vistos aprenderam com os erros e depois de ter ganho o GP da Austrália, primeira prova da época, o alemão tratou de matar uma nova polémica entre ambos que estava a crescer. E até disse que já tem idade para ter juízo. Um bom exemplo...

Vitória de Guimarães
Júlio Mendes venceu (por escassa margem) as eleições para a presidência do Vitória Sport Club de Guimarães e parte para um terceiro mandato que o colocará como segundo líder (atrás de António Pimenta Machado, 24 anos no poder) com mais tempo no comando do emblema que tem D. Afonso Henriques como símbolo. Não será fácil, por certo, o trabalho que espera Júlio Mendes, mas a tarefa é deveras aliciante, à medida da exigência de uma massa associativa que vive o dia a dia do clube com uma paixão sem limites.

Austrália apanhada em batota no críquete
Os australianos estão em estado de choque e a manchete do 'Daily Telegraph', 'Shame' (Vergonha) revela bem a comoção que vai pelos antípodas. O capitão da selecção de críquete, que está 'on tour' na África do Sul, foi apanhado a modificar a bola de jogo, já foi demitido, mas o embaraço vai permanecer..."

José Manuel Delgado, in A Bola