"Marcadas para o próximo mês de Dezembro, as eleições para a Federação Portuguesa de Futebol têm feito correr muita tinta. Primeiro foram as candidaturas, concretizadas e abortadas; os apoios, concedidos e negados; e a muita especulação que sempre acompanha este tipo de processos. Agora está em cima da mesa a arbitragem, elemento para onde confluem quase todos os interesses, declarados ou não, dos principais clubes profissionais.
Há, no entanto, um assunto que, enquanto benfiquista, me preocupa ainda mais do que as mãos onde vai cair a arbitragem no novo elenco federativo. Falo dos direitos televisivos, e dos rumores que se vão ouvindo, aqui e ali, sobre a eventualidade da respectiva negociação poder passar a ser centralizada. Pior do que Paulo Costa do Conselho de Arbitragem, só mesmo a concretização desse intento, que constituiria um profundo golpe nas legítimas aspirações do Benfica a fazer valer a sua maior popularidade.
Todos sabemos que o contrato que ainda vincula o nosso clube à Olivedesportos foi assinado em circunstâncias muito peculiares, e não reflecte minimamente o peso social e comercial do Benfica. Não podemos culpar outros por isso. Foram três anos de gestão calamitosa que levaram a que tivéssemos de negociar com a corda já bem apertada ao pescoço. Findo o prazo a que estamos contratualmente obrigados, chegaria por fim a ansiada liberdade de, num contexto completamente diferente, de boa saúde e com voz grossa, fazer ouvir os nossos interesses, e cobrar o justo valor pelos nossos jogos, dando início a uma nova fase na nossa história. Os que pretendem centralizar a negociação dos direitos televisivos, pretendem anular essa possibilidade. Pretendem manietar o Benfica, e fazer dele um instrumento ao serviço de outros, inclusivamente daqueles que o hostilizam.
Alega-se que essa centralização tornaria o Campeonato português mais equilibrado. Nominalmente talvez fosse verdade, mas esse equilíbrio seria necessariamente estabelecido por baixo. Puxando os pés aos que maiores condições têm para voar fora de portas, teríamos um equilíbrio alicerçado na mediocridade.
O verdadeiro mercado onde o Benfica tem de concorrer é o mercado europeu. É na Liga dos Campeões que o Benfica tem de se afirmar como grande clube português, representante legítimo de um Futebol que, muitas vezes, nem sequer o merece. As suas receitas têm de ser compatíveis com as dos emblemas que competem no mesmo espaço, e buscam semelhantes objectivos. Não necessitamos de equiparar o Benfica com o Feirense ou com o Rio Ave. Queremos é um Benfica, tanto quanto possível, no mesmo plano do Manchester United, do Real Madrid ou do Chelsea. É isso que o futebol português deve procurar para os seus mais representativos clubes - à cabeça dos quais figura claramente o nosso.
Há países onde as coisas não funcionam deste modo. Nesses, além do bolo televisivo ser muito maior, a dimensão e diversidade do mercado também o são, existindo vários clubes capazes de polarizar regiões, e agregar multidões. Sabemos que não é o caso de Portugal, onde uma alteração dessa natureza traria necessariamente consigo o pecado da artificialidade, e mesmo da concorrência desleal.
Ao contrário do que acontece com a vida, com a economia e com a política, não creio que no Futebol profissional tenha de haver especiais preocupações em proteger financeiramente os mais fracos - leia-se, aqueles que não têm adeptos, não geram receitas, e não conseguem sustentação para manter os níveis competitivos a que os seus dirigentes, muitas vezes por propósitos extra-desportivos, aspiram. Não estamos a falar os seres humanos, nem de empresas particularmente geradoras de emprego, mas sim de SAD's ou afins, que só devem existir e competir se tiverem condições para o fazer, respeitando as regras e os profissionais que contratam.
Dir-me-ão que, sem discriminação positiva, muitos clubes deixariam de ter condições para competir ao mais alto nível, e que, cingindo-se às receitas que cada um conseguisse realizar, não sobrariam mais de dez para uma primeira divisão. Pois é isso mesmo que defendo (uma drástica redução de clubes profissionais, e, como consequência, um Campeonato a quatro voltas), por me parecer que o nosso pequeno país, com as suas limitações geográficas, demográficas, e (sobretudo) económicas, não tem condições para mais.
Não devem ser os grandes clubes - neste caso o maior de entre todos eles - a pagar, com a perda da sua competitividade internacional, o preço de uma desmesurada e artificial dimensão do panorama desportivo nacional. Não é esse o nosso problema, e não pode ser resolvido à nossa custa.
Por tudo isto, creio que a manutenção da liberdade de negociação dos direitos televisivos é algo de que o Benfica nunca poderá abrir mão. E qualquer candidato que não se comprometa firmemente com esse princípio, nunca poderá ter o nosso apoio."
Luís Fialho, in O Benfica