Últimas indefectivações

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Espírito de Campeão

"A goleada, a festa nas bancadas, o regresso de um grande Saviola, e a liderança (ainda que repartida) no Campeonato, trouxeram-nos, no passado fim-de-semana, a memória da saga de 2009/2010. Sentiu-se esse doce aroma no Estádio da Luz, porventura pela primeira vez desde que, numa certa tarde de Primavera, dois golos de Óscar Cardozo derrotaram o Rio Ave, e levaram para a rua milhões de pessoas em todo o mundo, numa inolvidável manifestação de fervor Benfiquista.

É cedo para tirar conclusões acerca do que poderá acontecer durante uma temporada que ainda está longe de chegar a meio. E é sempre inoportuno embandeirar em arco, até porque a concorrência mais directa não dá grandes sinais de cedência (FC Porto continua em primeiro lugar, e o Sporting vem a fazer uma recuperação notável). Há que dizer também, em nome da verdade, que o Paços de Ferreira surgiu na Luz bastante enfraquecido pelas múltiplas ausências de jogadores lesionados e castigados, não sendo, de todo, a equipa que na última temporada (com David Simão, Nelson Oliveira, Pizzi entre outros) triunfou em Alvalade e em Braga, e vendeu cara a derrota na final da Taça da Liga.


Um Benfica à medida do fato de campeão

Mas se olharmos para o que esta época já nos deu, vemos um Benfica imbatível (treze jogos oficiais, zero derrotas), que está na frente da Liga, que ultrapassou com distinção duas difíceis pré-eliminatórias europeias, que entrou na Fase de Grupos da Champions League impondo um empate ao todo poderoso Manchester United, que ganhou na Roménia, e cujo registo global só um triste empate em Barcelos impediu de se cruzar com a perfeição. Quase sem nos darmos conta, temos um Benfica à medida do fato de campeão, que há dois anos tão bem lhe assentou.

A última temporada trouxe, entretanto, traumas que custaram a cicatrizar. Não foi - como aqui disse em várias ocasiões, e ao contrário da imagem que prevaleceu - uma época totalmente desastrosa (ainda assim, 2.º lugar, meias-finais europeias, Taça da Liga, 18 vitórias consecutivas), mas foi uma época marcada por derrotas particularmente dolorosas, mais até pelas circunstâncias que as rodearam do que propriamente pelos factos em si. Houve azar, houve obstáculos à preparação e visível mão da arbitragem, que nos ceifou permaturamente as aspirações no Campeonato, nos retirou da Taça de Portugal (com um esquecido golo de Hulk em fora-de-jogo), e até na Liga Europa se fez sentir - pois a malfadada jornada de Braga poderia ter tido outro desfecho se o golo solitário da partida (em lance onde Cardozo é claramente impedido de chegar à bola por um adversário) tivesse sido invalidado, como se impunha.

O que ficou foram os resultados, e a memória do sofrimento e da angústia. E isso levou a que muitos benfiquistas olhassem para o regresso às competições com o pé da precaução bem atrás do olhar da confiança. A última semana terá feito render mais alguns cépticos, e pouco a pouco a onda vermelha vai tornando a sua mais viva cor. O Benfica vai ganhando, evidência solidez, e é neste momento, pelo menos, tão favorito como o FC Porto à conquista do título, o que representa generalizadas quando se iniciou a pré-temporada.


As encomendas continuam...

Um resultado que pareceu de encomenda (pelo menos, pareceu), permitiu ao conjunto portista manter, em Coimbra, ante uma equipa orientada por Pedro Emanuel, a liderança aritmética da prova, e um suplemento anímico de que andava urgentemente a necessitar. Nem outra coisa seria de esperar de uma partida onde, acontecesse o que acontecesse, se sentia que alguma coisa haveria de guiar o FC Porto à vitória (e os golos de que necessitava para se manter à nossa frente, sabendo-se o quanto esse simbolismo pesa por aquelas bandas). A estrutura é poderosa, e não brinca em serviço, sobretudo quando as circunstâncias são difíceis. E três jogos consecutivos sem ganhar já estavam a fazer mossa.

O que o Benfica mostrou (e tem mostrado) deixa, no entanto, muitas esperanças no ar. A equipa de Jesus está cada vez mais forte, e não vai - certamente - perder muitos pontos. O leque de opções é vasto, e a flexibilidade táctica parece até mais substancial do que a do ano do último título. Olhando para o perfil deste plantel, e para a consistência que a equipa tem revelado jogo após jogo, temos todos os motivos para confiar numa época de grandes sucessos.

Terá sido a noite de sábado um sinal disso mesmo? Acreditemos que sim."


Luís Fialho, in O Benfica

À boleia

"A Seleção Nacional voltou a viajar ontem com uma comitiva de adeptos de alto coturno, oficializando em momento oportuno o fim da crise de valores, da falta de liderança e da perda de identidade que a afetavam há uns tempos. Com tão solidários apoiantes, até o sorumbático Gilberto Madaíl voltou a aparecer aos microfones, sorridente e prazenteiro, pronto para arrecadar os salamaleques e honrarias que o sistema, venerando e obrigado, houver por bem destinar-lhe para a reforma.

Indiferentes ao folclore, selecionador e jogadores aprestam-se a servir hoje ao país o resultado desejado com todo o profissionalismo e alguma sobranceria pelo regresso à sua intimidade dos padrinhos e afilhados da grande família da bola. Quando tudo se desmorona neste Jardim de contas de sumir e o pessimismo toma conta dos portugueses, sabe bem acender a pantalha, como se ligássemos a máquina do tempo e caíssemos outra vez no tempo dos bitaites, ao ver por lá desfilarem os grandes líderes do triunfalismo, inalando a fumaça dos havanos de quem paga as despesas e arrecada o dinheiro grosso.

Esta viagem à Dinamarca sugere que tudo vai bem no reino da bola: um presidente no seu posto, selecionador em estado de graça, jogadores bons, ricos e famosos, uma sequência de resultados sem precedentes. O cenário ideal para atrair apoios, para fazer amigos, para empolgar políticos. E no regresso, entre uns brindes e umas larachas lapidares, os últimos pormenores da divisão de poderes acabarão acertados e garantidos para mais dez campeonatos.

Agora que as eleições da Federação se apresentam decididas, antes de a opinião pública ter sequer conhecimento dos propósitos e orientações da futura liderança, para lá da desvenda avulsa de dois ou três nomes benignos, esta fulminante transição ofensiva do eixo dominante promete deixar de rastos por muitos e bons anos os paladinos da verdade desportiva que optaram por aderir também a este xito da modernidade, hipotecando para as calendas o nobre anseio de jogo limpo e transparente.

Como um golpe palaciano em democracia terceiro-mundista, a Liga apaga-se e a Federação recupera o protagonismo. A autoridade transfere-se e o poder torna-se opaco e sem escrutínio. Os clubes que, durante tantos anos, lutaram pela autonomia de um comando executivo autónomo na gestão do futebol-espetáculo, entregam-se agora, alegres e inconscientes, nos meandros dos jogos de influências e das interdependências políticas e regionalistas. E ainda aplaudem.

O futuro presidente da FPF deixa um lugar vazio na Liga que ninguém parece preocupado em preencher. Leva com ele os livros de faturas de Arbitragem, Disciplina e Justiça e isso sim é inquietante. Este inesperado, mas revelador, desfile de vaidades à boleia da Seleção demonstra quem são os poderosos que ainda põem e dispõem neste mundo. E quando se percebe a sua força, com uma capacidade de regeneração e desfaçatez sem limites, sejamos indulgentes para a capitulação de Benfica e Sporting, agarrados à boleia do imparável cavalo de Tróia que leva a impunidade de volta ao coração do futebol nacional: como não os podiam vencer, juntam-se a eles."


A Liga dos últimos, primeiro

"Voltou a Liga dos Últimos! Com a mesma ideia, mas renovado e diversificado. Com o humor na dose certa e no sempre difícil compromisso entre o delicioso pormenor junto das pessoas simples e o respeito pela singeleza das suas vidas. Sem jocosidade, com personalidade. Dando provas de que o humor é um acto de inteligência. Que, por isso, não se planta. Semeia-se. Não pega de estaca. Precisa sempre de uma estufa dedicada. Como o é a Liga dos Últimos.

Um bom serviço público protagonizado saudavelmente por Álvaro Costa e Hernâni Gonçalves. Num tempo em que se anda atrás da definição do dito serviço público por via de tecnicalidades livrescas. Uns refrescantes minutos no intervalo da televisão igual à igual. Que nos dão a conhecer o que quotidianamente se omite ou esconde a não ser na busca do incidente e do mal.

Vejo este programa - relegado estupidamente para a segunda divisão do serviço público de televisão (RTP i) - e recordo-me do que, um dia, Miguel Torga escreveu: «na cidade, sou uma ficção entre ficções; na aldeia sou uma criança entre criaturas».

A cidade é aqui a overdose de programas insuportável e doentiamente parciais sobre o futebol de primeira. Sobre ficções. Que manipulam. E a aldeia reside aqui na descoberta dos esquecidos ou ignorados. Sobre criaturas. Que sonham.

Eu sei que o que conta são as audiências e o sangue de cada momento televisivo sobre os jogos de primeira.

Mas, pela minha parte, ainda gosto do futebol como «um reino de liberdade humana exercida ao ar livre», na feliz expressão de António Gramcsi. É este romantismo fora do tempo que encontro da Liga dos Últimos fora da norma. Um programa saudavelmente insurrecto!"


Bagão Félix, in A Bola

Carta aberta a JJ

"Caro Jorge Jesus: a nossa relação começou em amor e vai percorrendo os difíceis trilhos do desamor, às vezes profundo. Outras toca a raiva, outras a bonança. E estes têm sido tempos bons para o Benfica. Mas... há sempre uns “mas”.

A nossa defesa, JJ. O Artur é uma muralha quase invencível. O Garay, que ainda este fim-de-semana disse que o fazes sentir importante, faz uma bela dupla com o Senhor Capitão. Mas o que é que se passa quando ficam todos parados a ver a bola passar e o adversário marcar (ou tentar)? Estas “brancas amnésicas”, como lhes chamo, custam-nos o primeiro lugar isolado, porque o FCP tem uma defesa bem menos batida que a nossa. Este é o meu principal “mas”.

Preocupa-me também o rendimento do Witsel. Tem potencialidades de herói, mas tem perdido combatividade. E vê lá se pões o Javi a dar umas lições valentes ao Matic, que o miúdo faz-se mas ainda não faz o lugar. E o Capdevila, confessa lá, o que é que tens contra o campeão de tudo o que há para “campeonar”? O Emerson não tem falhado, mas caramba, míster, estamos todos à espera para ver o espanhol.

No meio-campo, parabéns. Genuínos. Deste ao Aimar a única coisa que ele precisava para ser o verdadeiro “El Mago”: condição física. Não sei como é que conseguiste esse milagre, mas está conseguido. Também te tiro o chapéu quanto ao Gaitán: quando não dávamos nada por ele, acreditaste. O problema é que o rapaz gosta mais da esquerda do que eu de gelado de chocolate. E o Nolito e o Chuta-Chuta são concorrência dura. Por fim, o Cardozo. É notório que não posso com ele. Queria ver-te ser um treinador raçudo e dar ao Rodrigo e ao Nélson Oliveira – a este, a este – oportunidades reais. Talvez fizéssemos temporariamente as pazes.

Jesus, o nosso amor não tem volta. Mas enquanto dominarmos as estatísticas de ataque, com 18,6% de golos por remate, e tivermos o 1.º lugar e a Champions, o nosso convívio é menos difícil. Bom trabalho, míster."




PS: Não costumo 'postar' as opiniões da Marta Rebelo, raramente concordo ela, algumas até as acho ofensivas para o Benfica... hoje também não concordo com tudo, mas todos nós somos treinadores de bancada, e temos direito à nossa opinião... o importante é que independentemente das nossas visões tácticas, às vezes diferentes das opções do Jesus, temos que admitir que o nosso Mister está no global a fazer um bom trabalho...

Liga: para onde vais?

"O processo eleitoral na FPF mostra que os contorcionismos são surpreendentes, em nome de exposição, algum poder e as linhas de um “projeto”. É o tempo de se conquistar exaustivamente para a “lista” quem se espezinhou no passado; agora é o tempo de prolongar o “consenso” com nomes elogiados pelos arautos de uma “nova era”. O “power point” está pronto e a “literatura” afinada. As avenças escondidas passam para outro espaço. Até ao fim do mês, após a desistência de Soares Franco, espera-se pouco, a não ser política e “papers” a rodar pelas cadeiras. Enquanto se constrói a (quase) unanimidade pedida, o presidente “exaustivo” está a caminho. Até já pediu audiência na confederação, que será o destino ansiado, abrindo nessa altura a sucessão. Está montado um círculo de curto e médio prazo, que não resistiria a um conjunto de lideranças inovadoras… Não será o caso, mas que era mais interessante do que o óbvio, lá isso era.

Se o óbvio acontecer (ou mesmo que não aconteça), abre-se o maior desafio desde a sua fundação à Liga de Futebol Profissional. Em 2006, alguns prognosticaram que os órgãos então eleitos iriam ser uma comissão liquidatária de uma Liga decadente. Enganaram-se. Foi difícil estabelecer a antonímia com o passado. Mas consolidou-se, apesar das resistências geradas, o equilíbrio financeiro, a organização dos recursos humanos, a redefinição da imagem e da credibilidade das provas, a gestão mais profissional, a autonomia e a credibilidade das “áreas críticas” (arbitragem e disciplina), a transversalidade do rigor e da transparência. Depois de 2010, com o regime legal a esvaziar a Liga, seria o tempo ideal para implantar o grande desafio da sua reconversão, sem arbitragem e sem a disciplina das competições, mas com o futebol que se quer acompanhar. Era o tempo de largar as “amarras” que se eternizam (apostas e televisão, por exemplo) e montar em definitivo uma organização e uma indústria feitas para o interesse dos clubes. Já percebemos que esse desafio, além do “show off” e do “consenso” que tanto se preza por cá, não foi nem é para um qualquer “funcionário”.

A meio do mandato anterior da Liga, a UEFA revelou que o nosso principal campeonato ocupava o 10.º lugar em média de espectadores presentes nos estádios, atrás da Bélgica ou da Escócia. O panorama não mudou entretanto e mantém-se desolador. Um novo período de uma Liga robusta tem de começar por aqui – um “programa global” do adepto. Alguns traços: 1) impor a ocupação de 3/4 dos estádios através de ingressos baratos; 2) determinar pacotes familiares com custo baixo e “marketing” incorporado; 3) associação do adepto à aquisição de bens e serviços; 4) ajustamento dos horários televisivos; 5) transformar o estádio em lugar de animação. Um programa a quatro anos (Alemanha e França dão bons ensinamentos) que dê o poder das massas aos clubes. Com esse novo poder “sentado” nos estádios teríamos um futuro mais aberto no profissionalismo, num ciclo difícil, em que será mais do que muita a tentação de a Federação “engolir” a Liga. Falta saber, se assim for, quem vestirá a pele do carrasco..."


Derlis González

O contrato promessa já estava assinado a alguns meses, ontem, Derlis González em pleno Estádio da Luz, assinou definitivamente pelo Glorioso. Pouco depois da confirmação da vinda do Derlis para o Benfica, vi um jogo do Paraguai, num campeonato sul-americano, sinceramente já não me lembro do escalão(!!!), e fiquei agradado com a exibição do miúdo... é muito novo, tem alguns tiques de vedeta (tem que defender mais...), mas é tecnicamente evoluído, e é rápido... nestes dois dias foi comparado a quase todos os atacantes sul-americanos do Benfica, mas foi da boca dele que saiu a comparação mais acertada: Gaitán (a jogar pelo meio!!!). A decisão de o manter no Paraguai por enquanto também me parece acertada, espero que faça a pré-época do próximo ano, e no pior dos casos jogue na nossa futura equipa B, ou então seja emprestada como foi o Melagrejo.

Mas com todo o respeito pelo Derlis, a minha maior satisfação deste processo, foi poder ver novamente, em plena Catedral, Carlos Gamarra!!! (director do actual clube do Derlis). Apesar do pouco tempo que passou no Benfica, foi sem dúvida um dos melhores centrais a passar pelo Benfica. Ao nível de um Ricardo Gomes, ou Mozer, esteve pouco tempo no Benfica, se calhar por isso não seja tão recordado como outros, mas era um prazer ver jogar este 'Xerife', extremamente eficaz a defender, e que tinha uma caracteristica única para um defesa central: Não fazia faltas!!! Impressionante...


A revolução dos direitos televisivos

"A TVI e a SportTV se entretêm por cá na disputa dos direitos tv da Liga dos Campeões e da Liga Europa, e não só, lá fora está em curso uma revolução que promete virar de pernas para o ar o negócio das televisões no futebol. Um negócio que, considerando apenas as cinco Ligas mais importantes do continente, movimenta por ano para cima de 4 mil milhões de euros!!! Um bolo suculento que pode diminuir muito. Uma espécie de Lei Bosman. Tudo começou em 2005 num pub de Portsmouth, cuja proprietária utilizava um descodificador grego (que custa 10 vezes menos do que o da Sky) para mostrar aos clientes os jogos da Premier League. A contenda arrastou-se pelos tribunais até que em 2008 a Alta Corte inglesa decidiu remeter a questão para o tribunal da União Europeia no Luxemburgo.

A sentença foi conhecida há dias e deu razão à dona do bar. No essencial, diz o seguinte: 1-Proibir descodificadores estrangeiros é contrário à liberdade de circulação no território da União Europeia; 2-Qualquer pessoa pode ter em sua casa, para uso doméstico, descodificadores estrangeiros. No caso dos locais públicos a história é diferente porque estão ou podem estar em causa direitos de autor. As consequências que daqui advirão para as várias Ligas serão devastadoras. Fazer conjecturas é, para já, um salto no escuro. Uma hipótese é o surgimento de grandes concentrações tv que assegurariam os direitos para todos os países e eliminariam as pequenas emissoras, como as nossas. Quem já se mexe é a UEFA, que deixará de vender os direitos dos jogos europeus a cada um dos países para o fazer colectivamente a uma grande televisão ou agência. Desaparecerá, assim, o market pool que destina metade dos prémios às tvs locais em função das respectivas representações e mercados. E como será com os clubes?"


Manuel Martins de Sá, in A Bola