Últimas indefectivações

terça-feira, 12 de abril de 2016

Deslizando suavemente pelo lado esquerdo...

"Se recordámos os heróicos confrontos de Amesterdão frente ao Ajax, num coberto de neve, vamos dar uma vista de olhos à segunda mão, no Estádio da Luz onde Johan Cruyff desafiou o brilho das estrelas.

A ceifeira da morte é sinistra e a sua detestável gadanha não pouca ninguém.
Ainda esta semana levou consigo Fernando Mendes, um dos mais educados senhores da história do Futebol português, gente de uma correcção ímpar e de uma forma de estar na vida que cada vez se vê menos há medida que o tempo passa. Fernando Mendes estava para além de ser um adversário: era um companheiro, um homem de princípios e convicções. Por isso haverá para ele - e para outros da sua estirpe - lugar de destaque na admiração daqueles que vão vendo a dona da pensão da vida trancar portas atrás de portas sem nunca olhar para trás.
Mas eu teimo em olhar para trás, como sabem os que vão tendo a paciência de me ler. Teimo em trazer para o presente cabouqueiro das traves mestras dos dias de hoje.
Na semana passada, recordei aqui uma das grandes derrotas de Johan Cruyff contra o Benfica num Estádio Olímpico de Amesterdão coberto com um manto de neve que enregelava os ossos e fazia estalar as articulações.
A vitória dos 'encarnados' foi tão convincente que se levantaram novas esperanças quanto à reconquista da Taça dos Campeões Europeus. 3-1 era uma vantagem bonita, arredondada, confortável. Mas fora apenas um jogo. Outro estava marcado para o Estádio da Luz. E na Luz ao contrário do que acontecera em Amesterdão, houve Cruyff e o talento inigualável de Cruyff.
O Benfica entrou na Luz confiante como nunca. O resultado da primeira mão dava uma margem de conforto que não era minimamente desprezível. Talvez por isso os primeiros minutos tenham sido imperiais.
Prometia-se um tempo de espera. A espera de um golo 'encarnado'  que rasgasse as dúvidas como quem rasga um papel velho e o lança para o cesto dos documentos sem valor.
Mas, repito e repetirei as vezes que foram necessárias: nessa noite da Luz havia Cruyff. E Cruyff também sabia ser único, como o sabem todos os jogadores irrepetíveis.
Duas vezes Cruyff !!!
Por isso, aos dez minutos de jogo, o público da Luz assistiu aos momentos mágicos que se devem guardar para sempre na aldeia branca da nossa memória.
Dois golos - duas vezes Cruyff.
Aparecia pelo lado esquerdo, invariavelmente pelo lado esquerdo. Era belo, era plástico, era jovem e atlético como Ajax, o padroeiro do seu clube, quase tão imbatível como Aquiles (embora este tivesse problemas sérios no calcanhar), e deslizava por entre a defesa do campeão português com a leveza que o levou à loucura.
Era,por isso, um Ajax enlouquecido às ordens de um Cruyff insaciável.
A esperança é ingrata, como sabem.
Muda de lado de um momento para o outro.
O Benfica que entrara em campo convencido de mais uma das suas infinitas proezas internacionais, mostra-se agora perdido e sem ideias.
Os rapazes de Amesterdão são donos da bola e do jogo.
Kaizer, o grande Kaizer, faz o três zero ao passar da meia-hora. Prevê-se um desastre homérico. E não se percebe onde aquele Benfica fragilizado e sem ideias pode ir buscar forças para resistir e sobreviver à tempestade desatada de um adversário formidável.
Aguentou. Coluna, Jaime Graça, Simões e Eusébio batem-se contra o destino tal como o haviam feito tantas vezes na sua carreira. Com o tempo equilibram os acontecimentos. Esforçam-se na busca dos golos que lhes permitiria ainda passar à fase seguinte.
José Torres faz o 1-3 a vinte minutos do final. Tarde, contudo. Excessivamente tarde.
Um dique fora erguido em redor de Eusébio e do seu Futebol em ondas. Impedia-lhe a progressão e as possibilidades de remate. De Amesterdão a Lisboa, Rinus Michels aprendera a lição.
Ambas as equipas estavam condenadas a um jogo de desempate em Paris. Outro confronto de estalo, a exigir prolongamento no final dos 90 minutos. Aí Cruyff voltou a ser Cruyff e desfez a igualdade. Danielsen tratou de colocar o resultado em 3-0.
Havia novos senhores na Europa, eram holandeses e acreditavam em mitos gregos."

Afonso de Melo, in O Benfica

Atenção aos detalhes

"Na Europa, o 'aprendiz' está na Champions, pelo menos até amanhã, e o 'génio' não está em lado algum; cá dentro o título reservado desde a 1.ª jornada, mantém-se em aberto à 30.º ...

Apesar do extraordinário desempenho no jogo da Alemanha creio que terá chegado ao fim a brilhante carreira europeia da águia na presente temporada, embora deva haver o cuidado de deixar a porta entreaberta à possibilidade de mais uma surpresa, à imagem de outras que o Benfica nos tem oferecido. Sim, porque convém não esquecer o quadro de desgraça que lhe desenharam no dealbar da época, em que aparece Rui Vitória condenado pela lei do chicote a ser empurrado para a saída, sob olhar choroso dos jogadores, frustrados pela devastadora vaga de fracassos desportivos que lhes prognosticaram.
No entanto, muito pouco do se previra aconteceu. Não passou, afinal, de uma ligeireza de análise em face de resultados que, observados com a distância e a frieza necessárias, se conclui nenhuma anormalidade terem carregado. Em rigor, depois da derrota na Supertaça em Agosto, imediatamente após uma pré-época inabitual, em que arcou a pesada tarefa de refazer a equipa, Vitória teve o azar, socorrendo-me de uma expressão utilizada pelo professor Júlio Machado Vaz sobre o assunto, de apanhar o Sporting por duas ocasiões (Campeonato e Taça de Portugal), em menos de um mês, ainda por cima na fase mais reluzente do leão. Três derrotas que geraram burburinho inaudito, como se fosse possível colocar em causa um projecto consolidado e de rumo perfeitamente definido.

O nevoeiro diluiu-se, entretanto, e a realidade que hoje se nos depara difere imenso daquela que foi vendida como certa há meia dúzia de meses: na Europa, o aprendiz está na Champions, pelo menos até quarta-feira, enquanto o génio não está em lado algum e, cá dentro, o título reservado desde a primeira jornada mantém-se em aberto à 30.ª...
Em relação ao jogo da segunda mão não duvido dos argumentos do Benfica para vencer o Bayern e Guardiola tem-se esforçado nos avisos ao seu pessoal, sugerindo-lhe concentração nesta viagem à Luz. Já lá vai o tempo das vitórias morais, dos azares agitados durante anos para desculpar a nossa fraca pedalada uefeira, mas o um-zero de Munique constituiu desfecho surpreendente, depois de, nas mais recentes visitas lusas a Munique, o Sporting ter levado sete o FC Porto seis. 
Se é irrecusável que os alemães construíram situações para ampliarem a vantagem, também o empate esteve iminente e este cenário preocupou Guardiola, na medida em que sofrer um golo em casa retirava-lha a margem de segurança de que desfruta para atacar o jogo de Lisboa com algum conforto. É claro que o Benfica precisa de marcar golos, dois no mínimo, para chegar às meias-finais, e acredito que poderá atingir esse desiderato, mesmo com Jonas ausente e Gaitán em dúvida. Duvido é que não sofra nenhum. As coisas são como são e quem luta por recuperar o estatuto de gigante europeu sabe que, atingido nível competitivo tão elevado, entre os melhores dos melhores, além da força de acreditar e de ter de jogar sempre nos limites físicos e anímicos, os chamados detalhes assumem relevância que poderá ser de terminante na decisão de uma eliminatória.

Detalhes: três jogos e três golos sofridos com arrepiantes parecenças. No lance que originou o único golo de Munique a selar a vitória do Bayern, cruzamento do lado esquerdo do ataque alemão por Ribéry (falhas de marcação de Pizzi e André Almeida), bola dirigida ao poste mais distante onde Arturo Vidal cabeceou com sucesso (Eliseu desconcentrado). Prova de que os espiões do Bayern descodificaram com minúcia o jogo frente ao Braga. Lembram-se? Hassan pelo corredor esquerdo do seu ataque em velocidade de passeio, cruzamento de costa a costa, e Wilson Eduardo a cabecear ao poste (Eliseu batido). No sábado, em Coimbra, Rafa Soares a ganhar a André Almeida na mesma zona, bola enviada para o espaço de intervenção de Eliseu, o qual, mais uma vez fora dela, assistiu Pedro Nuno para o golo conimbricense.
Um minuto no primeiro caso, dois minutos no segundo e 17 no terceiro, no único remate da Académica à baliza de Ederson. Já sei que se trata de casos diferentes, com intérpretes diferentes e em jogos diferentes. É o costume... De toda a maneira, julgo que no meio de tantas diferenças subsistem pontos em comum. De certeza, enxergam-se algumas semelhanças. Que reclamam tratamento urgente, para amanhã e para o resto da época..."

Fernando Guerra, in A Bola

Cinco jogos

"O rol de resultados do Porto nas várias modalidades, nas duas últimas semanas, não deve ter paralelos nas últimas décadas. Três derrotas consecutivas com o Benfica no andebol (modalidade em que o Glorioso não conquistava um titulo há quatro anos); eliminação das competições europeias pela Oliveirense no hóquei, derrota com o Galitos e depois com a Ovarense no basquetebol, culminando coma dupla jornada negra no futebol frente ao Tondela e Paços de Ferreira. Uma sequência de resultados assim não pode ser fortuita ou fruto do azar - uma bola que não entrou e podia ter entrado -, nem sequer atribuída a erros de arbitragem. Quando os exemplos são demasiados e contrastam com a senda vitoriosa do passado, as explicações têm de ser outras e só podem ter causas estruturais. De igual forma que a dinâmica de vitória do Benfica, que vai acumulando resultados positivos e conquista títulos em todas as modalidades, parafraseando Luís Filipe Vieira depois do jogo de Munique, "não pode ter nascido por acaso".
Não se pense, contudo, que verto lágrimas de crocodilo pelo Porto de Pinto da Costa. Penso mesmo que o que se está a passar é um caso de justiça poética (ou até dourada!). A questão é outra.
Há, neste momento, uma grande expectativa entre os benfiquistas: o Sporting perderá pontos no Dragão e o título ficará à nossa mercê. Temo que não seja assim. O mais provável, hoje, é que o Porto perca tudo o que tem a perder. Com consequências. Para alcançar o 35, o Benfica depende apenas de si e tem cinco jogos para vencer."

Controlo financeiro

"A Liga irá proceder ao controlo financeiro dos clubes das competições profissionais na sexta-feira. Esta prática consiste na obrigatoriedade de os clubes e SAD demonstrarem à Liga que se encontram com os salários em dia para com os seus atletas e treinadores, sendo realizada em dois períodos.
Quer em dezembro quer em Abril o controlo é um momento importante na época. É, por um lado, um instrumento útil, na medida em que exige igualdade aos competidores, além da verificação do cumprimento das obrigações para com os jogadores, mas, por outro, revela ineficácia.
A prova de pagamento, relativa ao período entre 11 de Novembro de 2015 e 10 de Março de 2016, é feita através da apresentação dos recibos assinados pelos jogadores, dos recibos das remunerações dos jogadores junto aos documentos que comprovem a realização dos depósitos ou transferências respectivas ou de declarações assinadas pelos jogadores certificando que se encontram com os salários regularizados. 
Apesar da boa vontade do controlo, a verdade é que a Liga continua a admitir como prova de pagamento as declarações assinadas pelos jogadores, invertendo o ónus da prova, ao colocar a responsabilidade no trabalhador, subordinado, que está na dependência económica da entidade patronal. Ora, o pagamento do salário é uma obrigação do clube e como tal deve ser este a fazer prova do mesmo.
É urgente que a Liga altere o mecanismo de controlo. Não podemos nem devemos aceitar que o trabalhador, tradicionalmente em posição mais frágil na relação laboral, seja exposto a pressões para que a entidade patronal preencha pressupostos regulamentares.
Os regulamentos da Liga devem permitir que a verificação das obrigações assumidas pelos clubes se faça apenas pela prova objectiva dos pagamentos dos salários, ou seja, através do descritivo das transferências bancárias feitas para os jogadores.
Aos futebolistas deixo um alerta: a assinatura de falsas declarações, que comprovem o pagamento do salário quando efectivamente não o receberam,inviabiliza-os de acederem ao Fundo de Garantia Salarial.
O controlo financeiro é, por isso, uma oportunidade para os jogadores exercerem os seus direitos e exigirem o pagamento do seu salário. Ao fazê-lo, garantem a existência de condições para a prática desportiva em Portugal."


PS: Este problema atinge mais Clubes do que seria de esperar, aparentemente até Clubes que estão praticamente qualificados para a Champions do próximo ano têm, actualmente, ordenados em atraso...!!!

Profissionalismo com amadores

"O profissionalismo consistente de que falamos não chega a todos os corredores e gabinetes da sede federativa, sendo o exemplo mais recente disso a actuação da comissão disciplinar, que teima, aliás, em manter processos de actuação que já vêm de um passado muito distante.

O futebol português tem vindo a afirmar-se cada vez mais como uma organização a que vale a pena dar crédito, não obstante alguns aspectos negativos que o trazem com frequência para a praça pública onde se torna objecto de discussão e polémica.
Criteriosamente, têm sido percorridos caminhos que atestam a sua emancipação progressiva, dos quais a construção e inauguração da Cidade do Futebol é o último é mais recente e espectacular exemplo.
A consumação de tal objectivo fica a dever-se a uma Federação competente, atenta e diligente, que muito tem contribuído para a afirmação de uma indústria que merece todo o respeito.
Só que o profissionalismo consistente de que falamos não chega a todos os corredores e gabinetes da sede federativa, sendo o exemplo mais recente disso a actuação da comissão disciplinar, que teima, aliás, em manter processos de actuação que já vêm de um passado muito distante.
Os mais diversos sectores, atentos ao caso, de há algum tempo vinham reclamando celeridade na resolução do chamado “caso Slimani”, estranhando uma demora para a qual não era aceitável qualquer justificação. 
Chegou finalmente a decisão, cujo conteúdo não desejamos incluir neste comentário.
Porque importante, deveras, é o carácter amador de que se reveste a actuação de um órgão tão importante no quadro da justiça federativa.
Demorou cerca de cinco meses, cinco, a assumir a sentença que absolveu o jogador do Sporting com a qual nem todas as partes se têm manifestado de acordo.
Mesmo sabendo-se que os Conselhos de Disciplina e de Justiça são eleitos em listas independentes da Direcção, é urgente tomar medidas que acabem com o estado actual, e acabar com este terceiro-mundismo em que o futebol português ainda se encontra, encontrando soluções que ajudem a reforçar a maioridade já atingida noutras áreas."

O miúdo dinamarquês que se apaixonou pelo Benfica

"Em 1961, o Benfica foi à Dinamarca conquistar uma vitória e... um adepto!

Na sua gloriosa caminhada europeia de 1960/61, o Benfica deslocou-se à Dinamarca para defrontar o Aarhus GF, no jogo da 2.ª mão dos quartos-de-final da Taça dos Clubes Campeões Europeus, disputado a 30 de Março de 1961.
A popularidade do Benfica já tinha chegado à Dinamarca principalmente entre os mais jovens. Dezenas de crianças dinamarquesas rondavam dia e noite o Hotel Royal, onde estava instalada a equipa benfiquista, só para conseguirem um autógrafo ou simplesmente verem os 'ases da bola'. Entre eles, estava o jovem Jan Birmann, 'um simpático rapazinho, de cara risonha e cabelo alourado', com 12 anos, que conseguiu conquistar a amizade de cada um dos jogadores, técnicos e dirigentes que compunham a comitiva benfiquista.
O pequeno dinamarquês, que esteve quase sempre junto da entrada do hotel, estava encantado com a possibilidade de contactar com qualquer dos jogadores. A comitiva benfiquista ficou impressionada com o seu entusiasmo e Jan 'foi praticamente adoptado pelo clube português', acompanhando os jogadores durante a sua estadia na Dinamarca. Estava com 'os melhores do Mundo', dizia ele em português.
O Benfica fez uma excelente exibição em campo. Venceu o Aarhus por 4-1 e José Augusto, com uma actuação extraordinária e dois golos marcados, foi a figura do encontro. Tal fez crescer ainda mais a admiração de Jan por José Augusto, ao ponto de, à despedida, ter-se mostrado disposto a vir para Lisboa, porque não se queria separar do «Zé Auguisto», como lhe chamava.
Desta aventura, nasceu um verdadeiro amor pelo Benfica. Por intermédio do Eng. Coelho Virgílio, vice-presidente da Comissão Central Jan tornou-se sócio do Benfica e manteve um contacto próximo do Clube.
Reencontrou os seus ídolos em duas outras ocasiões. Dois anos depois, quando o Benfica voltou à Dinamarca numa digressão pela Escadinávia, Jan convenceu o pai a levá-lo a Copenhaga. Chegou equipa 'à Benfica', o equipamento que Coelho Virgílio lhe tinha oferecido, e participou no treino dos seus ídolos. E em 1969, já com 21 anos, voltou a Copenhaga para ver o Benfica jogar com o clube local, e regressou com um presente muito especial: a camisola de Eusébio!
Com a sua paixão pelo Benfica, Jan Biermann é um símbolo da universalidade do emblema 'encarnado', que podemos relembrar na área 26. Benfica universal do Museu Benfica - Cosme Damião."

Ana Filipa Simões, in O Benfica

Benfiquismo (LXXII)

Sport Dili e Benfica

Se alguém conseguir identificar estes jogadores,
devia merecer um lugar vitalício na Catedral !!!