"Há expressões a que, pela recorrência da repetição, deixamos de prestar a atenção devida. Recorrentemente, e fazendo uso de uma legítima indignação e de um legítimo sentido crítico, oiço consócios e adeptos do nosso Benfica dizerem que “este não é o meu Benfica”.
Sendo nós benfiquistas, somos do Benfica e somos Benfica. Logo, negar este Benfica como meu seria quase negar uma parte do que sou. Dizia o saudoso Manuel Bento, enquanto olhava, como adepto, para um jogo mal conseguido do nosso Benfica, que o Benfica não são os que estão dentro do campo – e ele que tantas e tantas vezes lá esteve – mas sim os adeptos, os que estão em partilha de crença, sofrimento e entrega ao Benfica. Talvez devido a este sentimento, ainda hoje me arrepio e emociono quando oiço os adeptos gritar em uníssono “O Benfica é nosso”. Sabendo que nessa afirmação mais do que um sentimento de posse está um sentimento de pertença ou, quando muito, uma afirmação da pertença pela posse.
Como é que a voz que grita “O Benfica é nosso” pode também dizer “este não é o meu Benfica”? Não sei, entendo-o apenas como um desabafo. Posso dizer, e já o disse em diferentes momentos destas quase quatro décadas que levo de adepto benfiquista, que “este não é o treinador que eu queria no meu Benfica” ou que “este não é o presidente que queria no meu Benfica” ou que “estes não são os valores que gostaria de ver no meu Benfica”. Mas espero que isto não me conduza ao desabafo de dizer que “este não é o meu Benfica”. O meu Benfica é este, porque não há outro que não este e porque quem vive o Benfica vive-o apaixonada e criticamente, mas nunca fazendo depender essa vivência da concordância ou discordância dada ao rumo do Clube.
O meu Benfica é o que foi, em 1983, ganhar ao FCP e buscar a Taça de Portugal às Antas, com um golo do Carlos Manuel, da mesma forma que é o que viu o FCP festejar o campeonato na nossa casa, em 2011. É o do sexto lugar em 2001 da mesma forma que é o do primeiro lugar em 2010…
Aliás, diz-nos a nossa gloriosa história que, nos momentos críticos em que urgia mudar o rumo, foi essencial que nenhum de nós se demitisse e todos nós fôssemos Benfica. Para isso, é necessário que todos percebamos que “este é o nosso Benfica” e é “nosso” porque lhe pertencemos."
Pedro F. Ferreira, in O Benfica