"Será que o desporto e a religião são compatíveis? Numa novena “Divino Espírito Santo: Invocado para que nos conceda seus dons” (Editora Vozes, s./d.) é citada uma leitura bíblica (1 Tm 4,8-II): “exercita-te na piedade. Com efeito, a ginástica corporal é de pouco proveito, mas a piedade é útil para tudo” (p. 18). Se admitirmos que o desporto é uma religião, esta frase, de que a prática física é de pouco proveito, não faz sentido nos dias atuais.
Desde as críticas pós-modernas da teoria marxista da religião, até à retórica da dessacralização do mundo, são vários os sociólogos que falam sobre a sacralidade do desporto. Ele permite uma manifestação das paixões individuais e coletivas. E ele provoca nos espectadores reações de fervor, que fazem lembrar a função dionisíaca das festividades rituais da Antiguidade. O desporto é quase uma religião. Tornou-se um narcisismo de massas. Assiste-se a práticas semi-rituais, com a escolha de uns ténis ou chuteiras, e a preparação mental. Quando uma equipa está a perder, crê-se no milagre que dará a vitória. A necessidade de festejar em grupo, de sentir em conjunto a esperança e a deceção, de se sentir associado a uma aventura coletiva, junta um grande público. Se antigamente, se assistia aos ofícios religiosos, atualmente as pessoas reservam um pouco do seu tempo para a prática desportiva, ou veem eventos desportivos.
“O desporto em si suporta toda a sociedade”, como diria Edgar Morin, sociólogo e pensador da complexidade. E uma questão que poderá perturbar é que o desporto faz referência ao corpo, ao seu desenvolvimento, às performances, etc., enquanto a religião diz respeito ao espírito. Os Homens de hoje teçam ligações com as suas divindades, muitas das vezes ligadas ao futebol. Os estádios tornaram-se um santuário."