"Mais, muito mais importante do que fazer contas sobre o número de trófeus do FC Porto e do Benfica (como se valessem todos a mesma coisa...), devia estar o interesse desportivo e jornalístico de saber quantos desses troféus foram esbulhados pelos portistas aos adversários nos últimos 25 anos à custa de favores sexuais, mariscadas, viagens ao estrangeiro e toda a tranquibérnia de porcarias que as escutas do 'Apito Dourado' nos ofereceram no seu horroroso esplendor.
Bairro Alto: 2h30 da manhã. Um pequeno grupo de rapazitos funde-se com as esquinas como se se escondesse de alguma coisa, enganando os quadrados iluminados dos néons dos bares que se abrem, porta sim, porta não. Traziam, por debaixo dos casacos, cachecóis azuis, e a princípio pensei que vinham com medo de festejar na rua, como seria seu direito, o último troféu ganho pelo seu clube com um golo duvidoso. Mas, depois, observei melhor. Não era medo que eles tinham. Nem havia sequer razão para tal, o ambiente era pacífico e bem disposto. Eles tinham era vergonha. Entre si, uns com os outros, terão exibido os panos, os adereços, até as camisolas azuis e brancas; na rua, tapavam-se como se mascarassem a nudez. Um, mais disponível, tratou de mostrar o cachecol. E logo se ouviu, aqui e ali, um coro acabrunhante, acusatório, humilhador, mortificante:
-CORRUPTOS! CORRUPTOS! CORRUPTOS!
Os garotos dobraram a esquina, fugindo. Só o eco os perseguiu:
-CORRUPTOS! CORRUPTOS! CORRUPTOS!
A cena foi triste.Patética até. A culpa não é deles. São apenas garotos que procuram divertir-se. Mas nós sabemos de quem é a culpa. Por mais que haja gente que vire a cara para o lado e faça de conta que não vê, que não viu, que não ouviu. Sabemos bem quem ainda neste momento emporcalha a alegria destes adolescentes que deveria ser apenas espontânea e saudável.
Panfletário, obedecendo cegamente às ordens que lhe cospem, o merceeiro mentiroso que nos insulta, semanalmente, - a todos nós e à língua portuguesa - com páginas inteiras carregadas de erros de concordância e de sintaxe, fez as suas contas mixordeiras. Nas mercearias baratas, é assim que as coisas são: somam-se batatas com grão de bico e farinha de pau com mandioca. Para tão triste figura, que se predispõe a mentir só para ficar bem visto pelos seus senhores (que não são sequer os que principescamente lhe pagam barbaridades), vale tudo o mesmo: Taças, Supertaças, Campeonatos e até um ou outro troféu que se dá ao luxo de inventar, como a Taça dos Leitões Europeus. Importa enfiar tudo no mesmo saco e engazopar o cliente.
Tal não seria grave, pois o seu descrédito é total, como sempre acontece a quem tem uma mercearia que vende produto peçonhento. Mas, o rebanho de jornalistas de estrumeira e anõezinhos televisivos logo vê na mixórdia feita uma forma de agradar ao ferrabrás que os fascina. E calcorrem de imediato, alegremente, as pisadas do merceeiro aldrabão, seguros de que tal lhes continuará a valer benesses dos seus empregozinhos periclitantes. Esquecem-se (ia a escrever esquecem-se, mas não se esquecem, fazem-no na plena consciência da sua porcaria) de que muito mais importante do que fazer contas sobre o número de troféus do FC Porto, devia estar o interesse desportivo e jornalístico de saber quantos desses troféus foram esbulhados aos adversários nos últimos 25 anos à custa de favores sexuais mariscadas, viagens ao estrangeiro e toda a tranquibérnia de porcarias que as escutas do 'Apito Dourado' nos ofereceram no seu horroroso esplendor. Sim, eles bem podem erguer e expor as taças, mas serão suas? Há um número considerável, diria mesmo gigantesco, que não é ! Ficámos a saber, ao longo dos últimos anos, que há Campeonatos e Taças, e até uma Taça dos Campeões - além do 'caso Ivanov' também sabemos agora que gastar bastante em prostitutas no Campeonato anterior - que estão na vitrina errada. Eles exibem-nas, mas que valem? NADA! São simples objectos que ficarão ali, para sempre, a recordar uma determinada (in)cultura e uma forma de estar na vida na qual roubar, enganar, mentir e forjar são as bases da sobrevivência. Por maior repugnância que isso provoque em todos nós, que desprezamos merceeiros aldrabões e sentimos que, como dizia Orwell, até o mais baixo, abjecto e vil dos seres humanos terá de dizer BASTA!, nem que seja para si próprio, baixinho, e fazer finalmente aquilo que é correcto."
Afonso de Melo, in O Benfica