"Ao ver aquela meia dúzia de alarves aos saltos numa festarola parola e sem sentido, fiquei com ideia de que era feriado na cadeia de Custóias e de que os criminosos tinham vindo apanhar ar numa noite deprimente de chuva ácida. A verdade é que eram poucos, muito poucos. Na sua maioria exibindo feições reveladoras de deficiências, tanto físicas como morais. Arranhavam as gargantas com insultos escabrosos e visavam as mães alheias com apodos que ficariam mais bem empregues nas suas próprias mães. Vista de fora, a funçanata metia nojo. Os pilha galinhas iam roubando carteiras uns aos outros e urinando nas pernas dos Homenzinhos-de-Cócoras, convidados especialíssimos por serem os verdadeiros cozinheiros de tamanha mixórdia.
Acabado de chegar da Meseta Ibérica, o Diabo Madaleno estava lá. Fora figura visível de mais uma bambochata. Na bancada presidencial, lado a lado com a sua messalina barata, tratara de amaldiçoar o dono da casa com uma derrota humilhante, para que este aprenda de vez que o lugar do Diabo é atrás da porta. Depois regressara a Mafamude deixando atrás de si um cheiro pestilento. Sim, porque o Diabo Madaleno não fede a enxofre, fede a podre e a excremento. Agora, no meio do baile dos lafargas, exalava o seu pivete com um sorriso crápula afivelado nos lábios e obrigava os saloios a taparem o nariz à sua passagem. Ninguém percebia ao certo as razões de tão estúpida alegria. Nada nela havia de orgulho, de prémio ou de autenticidade. E a dança grotesca dos Homenzinhos-de-Cócoras ao som dos palavrões e dos insultos estava aí para comprovar a salácia. Um grupelho de larápios brejeiros saiu à rua para festejar uma falcatrua. Saltaram sobre as capotas de automóveis, conspurcaram os passeios e gritaram porcarias. Ao vê-los, perguntei para com os meus botões se a imbecilidade e a indecência não terão limites? O sorriso flatulento do Madaleno garantiu-me que não..."
Afonso de Melo, in O Benfica