Últimas indefectivações

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Para cima deles!

"Tempo de selecção nacional, tempo de pausa no campeonato de futebol. E, já agora, tempo para uma reflexão. Ao fim de três jornadas, o SL Benfica tem duas vitórias, uma derrota e está a um ponto dos líderes.
A ver pelos fatalistas, o bicampeão já não tem hipóteses de chegar ao tri. Mas será que os adversários estão a apresentar uma qualidade de futebol ao nível do Brasil de 1982? Pausa para gargalhada. Não, muito longe disso. Aliás, nem dá para comparar. Não fossem os pés de um qualquer lateral a pisar descaradamente uma linha, os avançados do Estoril terem tido medo de ser felizes na zona das Antas ou os 31 remates do Glorioso contra o Arouca não terem dado golo e os fatalistas estariam sem argumentos.
A ver pelos optimistas, o SL Benfica até está melhor que na época passada. Perdeu um treinador que dava tantas alegrias quanto tristezas (são números, senhores...), ganhou um que não precisa de ser o centro das atenções, perdeu um lateral que vale pouco como pessoa, há mais aposta na prata da casa, há Champions no calendário e o trio estrangeiro do ataque já factura. Respira-se confiança, portanto.
O sucesso passa pelo melhor dos dois pontos de vista: aceitar a crítica e resolver os problemas; ver o que está bem feito e dar continuidade aos títulos. Para isso, é preciso ganhar hoje aos portugueses de Sá Pinto. A ver pelo que têm feito na Liga Europa, os Belenenses vão deixar tudo em capo. E então? Não é isso que o SL Benfica tem que enfrentar todos os fins de semana? Ou melhor, todos os dias, com os ataques desesperados de adversários externos e internos. Afinal quem é que usa o símbolo de campeão na camisola? Sem medo, Benfica!"

Ricardo Santos, in O Benfica

O dia em que joguei na Luz

"A Adidas convidou vários jornalistas para uma partida de futebol no Estádio do Benfica. E o representante da VISÃO fez exactamente o que se esperava dele: muito pouco.

Quando a Adidas enviou um convite à VISÃO para um jogo de futebol no Estádio da Luz, eu fui a escolha natural - oito das dez pessoas da minha secção são mulheres, e o outro espécime masculino não aprecia praticar desporto de pé. Quanto às minhas aptidões futebolísticas propriamente ditas, há duas correntes de opinião: eu acho que sou a reencarnação do Garrincha; todos os outros acham que devo ser é parvo. Mas isso não importa nada. Uma vitória por falta de comparência continua a ser uma vitória - e assim me caiu no colo o privilégio de pisar a relva do Glorioso.
Confirmada a minha presença, o passo seguinte foi dizer a toda a gente que ia jogar na Catedral. Comecei, claro, pelos mais benfiquistas, e daí segui pela cadeia alimentar abaixo. Pelo caminho, ia distribuindo promessas de golos. "Vou marcar um por ti", espalhei eu ao pontapé, salvo seja. Ao dar por ela, já levava uma dúzia de golos atribuídos. Não me estava a ver a pagar a dívida.
No dia mais importante da minha vida (o do nascimento do meu filho ocupa um honroso segundo lugar), pus-me a caminho uma hora mais cedo do que era preciso, não fosse eu ser vítima de um acidente e ter de me arrastar, ensanguentado, 5 ou 10 quilómetros até ao estádio. O ponto de encontro era a sala das conferências de imprensa.
Depois de uma apresentação de um responsável da Adidas, a falar sobre as novas chuteiras ACE15 e X15 (as primeiras, adaptadas a estilos de jogo mais controlados, as segundas, para jogadores mais explosivos, e outras coisas que não ouvi realmente porque 65 mil espectadores imaginários já chamavam por mim), entraram Jardel e Jonas.
Os craques do Benfica dividiram os 24 jornalistas em duas equipas e encaminharam-nos para os balneários. Calhou-me o Jardel como treinador - ou melhor, mister, como nós, futebolistas, gostamos de dizer. Enquanto vestíamos o equipamento, o defesa encarnado delineou a táctica. "Quem quer ir à baliza? Quem quer jogar à defesa? Esquerda? Direita? Centro?" E pronto, foi isto. Estratégias? Para quê? Obviamente, o homem percebeu que tinha ali 12 predestinados, a quem bastava o talento natural para vencer o jogo nas calmas. Ainda pensei em avisar que há quem me considere agressivo na bola (eu prefiro chamar-lhe empenho). Mas, como ninguém me perguntou se, por exemplo, alguma vez parti o pé a um adversário, optei por não contar que uma vez parti o pé a um adversário. Digamos que o assunto não se proporcionou. 
Escolhi o lugar de defesa esquerdo porque é o sítio do campo onde costuma haver menos gente, e o meu estilo de jogo não se coaduna com multidões. Tal como as estrelas lá de cima, também as estrelas futebolísticas precisam de espaço para brilhar. Vesti a camisola com o número 6 nas costas (o mesmo de portentos benfiquistas como Jamir, Steve Harkness, Marco Freitas e Fernando Meira) e fui para o relvado. Íamos ter dez minutos de aquecimento. Cansei-me a aquecer.
O árbitro preparava-se para o apito inicial quando me convenci de ter escolhido bem a posição: ia enfrentar, no meu corredor, a única mulher em campo - a Mariana Cabral, do Expresso. Constava que ela percebia de bola, e que até tinha tirado um curso de treinadora, mas, caramba!, é mulher. Deve haver atuns que jogam melhor.Essa era a primeira boa notícia. A segunda é que o meu amigo Jaime, da New in Town, estava na baliza. Se lhe marcasse um golo em pleno Estádio da Luz, faria questão de o ter ao meu lado antes de me finar para, com o último sopro, lhe recordar o momento. Incitado por essa ideia, fiz o primeiro remate à baliza do jogo. Uso a palavra remate num sentido muito lato. Foi uma espécie de suave atraso para o guarda-redes errado, com o pé esquerdo, o que estava mais à mão, como diria o João Pinto, esse filósofo do FC Porto. (Por falar em pés esquerdos, ainda hoje não tenho a certeza de qual é o meu melhor pé, pelo que prefiro considerar-me ambidestro dos membros inferiores.) O pior veio de seguida: a Mariana pegou na bola perto da linha e avançou na minha direcção; à entrada da área, passou por mim como se eu não estivesse lá. E com essa simples finta curou-me o sexismo.
Fomos para o intervalo a ganhar por 1-0, com um golo acidental: o meu companheiro queria cruzar, mas a bola saiu demasiado longa e acabou na baliza. Dirigimo-nos para o balneário, a arfar, com Jardel a acompanhar-nos, de mãos nos bolsos. "Estamos tão cansados como tu costumas estar, Jardel?", perguntou um de nós. "Vocês jogaram 15 minutos", respondeu o mister. Sim, o Benfica e a Adidas achavam que não aguentávamos mais que duas partes de 15 minutos. Tinham razão. No início da segunda parte, pedi para trocar de posição com um médio centrocampista. Oficialmente, porque queria ir mais para o meio da acção. Honestamente, porque não queria voltar a ser humilhado pela Mariana. Havia câmaras a filmar a partida.
O jogo prosseguiu numa toada entre o morno e o cómico, certamente porque as bancadas vazias não nos estimulavam a dar mais. Entretanto, a equipa adversária fez o 1-1 sem saber ler nem escrever, num contra-ataque fortuito. Jonas, o treinador inimigo, pareceu entusiasmado, mas o nosso mister manteve a mesma calma estóica, que quase podia ser confundida com absoluto desinteresse no resultado. Mas depressa voltámos para a frente do marcador, com mais um espectacular cruzamento disparatado que acabou nas redes por estranhos humores da física. Jardel demonstrou a sua irrefreável satisfação acenando ligeiramente com a cabeça. O árbitro apitou para o final pouco depois.
Terminada a partida, fiquei no centro do relvado a tirar selfies. No Natal, hão de ser transformadas em postais de boas festas e oferecidas a toda a gente que conheço - porque o único prazer maior do que jogar no Estádio da Luz é esfregar na cara dos nossos amigos que jogámos no Estádio da Luz."

O Benfica existe para ganhar

"No sábado passado, enquanto assistia ao jogo de iniciados A, dei por mim entusiasmado com a velocidade, criatividade e técnica de um dos nossos jogadores, o Jair Tavares. Fez-me lembrar o Mário Ferreira, o 'Valderrama', apenas um ano mais velho. Com um estilo diferente, o 'Jota', nascido dois anos antes. Ou o Diogo Gonçalves e o João Carvalho, estes já na 'B', mas com idade júnior. Ou o Gonçalo Guedes, a dar os primeiros passos na equipa principal, assim como o Hélder Costa já o fez na temporada passado no Corunha, ou o Ivan Cavaleiro, hoje um valor seguro na liga francesa.
Em comum, os atletas mencionados foram ou estão a ser formados no CFC, actuam preferencialmente a extremo, é-lhes apontado um futuro risonho no Futebol e têm, entre si, pela ordenação utilizada, um ano de idade a separá-los. Muitos outros poderiam ser indicados noutras posições.
O futuro do Benfica passa, inevitavelmente, por esta fonte de promessas futebolísticas formadas no Seixal. Por convicção: a identificação com os valores Benfiquistas, quando assimilados desde cedo, é, na maioria dos casos, mais robusta; e por necessidade: os recursos são finitos, a capacidade de endividamento nem sempre é a necessária, a massa salarial tenderá a diminuir e as mais-valias decorrentes da alienação de passes a aumentar.
Nada disto, no entanto, será relevante se a nossa equipa principal deixar de ser competitiva. Como tal, fiquei descansado ao ler nas entrelinhas da entrevista concedida pelo presidente Luís Filipe Vieira ao jornal A Bola que esta aposta não é dogmática. Abrir portas aos miúdos é importante, mas terá sempre de ser indispensável mostrarem capacidade para atravessá-las."

João Tomaz, in O Benfica

Esclarecedor

"Duas entrevistas a dois diários desportivos portugueses, duas personalidades bem distintas, dois discursos bem diferentes. No jornal “A Bola”, um verdadeiro homem de estado fala sobre o futuro da instituição a que preside, denota confiança, transborda determinação quanto ao rumo que pretende seguir. Respeita os adversários. Com humildade, sabe que não poderá vencer sempre, mas acredita que pode vencer mais vezes do que os outros. Muito importante: garante que, com ele, o futuro do clube jamais será hipotecado. 
No jornal “Record”, um indivíduo ressabiado ajusta contas com o passado. Do alto da sua ilimitada vaidade, desrespeita aqueles que o levaram ao topo, dispara a vários colegas de profissão, e mostra um revelador desapego face aos que hoje lhe pagam o principesco ordenado que aufere. Há três meses estava num clube, agora está num rival, e já ameaça partir para outro. Vai com quem pagar mais, tal como certas senhoras que, por vezes, vemos na estrada. Admite que andou a brincar com o Benfica e com o seu treinador, na antecâmara da supertaça. Mas a principal pérola da entrevista surge quando, candidamente (?), faz a seguinte afirmação: “nunca vão conseguir pôr os adeptos do Benfica contra mim”. Ou está a rir-se de nós, ou vê muito pouco para lá das quatro linhas de um campo de jogo. Deveria saber que foi ele próprio a colocar os adeptos do Benfica contra si, saindo pelas traseiras, deitando todo um passado para o lixo, e transformando-se, num sopro, em figura menor na história do clube. Talvez seja preciso explicarmos-lhe melhor. Talvez à oitava jornada o entenda devidamente."

Luís Fialho, in O Benfica