Últimas indefectivações

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

E que tal experimentarem uma novidade?

"OS presidentes do Benfica e do Sporting almoçaram juntos e só por isso foram notícia de relevo nos telejornais de terça-feira e nos jornais de ontem. Benfica e Sporting à mesa, temos estratégia erudita com certeza...
E para quê?
Os observadores e os analistas garantem que se trata das eleições para a presidência da Federação Portuguesa de Futebol o motivo que juntou Luís Filipe Vieira e Godinho Lopes.
É um assunto que interessa a ambos os rivais na medida em que o Sporting não tem um presidente da FPF a que possa chamar ser desde Antero da Silva Resende, entre 1983 e 1989. Já o Benfica, desde a presidência de Morais Leitão, nos anos de 1979 e 1980, não lhe têm faltado presidentes da FPF a que pôde chamar seus, tais como Romão Martins, de 1981 a 1983, João Rodrigues, de 1989 a 1992, e Vítor Vasques, entre 1993 e 1996.
Quanto a Gilberto Madaíl, no cargo desde 1996, poucos saberão de certeza firme qual é a sua orientação clubista e eu não me atrevo sequer a lançar as mais leves suposições sobre a tal afinidade que o presidente em exercício tão bem soube iludir nestes seus quinze anos de consulado.
Mas, pela lógica vigente, Gilberto Madaíl parece ser do Benfica, com o devido respeito pela presidencial figura.
E porquê?
Porque estes últimos 32 anos com hipotéticos presidentes do Benfica na FPF coincidem taxativamente com os 32 anos em que assistimos à afirmação do FC Porto como uma força política sem rival no futebol português.
No que diz respeito ao Sporting, se bem se lembram os mais velhos, o consulado de Silva Resende ficou marcado por aquele episódio caricato e lesa-Sporting à volta da inscrição de Frank Rijkaard na FPF que não foi aceite porque a papelada chegou com dois minutos de atraso à antiga sede na Praça da Alegria.
Estiveram, portanto, Luís Filipe Vieira e Godinho Lopes a almoçar anteontem no Hotel Tivoli, em Lisboa, para tratarem de um candidato comum às eleições para a FPF. A ideia só pode ser abrir uma frente conjunta da capital contra os alterosos poderes políticos, funcionais, administrativos e tudo o mais, de Pinto da Costa, presidente do FC Porto, clube que não mete um presidente a que possa chamar de seu na presidência da FPF desde a I Guerra Mundial, passe o exagero.
A que conclusão chegaram?
Fernando Seara ou Filipe Soares Franco? Filipe Soares Franco ou Fernando Seara? Filipe Seara ou Fernando Soares? Se a conversa foi à volta destes nomes, temos o caldo entornado porque significa que nem o Benfica nem o Sporting perceberam muito bem o que de lamentável lhes aconteceu nas últimas três décadas.
A que conclusão deveriam ter chegado?
Apenas uma. E que requer urgência de aplicação a ver se as coisas mudam como os dois presidentes da Segunda Circular querem que mudem. E, por isso mesmo, que tal experimentarem uma novidade?
Luís Filipe Vieira e Godinho Lopes bem faziam em propor, muito rapidamente, um candidato comum que tivesse a particularidade de ser do FC Porto, nascido e criado na Torre dos Clérigos.
É que já merecem, carago!



PAULO BENTO chamou a Ricardo Carvalho desertor e Ricardo Carvalho chamou a Paulo Bento de mercenário.
É uma linguagem inflamada, despropositada, de cariz militarista e patriótico.
Esta coisa de se confundir a Selecção Nacional com a Pátria é reveladora de uma grande pobreza mental a que não escapam até intelectuais e cientistas, o que se compreende, porque o futebol responde a uma ânsia de colectivo e os grandes colectivos, para serem mesmo grandes, têm de se infantilizar ao ponto da unanimidade do discurso e das emoções.
Há anos, há muitos anos, era eu jornalista de A Bola e entrevistei João Saldanha, que foi jornalista, treinador e uma figura sem par no futebol brasileiro. Saldanha foi o responsável técnico que qualificou o escrete para o Mundial de 1970 mas acabou por ser substituído, na fase final da competição, no México, por Mário Zagallo que era pessoa mais da confiança da CBD e que levaria o Brasil ao título mundial.
João Saldanha foi sempre um marginal, um excêntrico, enfim, um poeta. Disse-me ele, em Novembro de 1985, no Rio de Janeiro, que não descansaria enquanto não conseguisse convencer a FIFA de que era um erro tremendo, um abuso, uma estupidez permitir que se tocassem os hinos nacionais dos países antes dos jogos entre selecções.
Para Saldanha, futebol era simplesmente futebol, um jogo, um jogo absolutamente maravilhoso que no Brasil era praticado como quem pratica a arte da música, mas confundir esse jogo de perícia e habilidade, e também de sorte e azar, com a nossa Pátria e com as Pátrias dos outros ia, certamente, acabar um dia mal...
O que se passou com a selecção portuguesa, entre Paulo Bento e Ricardo Carvalho, não foi nada de tão trágico quanto Saldanha agourava nesse dia quente distante de um Verão carioca. Foi simplesmente uma anedota sem graça a acrescentar a muitas outras com que a Selecção, a nossa selecção, muito frequentemente nos brinda.
Mas quando ouço gente responsável a exigir que Ricardo Carvalho peça desculpa «a todos os portugueses» lembro-me, inevitavelmente, de Teresa Guilherme no Big Brother e, depois, de João Saldanha na sua campanha solitária contra a militarização do futebol e em prol da abolição dos hinos antes dos jogos para que não se confundam coisas sérias com entretenimentos.
João Saldanha tinha carradas de razão. E ainda tem, embora já não cá esteja. Morreu em Roma, em 1990. Estava em Itália para assistir ao Mundial de futebol e não sei bem, lamento, quantos hinos ainda teve de ouvir tocar antes de fechar os olhos definitivamente.
Quanto ao pedido de desculpas de Ricardo Carvalho «a todos os portugueses», se me é permitido, gostaria de confessar a Ricardo Carvalho a admiração que sempre tive por ele e que continuarei a ter, apesar deste seu deslize infantil com que terminou uma carreira sempre digna, melancólica e eficiente na Selecção Nacional.
E, já agora e no que me diz respeito enquanto portuguesa, está Ricardo Carvalho perfeitamente dispensado de me pedir desculpa. Aliás, está proibido de me pedir desculpa.



GOSTO da ciência da estatística aplicada ao futebol e ao rendimento dos jogadores. Por isso chamo a atenção dos cientistas das estatísticas do nosso futebol para quando se referirem a Artur Moraes, guarda-redes do Benfica nunca se esquecerem de acrescentar aos pertinentes dados sobre as suas intervenções a soco, a pontapé, em voo, em queda, etc... este singular facto adicional, mas não menos importante: 1 assistência para golo.
É uma proeza que muitos médios e avançados que custaram pequenas fortunas a diversos emblemas ainda não conseguiram fazer.
Sim, o golo de Bruno César na Choupana foi um momento raro de pura diversão. Mas metade do golo é de Artur Moraes, que lançou o companheiro e compatriota, enfim, em profundidade...
Não admira que Lula da Silva em visita a Portugal, quisesse, assim que aterrou, ir logo a correr para o Estádio da Luz só para almoçar com estes dois grandes artistas brasileiros...



O Benfica não inscreveu Capdevilla para esta fase de grupos da Liga dos Campeões e inscreveu Jardel.
Não escrevi esta frase para dar a notícia a ninguém.
Escrevi-a apenas para me ir convencendo a mim própria de que é verdade. E ainda não estou completamente convencida. Melhor será reescrevê-la.
Cá vai:
O Benfica não inscreveu Capdevilla para esta fase da Liga dos Campeões e inscreveu Jardel.
...Ainda não estou convencida."

Leonor Pinhão, in A Bola


PS: A ironia da Leonor não mente, praticamente todos os antigos presidentes da FPF 'ligados' ao Benfica, raramente beneficiaram o Benfica, e variadas vezes beneficiaram os nossos inimigos, tudo para manterem a imagem de imparcialidade (e não só...). Mas desta vez o enredo é diferente, porque no passado o Presidente da FPF era uma figura, quase, decorativa, só em casos excepcionais é que podia exercer o seu poder de influência, nas competições internas. O verdadeiro poder estava no Conselho de Arbitragem, no Conselho de Disciplina e no Conselho de Justiça. Com a alteração dos Estatutos, e do processo eleitoral, a escolha do próximo Presidente da FPF terá uma importância nunca antes 'vista', com impacto directo no CA, no CD e no CJ...

Ricardo Gomes

"Ainda na esteira do que ontem escrevi, tenho presente um desportistas que atravessa uma grave situação de doença: Ricardo Gomes.

Enquanto jogador do Benfica foi um dos que mais me impressionaram pela sua completude. Atleta invulgar, de uma extrema lealdade, desportista sereno e culto, colega solidário, deixou para a história do clube a sua participação sempre eficaz e campeã em várias épocas. Foi, aliás, o primeiro capitão encarnado não português. Numa dupla incomparável com Mozer e a que se juntaria ainda um outro jogador de eleição, Valdo.

Na final europeia de 1990, em Viena, contra o Milan, recordo-me de ter falado com ele, imediatamente após o jogo que o Benfica havia perdido por um a zero. Li-lhe nos olhos e nas palavras, uma melancolia profunda e, ao mesmo tempo, apaziguadora do dever integralmente cumprido. Disse-lhe, então, que perdera aquela final, mas que ainda tinha o Mundial um mês depois para tentar vencer pelo Brasil, ao que me respondeu que essa «lei das compensações» não lhe esbatia a dor.

Nunca foi, como jogador ou agora como treinador, homem de polémicas inúteis, de jogos de bastidores, de desrespeito pelos adversários, de mediatismos bacocos. Simplesmente, uma pessoa profissionalmente plena e eticamente irrepreensível.

Actualmente técnico do Vasco da Gama e aos 46 anos de idade, Ricardo enfrenta um decisivo desafio contra a doença e a sempre frágil fronteira entre a vida e a morte.

Fica aqui, singelamente, a manifestação do desejo do seu regresso rápido à vida activa para continuar a singrar através da maior das vitórias desportivas: a da exemplaridade numa actividade, às vezes, tão desumanamente predatória."


Bagão Félix, in A Bola

Vacas magras

"A tão badalada e enaltecida organização estrutural do FC Porto desta vez ficou em xeque: deixar para os últimos dias ou horas duas importantes operações de mercado (a contratação de um ponta-de-lança e a venda de Álvaro Pereira), ambas falhadas, foi uma amostra de que tem poucos fracos. Para já não falar da inesperada surpresa que foi a deserção de Villas-Boas. Refiro o caso Álvaro Pereira porque no mundo-cão do futebol não há lugar para caprichos ou pequenas vindictas. Uma oferta de 20 milhões de euros por um defesa lateral é sempre irrecusável e duvido que volte a surgir outra igual. Por outro lado, partir para a Liga dos Campeões com o inexperiente e inadaptado Kléber como única referência para o eixo do ataque é entregar de antemão o ouro ao bandido.

A Série A despede-se do mercado com um saldo desolador: 56 milhões de euros gastos. É esta a diferença líquida entre as receitas arrecadadas com vendas e as despesas feitas com compras, o que dá um média ponderada de 2,8 milhões por cada uma das 20 equipas! Longe vão os tempos áureos das décadas de 80 e 90 em que não se olhava a meios para recrutar as estrelas mais rutilantes. Quem mais investiu foi a Juventus (40 milhões) mas, em compensação, também houve quem somasse lucros de 57 milhões, como a Udinese da família Pozzo que está declaradamente no futevol com fins lucrativos e que é co-proprietária do Granada, da I Liga espanhola. Um dos grandes males do futebol italiano são os elevados salários. Vejam a sua trajectória alucinantes nos últimos 50-60 anos: Valentino Mazzola, capitão do Torino e da squadra azzurra, morto tragicamente com toda a equipa em 1948 num desastre aéreo em Superga, ganhava 8 contos/mês (5 vezes mais que um operário); hoje, Ibrahimovic, por exemplo, ganha 950 mil euros de vencimento-base (950 vezes mais do igual operário)!"


Manuel Martins de Sá, in A Bola

Pedir sem dar

"Em Portugal exigem-se medalhas sem que exista uma verdadeira aposta no alto rendimento


Assisti a fases dos Mundiais de atletismo num barulhento café e distraí-me, também, com algo que me atraiu desde os distantes anos 60, nos Jogos de Roma: apreciar a diferença morfologia dos atletas, hábito que começou quando nem pensava seguir Educação Física. Na Aldeia Olímpica, não era difícil: a altura dos basquetebolistas, a envergadura dos lançadores, a magreza dos fundistas, as pequeninas ginastas, as orelhas dos lutadores, o equilíbrio morfológico dos decatlonistas... e por aí fora.

Já então muitos países sabiam que para o alto rendimento - tal como na arte - era fundamental identificar talentos, morfológica e psicologicamente e, depois, proporcionar-lhes meios para desenvolverem as suas capacidades. Os resultados foram espectaculares nos anos 70. Diz Tudor Bompa que 80 por cento dos medalhados da DDR e da Bulgária resultaram da identificação de talentos.

Muito evoluiu a Teoria e a Metodologia do Treino e os métodos para descoberta de talentos, aperfeiçoando-se critérios. Só que a base é a mesma: quem desafina, não canta ópera. E em Portugal? Verdade que houve quem se preocupasse com o assunto aí nos anos 80. Porém, os - poucos - cientistas estavam preocupados com as carreiras académicas, longe do terreno.

A «detecção» dependia mais do saber de treinadores e da força de vontade dos atletas que apareciam do que da observação de crianças e encaminhamento das mais dotadas para certos desportos.

Nesta época do ano, os pais (que podem) e as escolas (que têm professores com horário e instalações) têm actividades desportivas. Mas não contemos muito com eles para o desporto de alto rendimento.

Só para o de lazer e já não é pouco. Raros passarão pelo buraco da agulha, entrando no reino dos campeões. E a esses que escaparam à pobreza técnica e científica, o que é que se exige? Medalhas! E o que recebem? A crítica de não as alcançarem, como faziam uns vizinhos da mesa onde me sentava... e não só."


Jenny Candeias, in A Bola

Uns safanões

"Escrevi um dia que os piores inimigos dos clubes são os próprios adeptos – os quais, em certas situações, criam um clima interno de instabilidade altamente prejudicial.
Quando as coisas correm bem, tudo está bem. Mas quando correm mal – e os jogadores mais precisam do carinho da massa associativa –, os adeptos insultam o treinador e os jogadores, exigem cabeças, fazem distúrbios, puxando a equipa ainda mais para baixo.
Olhe-se para o Benfica, onde os sócios já atacavam Jesus; olhe-se para o Sporting, onde os sócios gritam aos jogadores “Vocês são uma vergonha!”; olhe-se para o Guimarães, cujos sócios chegaram a agredir os jogadores da sua equipa!
É inacreditável!
Por isso, fiquei preocupado com a vitória do Guimarães na Madeira. Por duas razões.
Por um lado, porque ela caucionou a “chicotada psicológica”. Num momento em que as chicotadas psicológicas começavam a ficar desacreditadas e a estabilidade começava a ser vista como um valor, este resultado do Guimarães apontou no sentido contrário.
Por outro lado, a vitória veio dar razão aos que defendem a teoria de que “uns safanões dados a tempo nunca fizeram mal a ninguém”, como dizia Salazar.
Depois da goleada imposta pelo Vitória de Guimarães ao Nacional, muita gente vai voltar a dizer que as chicotadas psicológicas até resultam. E os mais arruaceiros irão afiançar que umas palmadas nos jogadores de vez em quando só lhes fazem bem.
Os 4-1 infligidos pelo Guimarães ao Nacional, na Choupana, não ajudaram nada a posição de quem defende um maior fair play no futebol português."