"Em Portugal exigem-se medalhas sem que exista uma verdadeira aposta no alto rendimento
Assisti a fases dos Mundiais de atletismo num barulhento café e distraí-me, também, com algo que me atraiu desde os distantes anos 60, nos Jogos de Roma: apreciar a diferença morfologia dos atletas, hábito que começou quando nem pensava seguir Educação Física. Na Aldeia Olímpica, não era difícil: a altura dos basquetebolistas, a envergadura dos lançadores, a magreza dos fundistas, as pequeninas ginastas, as orelhas dos lutadores, o equilíbrio morfológico dos decatlonistas... e por aí fora.
Já então muitos países sabiam que para o alto rendimento - tal como na arte - era fundamental identificar talentos, morfológica e psicologicamente e, depois, proporcionar-lhes meios para desenvolverem as suas capacidades. Os resultados foram espectaculares nos anos 70. Diz Tudor Bompa que 80 por cento dos medalhados da DDR e da Bulgária resultaram da identificação de talentos.
Muito evoluiu a Teoria e a Metodologia do Treino e os métodos para descoberta de talentos, aperfeiçoando-se critérios. Só que a base é a mesma: quem desafina, não canta ópera. E em Portugal? Verdade que houve quem se preocupasse com o assunto aí nos anos 80. Porém, os - poucos - cientistas estavam preocupados com as carreiras académicas, longe do terreno.
A «detecção» dependia mais do saber de treinadores e da força de vontade dos atletas que apareciam do que da observação de crianças e encaminhamento das mais dotadas para certos desportos.
Nesta época do ano, os pais (que podem) e as escolas (que têm professores com horário e instalações) têm actividades desportivas. Mas não contemos muito com eles para o desporto de alto rendimento.
Só para o de lazer e já não é pouco. Raros passarão pelo buraco da agulha, entrando no reino dos campeões. E a esses que escaparam à pobreza técnica e científica, o que é que se exige? Medalhas! E o que recebem? A crítica de não as alcançarem, como faziam uns vizinhos da mesa onde me sentava... e não só."
Jenny Candeias, in A Bola
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