Últimas indefectivações

quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

O tempo é de apoiar Bruno Lage


"«Um futebol ofensivo, dinâmico, divertido, fundamentalmente um futebol que puxe pela bancada, é o que queremos.»
O seu a seu dono. Passaram alguns meses deste esta afirmação e não podemos dizer que o futebol ambicionado por Bruno Lage no dia da sua apresentação no Benfica tenha sido uma promessa vã ou uma ambição irracional. Bruno Lage sabia a quem dirigia essas palavras e era precisamente à bancada que queria deixar as suas primeiras palavras, a bancada que ele conhece bem, porque é benfiquista e porque foi a bancada que fez dele herói, primeiro, e vilão, até deixar o clube. Lage encontrou adeptos descrentes e angustiados, quase tanto como por alturas da sua saída, convencidos de que a época terminara quase antes de começar e desconfiados do que Lage lhes podia trazer, apesar de o sentimento geral ser um pior que está não fica.
Mas Lage encontrou também adeptos profundamente entediados com o jogo jogado, e conseguiu resgatá-los do estado catatónico em pouco tempo. Ao longo das semanas seguintes, aos poucos, o futebol atrativo foi aparecendo, nomeadamente nos pés de Di María, que não sabe jogar de outra forma, Akturkoglu, um reforço que saiu melhor do que a encomenda, e Carreras, o lateral espanhol que passou de flop a novo craque após meia dúzia de saídas virtuosas com a bola colada no pé.
Houve bom futebol e os golos voltaram a aparecer com mais frequência do que os lenços brancos. Houve golos para todos os gostos. Houve uma goleada épica ao Atlético Madrid que quase me atirou para aquela euforia da época de Schmidt em que tínhamos alegadamente tudo para ganhar a Champions, até a realidade nos impor um duro revés em forma de catennacio. Houve uma goleada ao FC Porto como não me lembro de ter visto, um perfeito esmagamento do adversário.
Essa noite alegrou os Benfiquistas e deixou os adeptos da equipa adversária num estado de profundo desânimo, prontos para crucificar o treinador e já saudosos do antigo presidente. Havia um campeonato que parecia perdido e que agora está perfeitamente em jogo. Havia uma Champions para disputar e a equipa permanece em condições de lutar por um lugar na prova. Havia um plantel esfrangalhado e mal planeado, ao qual Lage deu apesar de tudo um sentido e do qual tirou partido, o suficiente para agora, ironicamente, lhe exigirmos mais do que tem mostrado nestas últimas semanas.
A proverbial gota de água, que por enquanto é uma tempestade num copo, foi o empate de domingo frente a essa figura jurídica que dá pelo nome de AVS Futebol SAD, entidade acerca da qual pouco sei, a não ser que tem sede na simpática Vila das Aves e, consta, terá adeptos. Acresce que roubou pontos ao Benfica nos últimos segundos de um jogo em que, tal como os outros todos, isso não podia acontecer. Mais do que os pontos perdidos, o que incomoda mesmo é aquela sensação de que estávamos a pedi-las há sensivelmente meia hora. Não sei se o AVS Futebol SAD terá passado 30 minutos a encostar outro adversário na Liga portuguesa como o fez na noite de domingo. Foi, digamos, irritante.
É um facto que a equipa esteve a 30 segundos de levar 3 pontos, mas a verdade é que não fez por merecer a sorte que manifestamente não teve, e Lage voltou a mexer mal na equipa. Não há dois jogos iguais, mas este relaxamento, ou a nossa incapacidade de gerir os momentos de um jogo em que temos vantagem mínima, sentiram-se em certa medida nos jogos contra Farense, Arouca e Vitória de Guimarães. São adversários diferentes, com um denominador comum: capacidade de intranquilizar um adversário muito superior como é o Benfica. Ainda assim, não obstante o facto de aquela ideia de um «futebol divertido» ser agora uma memória longínqua, o facto é que nestes 4 jogos o Benfica fez 10 pontos. Não é perfeito, mas pode muito bem vir a chegar se a equipa fizer o que lhe compete no restante calendário.
De resto, neste momento só temos mesmo uma opção, que é apoiar Bruno Lage. Nenhum treinador faz um favor ao Benfica em aceitar treinar a equipa de futebol principal, mas há timings e timings. Lage aceitou regressar quando outros recusaram (compreensivelmente). Não teve oportunidade de planear a atual época, não tem um plantel à sua medida, não é responsável pelo planeamento danoso que originou vários dos problemas agora sentidos, e não teve uma enormidade de tempo para tornar esta equipa assim tão diferente do que era. Ah, e, apesar de tudo isto, não se queixou uma única vez.
O pedido que foi feito a Lage era o mais desafiante que existe no futebol: produzir impacto imediato numa equipa que só está bem se ganhar os jogos todos, ou se deixar sangue, suor e lágrimas no relvado a tentar lá chegar. Contas feitas, o balanço não é estruturalmente negativo. Se me perguntam pelo tal «futebol divertido que puxa pela bancada», eu direi que espero pelo seu regresso a qualquer instante, idealmente com a segunda linha do plantel a aparecer de forma mais consistente (é preciso que Lage evolua no seu aproveitamento destes jogadores).
É um facto que não temos visto o futebol divertido das primeiras semanas, mas não perdi a esperança de que o jogo bonito volte a aparecer. Bruno Lage já foi criticado esta época por teatralizar a comunicação com os adeptos, mas talvez estejamos a ver mal o filme. O que Lage faz de cada vez que clama por mais apoio das bancadas é mesmo pedir-nos que trabalhemos com ele, porque sabe que isto não é nem será fácil daqui até ao final. Vamos prosseguir em circunstâncias bastante imperfeitas e Lage já viu jogos do Benfica suficientes para saber que a bancada ganha jogos. Desta vez, talvez seja melhor deixar o cinismo fora dos convocados. Prefiro alguém que pede aos adeptos para se envolverem do que um treinador fechado sobre si mesmo e apostado em desprezar os adeptos do clube que representa.
Por agora, acho que é de seguir o conselho do Di María de cada vez que nos dirige um daqueles abraços largos. Façamos o mesmo e abracemos este treinador, até porque tão cedo não haverá outro. Em vez das dúvidas, é investir energias no reforço positivo e vermos onde isso nos pode levar. As contas, estas e todas as outras, fazem-se no fim. Até lá, digo ao leitor o que tenho dito a mim mesmo: deixemos as crises de fé para outro dia, acreditemos que a equipa vai emendar a mão já nos próximos 3 jogos - fundamentais - e levemos o nosso Bruno Lage ao colo, rumo às conquistas que todos desejamos. Pode ser que dê."

Terceiro Anel: Diário...

Zero: Tema do Dia - Vítor Pereira chega à Premier League: que desafios o aguardam?

Terceiro Anel: AFS...

Guardiola: não está a ser bom, mas mau nunca foi


"O melhor treinador de uma geração (ou várias) debate-se com uma situação inédita na sua carreira: apenas uma vitória em 11 jogos. Será que estamos a assistir ao fim de uma era?

Aquela imagem dos arranhões na cabeça e no rosto de Pep Guardiola dificilmente será esquecida por quem teve o prazer de assistir à evolução do futebol no século XXI graças a ele. O treinador do Man. City vive uma série negativa que poucos acreditariam ser possível (apenas uma vitória em 11 jogos!) e, no final do dérbi de Manchester e da vitória de Ruben Amorim na casa do rival, admitiu que não está a ser «suficientemente bom». Perante os resultados, é verdade que começa a ser difícil contrariá-lo.
Não é a primeira vez, no entanto, que o melhor treinador das últimas décadas e um dos melhores de sempre da história deste jogo tem de justificar fases más, mas é interessante analisar os argumentos de Pep nas últimas semanas e o seu crescente desespero. A culpa já foi das lesões - e quem perde o Bola de Ouro é certo que pode queixar-se, mas num plantel praticamente sem limites financeiros parece só desculpa de mau pagador. Também o facto desta equipa já ter ganho tudo não ajuda - a forma como este Man. City (um clube com pouca história antes dos investidores árabes) se tornou um gigante da competitividade é um dos segredos do técnico catalão, mas pelos vistos nem ele consegue motivar este conjunto de estrelas a ganhar sempre. Mesmo a provocação aos adeptos do Liverpool (são 6 Premier League nas últimas 7, quem resiste a gabar-se disto?) e o bate-boca com José Mourinho com as 115 acusações ao Man. City metidas ao barulho seriam momentos de diversão ou até admiração, se tivessem reação em campo. Assim sendo, são só tristes.
Agora, tendo renovado com o clube e garantido que não o abandona nem que desça de divisão por castigo, Guardiola não está a ser, de facto, suficientemente bom para encontrar soluções que contornem as lesões, a falta de motivação e os adversários que nem precisam de muito para ser melhores (ao Man. United bastou Amad e a estrelinha...). Estamos a assistir ao debate interno e externo da figura que ainda hoje inspira treinadores a jogar de uma determinada forma, mesmo quando não têm recursos para isso. Não está a ser bonito, mas se a solução para ganhar sempre tivesse sido finalmente encontrada isto tinha menos piada.
Mesmo estando tudo encaminhado para correr mal, parte de mim ainda acredita que Pep vai dar a volta a isto, inventando um milagre imediato e reinventando-se para o que falta na sua carreira. Por tudo o que já fez no futebol e o que ainda vai fazer, a verdade é que a marca de Guardiola é muito mais profunda do que estes arranhões."

E a seguir à centralização dos direitos de transmissão?


"A indústria do desporto ganha dinheiro atualmente através dos fabulosos acordos de transmissão das suas competições que fez com grupos televisivos, da capacidade de captar e ativar marcas que utilizam o desporto para chegar aos consumidores através de patrocínios e dos adeptos que pagam os seus bilhetes para ir aos estádios, piscinas, pavilhões, courts ou circuitos. Espera-se que este modelo de negócio se transforme totalmente nos próximos anos.
Começam a existir os primeiros sinais que os contratos televisivos fabulosos terão chegado aos seus tetos financeiros pelo que se esperam novidades a esse nível, nomeadamente com a entrada das tecnológicas neste negócio bem como da fragmentação de transmissão em diferentes plataformas de streaming. Por outro lado, o foco no futuro não vai estar apenas nas transmissões das competições ao vivo, mas também num conjunto de novos conteúdos gerados em redor do desporto. Quer isto dizer que todos os momentos que decorrem antes e depois das competições vão também gerar novos públicos e audiências significativas.
Olhando para os contratos comerciais e patrocínios espera-se que esta linha de receitas se desenvolva muitos nos próximos anos dado que os novos investidores e donos da indústria do desporto vão ser capazes de maximizar fórmulas de atração e ativação das marcas neste território. Quanto às bilheteiras, os clubes, para além da melhoria tremenda que vão proporcionar nos estádios essencialmente pela utilização da tecnologia, vão poder estender a experiência de estádio às casas dos adeptos.
Dito de outra forma, um clube como o Sporting Clube de Portugal vai poder proporcionar, para além dos 50.000 adeptos que se deslocam a Alvalade em cada jogo, a outros 2 milhões de espetadores espalhados pelo país e pelo mundo uma experiência semelhante no conforto das suas casas. Isto vai impulsionar brutalmente as receitas atuais.
O modelo de negócios do desporto usado por mais de 30 anos vai ser alvo de disrupções várias passando a estar desatualizado num ápice. As equipas comerciais e de marketing dos clubes trabalharam durante mais de três décadas orientadas para este triângulo de receitas o que os levou a uma obsessão à volta do dia de jogo e da sua duração.
Quase todas as receitas surgiam da exploração e maximização das oportunidades geradas à volta da competição desvalorizando todos os restantes dias do ano. Os clubes estão por isso já muito capacitados e focalizados nesta dimensão pelo que as grandes curvas de aprendizagem surgirão de todos os momentos distantes das competições.
Outro fator que vai contribuir para a transformação dos modelos de negócios dos clubes é que o tipo de consumidores alvo vai naturalmente mudar nos próximos anos. Pensemos nas principais características das diferentes gerações e percebemos logo que a forma como consomem desporto é muito diferente entre elas."

A dinâmica dos processos eleitorais


"Regresso a este tema com algum sentido de oportunidade (digo eu). É que estamos a apenas dois dias de saber quem se apresentará a votos às próximas eleições para a Federação Portuguesa de Futebol. Na próxima quinta-feira termina o prazo estipulado pela Comissão Eleitoral, presidida por José Luís Arnaut.
Segundo o que é possível perceber, é provável que tenhamos mais do que uma lista a concorrer aos orgãos sociais, facto que sublinha a importância do que está em causa e elogia a beleza singular de processos democráticos desta dimensão. Mas a eventual existência de duas (ou mais) candidaturas não anula a obrigação de acautelar alguns deveres, em nome do respeito mútuo e grandeza ética que têm que prevalecer nestes momentos.
É muito claro para mim: há uma diferença muito grande entre esgrimir argumentos na busca pela vitória e recorrer a expedientes menores para tentar conquistá-la; há uma diferença entre taticismo/jogo político e ataque cerrado, descontrolado, desenfreado a adversários; há uma diferença entre apresentar ideias ou visões distintas e tentar descredibilizar projetos de quem está no outro lado da barricada. As primeiras mostram inteligência estratégica, elevação, lealdade democrática. As segundas uma falta gritante de argumentos, medo e até desespero. Qualquer observador distante reconhece os sinais sem grande esforço.
Naturalmente que quem se propõe ir a votos escolhe o jogo que quer jogar, sabendo que isso dirá sempre mais de si do que das peças que coloca no tabuleiro. Mas as ações (e respetivas consequências) ficam sempre para quem as pratica e está tudo bem.
No que me diz respeito, penso que há linhas que não se devem ultrapassar. Aliás, se tivesse que redigir um manual intitulado ‘O que nunca fazer num processo eleitoral’, saberia perfeitamente o que escrever:
— Evitem ofensas, calúnias, difamações ou ataques pessoais em relação a rivais, porque isso belisca a vossa imagem e desvia o foco das propostas que têm para oferecer;
— Não alimentem rumores, boatos ou fake news. É pouco ético, mostra falta de opções, prejudica a campanha e pode acarretar consequências legais;
— Atenção às promessas. O compromisso com a palavra é fundamental. Um dia alguém lembrar-se-á de cobrar e perceber se foram vazias, irrealistas ou lançadas ao vento. A última pessoa que querem desiludir é aquela que vos confia o voto. Always deliever what you promise;
— Nunca tentem influenciar o resultado das eleições com estratagemas desonestos, imorais ou antiéticos. Gente limpa não aprecia jogo sujo. Gente grande não joga baixinho;
— Não sugiram que as eleições em si, o processo, é pouco profissional, mal preparado ou gerido. Tentar desacreditar quem tem legitimidade legal/regulamentar para o efeito demonstra falta de respeito pela instituição e pelos seus responsáveis. Um tiro nos pés;
— Evitem criticar sistematicamente os adversários. Um candidato inteligente prioriza a apresentação das suas ideias e a divulgação do seu projeto. Nunca se centra apenas na campanha dos rivais;
— Nunca menosprezem a inteligência e integridade dos vossos eleitores. Uma atitude mais agressiva ou arrogante afasta uns quantos e reduz o apoio de outros;
— Não adoptem ações ilegais ou desleais para atingir o objetivo. Violar a privacidade de outros, usar dados sigilosos ou explorar vunerabilidades pessoais não é o caminho digno para obter vantagem. O jogo baixo tem preço alto;
— Não incentivem a polarização ou a desunião como forma de angariar apoios. Ficarão sentados sozinhos num dos extremos da mesa;
— Nunca fujam de debates justos nem ignorem temas difíceis mas necessários. Isso será interpretado como falta de pulso, má preparação ou desconfiança nas próprias propostas. Não funciona.
Ao contrário do que tantos defendem, não vale tudo para ganhar."

ESPN: Futebol no Mundo #407 - Final de semana sem vitórias de Real, Barça, Liverpool, City, Juve, Bayern...