"A luz era intensa e brilhante, mal conseguia ver, estava a encadear, fechei um olho, como me tinham ensinado na tropa, e franzi o outro. Estava no relvado do magnifico estádio do FC Galácticos, corria com a bola nos pés, tinha o guarda-redes, a baliza, a bancada repleta e as pessoas à minha frente, de pé, a gritar “Golo”. Sentia todos os músculos das pernas, como se a concentrar toda a minha energia para rematar, o coração batia cada vez mais rápido, forte, parecia sair do peito, tinha tudo para rematar e … uma voz forte interrompe. “Sr. Colombo, está tudo bem?” – perguntou Robert West, alto, forte, corpulento, cabelo grisalho, com óculos; tinha sido um grande jogador, depois treinador e agora era o Director Geral do Clube.
“Sim, está tudo bem; mas o que fazem as pessoas que treinam e dirigem este Clube, para se conseguir bons resultados: qual é o vosso lema?” – perguntou o Detective. “O nosso lema é recrutar para ganhar” – respondeu o Sr. West e continuou “canalizamos a maior parte do orçamento para contratar jogadores, contratando os melhores das equipas adversárias que nos criaram problemas, os génios; desvalorizamos os jogadores que o Clube forma; fechamos os olhos aos desvios das estrelas e somos exigentes com os outros jogadores, como que fortes com os fracos e fracos com os fortes; passamos os treinadores para segundo plano, que se focam em usar esses génios.”
“Estão satisfeitos com os resultados desta abordagem?” – verificou o Detective Colombo. “Não, de modo nenhum e ao contrário do que esperávamos, recrutar para ganhar não nos tem levado a nenhuma conquista, bem pelo contrário” – devolveu o Sr. West.
“Qual é o motivo por trás desta ideia?” – inquiriu o Detective Colombo. “Acreditamos que se conseguirmos juntar os melhores jogadores, os génios, os talentos, então estamos mais próximos de ganhar” – complementou o Sr. West.
“Quais têm sido os comportamentos resultante dessa crença?” – perguntou o Detective. O Sr. West olhou para cima, como que a organizar as suas ideias e respondeu - “O que é que acontece no ano seguinte, quando jogamos com as equipas a quem fomos contratar esses génios, é: algumas dessas equipas desaparecem, deixam de ser competitivas – é como se tivéssemos queimado aquele clube – pois não nos estimulam a melhorar; e noutras equipas, isso leva-as a surgirem com novos talentos, que nos criam ainda mais problemas, que nos anos anteriores. Internamente, ao estarmos tão concentrados nos resultados, usamos os jogadores para ganharmos e muitas vezes não só não ganhamos, como os jogadores que tínhamos contratado regridem, enquanto os jogadores da casa sentem-se desvalorizados e dependentes das estrelas; criamos divisões entre os jogadores; os sócios ficam muito iludidos a curto-prazo, nas pré-temporadas, e terminamos as épocas como que com uma granada nas mãos, pronta a explodir, com as críticas dos sócios; comprometendo quer os resultados imediatos quer os futuros. Quer a relação, quer a imagem – interna e externa, quer a vontade das pessoas continuarem no Clube, quer ainda os resultados competitivos têm sido desastrosos” – referiu o Sr. West.
“Quais são os KPI’s do Clube?” – tentou saber o Detective Colombo. “Os nossos indicadores de performance – KPI´s – são os resultados colectivos e individuais. Premiamos a conquista de campeonatos, taças, golos marcados e isso mesmo está nos contratos por objectivos, que é uma prática do Clube” – respondeu Robert West.
“Esse tipo de contratos está a produzir os resultados que desejavam?” – interpelou o Detective Colombo. “Não, efectivamente tem-se verificado um efeito oposto. As pessoas não olham aos meios para atingirem os seus objectivos pessoais, algumas pessoas pisam os outros, é o vale tudo; há competição interna dentro das equipas; as pessoas concentram-se nos seus objectivos individuais e deixam os colectivos e do Clube para segundo plano; as pessoas concentram-se nos resultados e perdem o contacto com o que era necessário fazer para conseguir esses resultados. Qualquer atalho dá menos trabalho, mas também leva a deixar de prestar atenção aos detalhes, essenciais para as grandes conquistas” – disse o Sr. West.
“Sr. West, por curiosidade, se tivesse que escolher uma figura geométrica para representar as relações entre as pessoas do Clube que jogam, treinam, dirigem, apoiam, (…), que figura é que escolheria?” – perguntou o Detetive Colombo. “Um triângulo, …, ou melhor uma pirâmide, com os colaboradores e Atletas na base, a seguir os Treinadores, depois os Dirigentes e por último, no topo da pirâmide, o Presidente e toda a interacção dentro do Clube segue esta sequência” – respondeu o Sr. Director Geral.
“O organograma em forma de pirâmide tem ajudado o Clube a chegar ao seu destino?” – perguntou com curiosidade o Detective Colombo e tentando compreender a situação perguntou ainda: “Por que é que a interacção no Clube está organizada num organograma em forma de pirâmide?”. “As pessoas precisam de ordem, organização e de saber quem manda em quem” – devolveu o Sr. West. “Pode parecer um absurdo Sr. Colombo, mas os resultados desta forma de organização não são os melhores” e como que adivinhando aproxima pergunta, o Sr. West continuou: ”esta situação provocou lutas de poder, dependências para agir, insatisfações com treinadores e dirigentes, uma enorme centralização, não respondermos em tempo útil às múltiplas solicitações diárias, sobrecarga sobre o Presidente e no final só conseguimos insatisfação”.
O Detective Colombo respirou profundamente, parecia estar a pensar na próxima pergunta. O Director Geral do Clube, o Sr. West, aproveitou para sintetizar algumas ideias chave - “Detective Colombo, pelo que estou a perceber os resultados insatisfatórios do Clube também estão ligados a algumas convicções, como: a crença de recrutar para ganhar, no talento, nos génios; o princípio de valorizar os resultados, a performance; a crença na hierarquia. Ou seja, resumidamente, a nossa cultura influencia os resultados e as experiências de todos.”
“Muito bem Sr. West, descobriu o meu segundo suspeito de ter “matado” a mudança no Clube, a Cultura do Clube, e deixe-me agradecer-lhe a sua abertura, interesse genuíno e frontalidade” e acrescentou “a cultura dos Clubes influencia não só quem cada um pode ser, mas também em quem cada um se pode tornar” e que “uma vez criada – a cultura – é muito difícil mudá-la.” – disse o Detective Colombo.
Nisto o telefone toca, era o Sr. Mark Angie, presidente do Clube. “Sim” – atende o Sr. Colombo e de imediato o Sr. Angie disse: “Sr. Colombo já sabe qual é o outro suspeito de ter “matado” a mudança?”. “Sim, já …” – responde o Detective Colombo. “Então, diga lá senhor Detective” – retorquiu o Presidente. “Sr. Presidente tive uma conversa muito produtiva com o Director Geral e ele está em condições de partilhar consigo as conclusões a que chegamos” – devolveu o Detective Colombo. “OK, irei falar com ele. Obrigado” – respondeu o Presidente.
“Sr. West, agradeço-lhe uma vez mais toda a ajuda, estou certo que regressarei para voltarmos a falar, até porque nas entrelinhas disse algo que necessito de investigar e para além disso gostava imenso que me pudesse contar como ganharam aquele Campeonato Mundial em 1984” – mencionou o Detective Colombo. “Com certeza Detective Colombo, terei todo o gosto. Foi uma experiência fabulosa” – respondeu o Sr. West.
“Olá Sra. Burlington” – saudou o Director Geral – “venho falar com o Presidente Angie”. “Por favor acompanhe-me, o Presidente aguarda-o e pediu-me que entrasse assim que chegasse” - referiu a Sra. Judy Burlington.
A Sra. Burlington, secretária do Presidente do Clube, era uma pessoa extremamente preocupada e cuidadosa. Trabalhava no Clube há mais de 30 anos, trabalhou com vários Presidentes, tinha um amor enorme pelo Clube e fundamentalmente pelo que o Clube já tinha representado. Estava curiosa com o que o Director Geral estaria a falar com o Presidente Angie, mas como o Presidente Angie não lhe pediu para ficar, estava na sua secretária ansiosa por saber as novidades. Olhava para o relógio, mas o tempo parecia não passar. Foi tratando de todos os assuntos pendentes, a seguir regou as plantas, depois deu de comer aos peixes do aquário, que estava antes da porta do gabinete do Presidente, e … abre-se a porta e o Presidente pediu-lhe “Sra. Burlington, pode chamar a Directora de Recursos Humanos” – disse o Presidente, depois de abrir a porta do seu Gabinete.
Enquanto a Directora de Recursos Humanos não chegava, o Presidente tinha na cabeça duas frases que estavam a deixar o Presidente intrigado. Aquelas duas frases que o Detective tinha partilhado do Director Geral e que este lhe tinha contado: que a cultura dos Clubes influencia não só quem cada um pode ser, mas também em quem cada um se pode tornar e que uma vez criada – a cultura – é muito difícil mudá-la. Estas frases repetiam-se na sua cabeça, dizendo - como os sinais vermelhos dos semáforos nos dizem – PÁRA, é muito perigoso continuar. A situação afinal era mais grave do que poderia pensar-se. A cultura pode comprometer o que as pessoas podem ser e em quem se podem vir a transformar, os resultados no presente e no futuro e que uma vez estabelecida é muito difícil mudá-la, pelo que quanto mais cedo se procederem a correcções, melhor. Queria um futuro diferente, melhor. Era tempo de mudar.
Depois da Sra. Burlington ter tratado do assunto e da Sra. Susan Will entrar no gabinete do Presidente. “Susan chamei-a porque gostava de explorar um conjunto de situações consigo” – referiu o Presidente Angie.
O Presidente Angie partilhou com a Susan Will tudo o que o Diretor Geral lhe tinha contado da conversa com o Detective Colombo. Por fim, perguntou – “Susan quais são as alternativas para estas situações?”
A Sra. Susan sentiu-se importante e útil pois finalmente estava a começar a disponibilizar recursos na sua área para melhorar o funcionamento do Clube e prosseguiu.
“Presidente Angie relativamente à cultura de génios e ao lema recrutar para ganhar que resultava de se acreditar que os talentos não se desenvolvem, havia a alternativa da cultura de desenvolvimento e o lema formar para ganhar, baseada na convicção de que todos podemos aprender, desenvolver capacidades e competências. Nesta lógica, os Treinadores estão para os Dirigentes como os Jogadores estão para os Treinadores. Ou seja, do mesmo modo que os Treinadores necessitam de bons jogadores, para obterem bons resultados, também os Dirigentes necessitam de bons Treinadores para concretizarem o que desejam. Por isso, em vez de se concentrar em contratar bons jogadores, o Clube passaria a concentrar-se em contratar bons Treinadores neste caso, Treinadores que conseguissem formar jogadores. O perfil do treinador passaria de usar jogadores para desenvolver jogadores. Os jogadores da casa passariam a ter a esperança de representar a primeira equipa. Os adeptos passariam a identificar-se com o plantel e o Clube começaria a ganhar sempre, pelo menos ganhar o futuro todos as épocas, e a arriscar-se a poder a qualquer momento ganhar o presente. A ideia de nunca mais vivermos uma época sem ganhar nada - nem o futuro, nem o presente - pois o futuro o Clube iria sempre, pelo menos, ganhar o futuro, parecia agradar ao Presidente, dada a sua atenção e as suas expressões.”
“Ao foco nos indicadores de performance (KPI’s) e, portanto, nos resultados, podíamos concentrarmo-nos também no processo necessário para conseguirmos esses resultados.” – continuou Susan Will. “Sim Susan, isso faz-me lembrar a travessia do rio Mississipi a remo que assisti recentemente. O nosso atleta Frank Carter tinha um indicador de performance baseado no resultado, ganhar a prova. Contudo, para a vencer, o Frank necessitou de treinar, depois iniciar a prova, durante a prova teve que se esforçar, com isso aproximar-se do objectivo e finalmente e concretizar o resultado. Ou seja, podemos distinguir dois tipos de “P’s” – performance e processo. Ao nível da performance podemos considerar quer a performance propriamente dita – resultado – quer os progressos e acrescentar indicadores de processo nomeadamente a preparação, a partida e a persistência” – partilhou o Presidente Angie. “Ou seja, o Presidente acabou de descobrir um novo conceito de KPI’s – o conceito de KP5I’s” – continuou Susan Will. “KP5I’s?” – perguntou o Presidente. “Sim, para os atletas e as equipas serem bem-sucedidas elas e eles necessitam de Preparação, Participação, Persistência, Progresso e Performance, portanto de KP5I’s” – partilhava a Susan Will.
“Relativamente há estrutura hierárquica, podemos ter a possibilidade de promover uma estrutura com relações baseadas na meritocracia (no mérito) e no apoio do Presidente.” – estava a Sra Will a falar.
Nesse momento, o Presidente começou a pensar e a comparar duas imagens: “uma a de uma pirâmide do Egipto – representando a sua estrutura hierárquica - e a outra de um pião a girar, como aquele que tinha e com que passava horas a brincar, com aquela ponta em ferro e o corpo em madeira, aquela corda a enrolar e depois o lançar do pião e observá-lo a rodar, rodar e rodar. O Presidente começou a pensar como seria ter uma estrutura no Clube em forma de pião, com ele, o Presidente na base, sendo ele aquela parte de ferro que serve de apoio a todo o Clube e os colaboradores, jogadores, treinadores, dirigentes, sócios e simpatizantes a serem a energia. Como é que se iriam sentir os colaboradores, jogadores, treinadores, dirigentes, (…), se a imagem do pião estivesse na base da estrutura das relações entre as pessoas que trabalham no Clube?”
O passado recente não era positivo. Porém, o futuro estava a tornar-se cada vez mais claro para o Presidente. O Clube podia começar a mudar criando uma visão partilhada e mobilizadora (suspeito número 1) e desenvolvendo uma cultura que promovesse o sucesso para todos de uma forma consistente, ao longo do tempo (suspeito número 2).
“Vou telefonar ao Robert” - pensou o Presidente. Ligou. “Robert, temos muito que conversar, onde estás?” – perguntou o Presidente Angie. “Estou no meu Gabinete, queres que vá ter contigo?” – perguntou o Director Geral West. “Não, eu vou ao teu encontro, aproveito e faço um pouco de exercício e saúdo vários colaboradores” – disse o Presidente.
“Robert estive a falar com a Susan Will. Todos suspeitamos que a cultura do Clube esteja a “matar” a mudança e, com isso, a comprometer os resultados desportivos e financeiros, a satisfação de colaboradores, jogadores, treinadores, sócios e simpatizantes, a vontade das pessoas que colaboram, jogam, treinam, dirigem e apoiam continuarem no Clube, a imagem que temos do nosso Clube e a imagem que os outros têm do nosso Clube” – disse o Presidente. “Concordo contigo Mark, podemos transformar a cultura de génios e o lema recrutar para ganhar; temos a possibilidade de desenvolver relações baseadas na meritocracia e na pirâmide invertida ou no pião" – referiu o Director Geral.
“Como podemos colocar na prática estas ideias?” – perguntou o Presidente. “Podemos começar por valorizar os recursos existentes antes de contratar, incorporar o conceito de KP5I’s nos contratos, podemos também contratar Treinadores que estejam habituados a desenvolver jogadores em vez de usá-los, a fazê-lo por várias épocas, podemos …” – estava a responder o Robert, quando é interrompido pelo Presidente - “sim, Robert concordo com tudo isso. Vamos marcar uma reunião com toda a Direcção, partilhar toda esta informação e encontrar em conjunto formas concretas de aplicar estas ideias?”. “Sim, Mark, estou de acordo” – respondeu Robert.
“Mark, antes disso tenho uma pulga atrás da orelha” – disse o Robert. “O que se passa?” – perguntou o Mark. “O Detective Colombo tinha-nos indicado a visão ou a falta de uma visão partilhada e mobilizadora como o suspeito número um e agora a cultura do Clube como o suspeito número dois de estarem a “matar” a mudança no Clube” – disse o Director Geral. “Sim Robert, mas qual é essa pulga que te está a incomodar?” – perguntou o Presidente. “No final da conversa com o Detective Colombo, nas entrelinhas, ele disse que poderiam haver mais suspeitos de terem “matado” a mudança no Clube” – referiu o Robert.
“Robert, estou certo que o Detective Colombo continuará o seu trabalho, entretanto já temos dois pontos de partida para melhorarmos no Clube” – referiu o Presidente. “Sim, vamos abordar as tarefas em mãos e esperar por mais resultados do Detective Colombo” – disse o Director Geral.
Ao chegar a casa, ao final da tarde, Mark Angie convidou Linda, a sua esposa, a tomar um café na Praia. Numa das esplanadas, sobre a praia o Mark Angie via a mesa, as chávenas de café, o mar calmo, a luz do sol a reflectir na água e na linha do horizonte o pôr do sol. “Que sossego, depois de um dia repleto de actividade” – pensou Mark.
O Mark partilhou com a esposa, o que ele e o Robert West tinham descoberto com o Detective Colombo e com as conversas com a Susan. Linda ficou espantada, pois à medida que ouvia Mark, encontrava semelhanças com o que estava a acontecer na sua Escola.
“Afinal o Detective Colombo não deve ter descoberto só os suspeitos por terem “matado” a mudança no FC Galácticos” – disse Linda – “acho que esses também são suspeitos de terem “matado” a mudança na minha Escola” – continuou, “e provavelmente em muitas das organizações” – rematou Mark.
O sol estava quase a desaparecer e com ele a anoitecer e Mark disse – “Linda repara no sol, do mesmo modo que o sol se está a pôr, que irá anoitecer e amanhã haverá nova “aurora”, também no Clube a cultura vigente está a desvanecer, uma nova cultura será construída e, num futuro muito próximo, no Clube irá renascer uma nova cultura e com isso ficará mais próximo do futuro que se deseja”.
Regressando a casa e enquanto conduzia, Mark sentia-se esperançado e curioso. Esperançado por melhorar a cultura do Clube e curioso por descobrir qual seria o próximo suspeito que Detective Colombo acabou por deixar nas entrelinhas.”"