"Há, hoje em dia, um problema sério de gestão no desporto. Pensa-se tanto no valor do dinheiro que se esquecem os valores desportivos
Jurgen Klopp, do alto da sua renovada autoridade, depois de ter embasbacado o mundo com aqueles quatro a zero ao Barcelona e a respectiva qualificação para a final da Champions, ataca a decisão dos «homens» da UEFA que marcaram a final four da Taça das Nações, onde jogará Portugal, a Suíça, a Holanda e a Inglaterra, para poucos dias após a final da Liga dos Campeões. Klopp não foi meigo: «Que será que andam a tomar estes tipos, para tomarem decisões destas?» - perguntava, com toda a ironia do mundo, o mediático treinador alemão.
Se Klopp viesse e trabalhasse em Portugal, coisa que apenas se pode conceber no domínio da mais arrojada ficção, diria o mesmo dos homens que decidiram marcar os jogos destas últimas jornadas do campeonato, desemparelhando o calendário das equipas que dependem uma das outras, dando óbvias vantagens e algumas e evidentes desvantagens e outras.
Há, de resto, no futebol português e no futebol internacional, um problema sério de gestão desportiva. Há quem pense tão exaustivamente no valor absoluto do dinheiro, que se esquece do valor superior do futebol e dos seus principais protagonistas: jogadores e treinadores.
De facto, marcar um campeonato do mundo para o Catar e só depois discutir em que mês do inverno europeu se poderá jogar; marcar uma prova oficial das nações europeias para cinco dias depois da final da mais importante competição europeia de clubes; ou transgredir na equidade de condições das jornadas decisivas de um campeonato, são decisões que ninguém pode sustentar numa base de seriedade e competência.
Há, realmente, um problema complexo do dirigismo desportivo no mundo e não será exclusivo, sequer, do futebol. Daí que, do meu ponto de vista, a única solução viável para estancar a subversão de valores e princípios de natureza desportiva seja o se incluir, a título permanente e com qualidade de veto, comissões técnicas eleitas por treinadores e por atletas profissionais.
Não vejo melhor solução, mesmo num quadro, obviamente desejável, de uma modernização e requalificação dos sistemas reconhecidamente viciosos e viciados, onde continua a assentar a eleição das presidências e de todas as equipas de gestão e administração dos organismos de liderança do desporto de cariz associativa.
Não esqueço que entidades como a FIFA e a UEFA, a Federação Portuguesa de Futebol e a Liga têm nos seus quadros antigos futebolistas e treinadores. Mas a questão relevante é a de considerar a verdadeira importância do conhecimento e da experiência de quem está no terreno e não tem vínculo contratual, ou outro, com a entidade que lidera, que gere e que decide.
É óbvio que Klopp tem toda a razão na crítica que faz à UEFA. Talvez não se suspeitasse que, este ano, duas equipas inglesas estivessem na final da Champions e que outras duas equipas inglesas estivessem na final da Liga Europa. Mas aconteceu e, agora, teremos, necessariamente, pela frente, um problema que não tem solução. A selecção de Inglaterra, que vai contar com uma parte muito significativa de jogadores finalistas das provas europeias, não tem tempo, nem espaço para preparar a equipa para uma prova rápida, mas exigente.
Penso, sinceramente, que o futebol, em particular, e o desporto, em geral, teriam muito a ganhar se nas diversas federações e associações atletas e treinadores tivessem assento em comissões com voto deliberativo nas questões de natureza técnica, quer seja referentes ao jogo e à sua evolução, quer seja no que respeita aos modelos e regulamentos de competição.
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O Benfica e a ansiedade
O Benfica e os benfiquistas têm a noção de que todos os jogos são igualmente importantes, como diria Bruno Lage, mas há uns mais iguais do que outros. Este, em Vila do Conde, será desses. Apesar do futebol poder sempre esconder uma caixinha de surpresas, manda dizer a lei das probabilidades que uma vitória benfiquista, no jogo com Rio Ave, deixa a equipa com o passaporte numa mão e o carimbo na outra. A questão é que a responsabilidade é directamente proporcional à ansiedade e inversamente proporcional à experiência.
(...)"
Vítor Serpa, in A Bola