"DONETSK - Os aviões aterram cheios. Os aeroportos tornam-se deprimentes lugares de convívio para quem tanto mal faz à verdade do Futebol português. Mas a selecção é desculpa, é motivo. Fatos e gravatas de boa qualidade e de mau gosto. Poses vaidosas. As televisões invadem o átrio das chegadas e peitos estufam como se de perus e pavões se tratasse no mendigar da palavrinha parva e da imagenzinha grotesca.
Há uns de sinistros óculos escuros, escondendo as olheiras prostituídas da véspera, camaflando as mentiras que debitam no lugar das verdades que encobrem. São, todos eles presidentes e vice-presidentes, e secretários-gerais, importantíssimas personagens que tirando a vacuidade do título nada têm para mostrar.
Riem-se labregos das raparigas que passam, fazem estalar palmadas nas costas uns dos outros, preparam-se para desperdiçar dinheiro numa estúrdia curta de meia-dúzia de horas que os separam do vôo que os carregue de volta àquele país que o mar não quer, como dizia Ruy Belo. Acreditem: é um circo deprimente ao qual não faltam nem feras nem palhaços. O personagem que se dedicava a abrir garrafas de champanhe a cada derrota da Selecção Nacional dantes não vinha, mas agora já vem. Dantes não era bem aceite, agora já é. Via os jogos em casa, junto ao frigorífico, espreitando a temperatura do espumante. Apareceu uma única vez, convencido da derrota em Nuremberga às mãos de um árbitro compincha. Enganou-se. Hoje em dia voa, convidado, três vezes por semana se for caso disso, lado a lado com o outro senhor de cócoras, ao qual se aconselhava recato e pudor.
Mas não, ao diabo o recato e o pudor se o que vale é andar por aqui promiscuamente misturado com dirigentes de clubes e outros pacóvios quejandos. Pois. Eu não sabia; e se calhar vocês também não? Há lugares de cócoras nos aviões! Se não, como teria ele chegado aqui?"
Afonso de Melo, in O Benfica
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