Últimas indefectivações

terça-feira, 8 de agosto de 2023

Afinal quem quer ficar no Benfica?


"Após uma entrevista recente a Carlos Vinicius, ex-atacante do Benfica, levantam-se questões sobre se a vontade dos jogadores é realmente determinante na sua saída

«Eu senti-me sempre valorizado pelos adeptos na época em que estive no Benfica a jogar. Depois, houve outras coisas a acontecerem no clube, comigo, com os treinadores…
Nem eu próprio consigo responder e as coisas acabaram por não encaixar todas. Ainda hoje, quando venho a Portugal, todos os adeptos me perguntam porque saí e respondo ‘não sei’.»

Vinicius era o avançado mais prolífico do Benfica, marcando a cada 68 minutos. Seria portanto expectável que tivesse mercado. "Recebi uma proposta de 60 milhões pelo Vinícius e não vendi", disse na altura o Presidente do Benfica, passando a mensagem que não daria prioridade à vertente financeira quando o clube apenas tinha vencido a Supertaça nessa temporada. Quatro meses depois, o jogador saía por empréstimo por apenas €3M, desvalorizando-se com esse movimento e, naturalmente, deixando de dar a sua contribuição desportiva ao clube (que tanto precisava dela na época que se seguiu, onde o Benfica se ficou pelo 3.º lugar e sem qualquer troféu).

O jogador acabaria por ser novamente emprestado, até finalmente ser vendido por apenas €5M (numa altura que o próprio jogador tinha um valor de mercado superior a isso). Anos volvidos, e a acreditar nas suas palavras, torna-se evidente que muitos jogadores entram e saem dos clubes sem que realmente tenham um papel determinante no seu percurso profissional.
Entretanto o Benfica muda de Direcção, e parece haver uma clara aposta na vertente desportiva, trazendo com isso novas expectativas para sócios e adeptos do nosso clube. Até surgir o primeiro obstáculo: Enzo Fernández.
Já muito se disse e escreveu sobre a sua saída. Na altura, e mais uma vez acreditando na versão dos acontecimentos dada pelo Presidente do Benfica, Enzo saiu porque o Presidente decidiu que o jogador "não poderia jogar mais pelo clube", por falta de compromisso e porque como adepto, não queria um jogador que "não queria estar no Benfica". E rematou dizendo que no Benfica só estaria "quem tivesse orgulho em representar o clube", alargando o recado igualmente à formação.
Concordando ou não com as palavras de Rui Costa, e não deixando de dar mérito argumentativo à premissa que usou, a verdade é que a saída de Enzo deveria, no mínimo, preparar a actual Direcção para futuras situações deste género, e acautelar hipotéticas consequências desportivas daí decorrentes. Tanto no imediato (abre-se uma lacuna inesperada no plantel que tem de ser preenchida), como a curto/médio-prazo (o arrastar da novela poderá afectar a concentração e motivação no seio do plantel, a equipa técnica desconhece se tem de mudar o plano táctico ou mesmo testar novas adaptações enquanto a situação não se resolve, o foco do scouting poderá ser alterado, e os outros clubes sabem que o Benfica tentará mover-se rapidamente no mercado e jogarem com essa informação).

A época terminou, e o Benfica foi campeão apesar da saída do argentino. Mas sobretudo ficava a lição para que no futuro, a vertente competitiva não saísse prejudicada em caso de nova novela. Ficava a lição para os adeptos, entenda-se, já que para os restantes intervenientes a amnésia provocada pelo calor das férias fez esquecer o que se passou no final do mês de Janeiro.
Tal como Vinicius, o Benfica empresta o seu melhor marcador (com cláusula opcional de venda) e tal como Enzo, foi o clube que quis de facto fazer este negócio. Porquê?
Porque sai por menos da cláusula de rescisão (que serve unicamente para denotar os casos onde o clube é irredutível à venda de um jogador), e porque a acreditar nas palavras do Presidente, é ele quem decide caso ache que um jogador não quer ficar no clube. Quis Gonçalo Ramos de facto sair? Provavelmente. Será ele um jogador que, à semelhança do que foi dito para Enzo, iria forçar a saída? Parece-me difícil, sobretudo não havendo quem batesse cláusula de rescisão.
Mas se a entrevista de Carlos Vinicius nos ensinou alguma coisa, é que nem sempre os jogadores percebem bem a trajectória dos seus percursos profissionais. E se não pagando a cláusula é o Presidente (ou direcção) quem decidem, o que impediu que estes negociassem outro timing ou mesmo outros valores? Necessidade de vender rápido? Oportunidade única de negócio? Aproveitar as JMJ para despachar um jogador com vídeos íntimos nas redes sociais?
Esqueçamos os valores envolvidos na transferência ou intermediação de Gonçalo Ramos. As opiniões dividem-se, e em termos retóricos, aceito que haja argumentos lógicos tanto na opinião que foi bem vendido (peço desculpa, quis dizer bem emprestado) como na opinião que se esperavam outros valores por aquele que será o expectável substituto de Cristiano Ronaldo na Selecção Nacional (lá para 2044, quando o madeirense finalmente pendurar as botas). Mais do que os valores, falemos então das lições que (não) se aprenderam da saída do Enzo Fernández (Quem? Je ne sais pas)
O Benfica faz 6 jogos nesta pré-temporada, Gonçalo Ramos foi titular nos últimos 5. Por outras palavras, Roger Schmidt – treinador que como sabemos pouco gosta de mexer no seu 11 titular durante os 90 minutos e mesmo durante a temporada – montou a sua equipa no recomeço desta época claramente apostando no efémero ex-número 9 como seu goleador. E agora o goleador sai, sem testar convenientemente o seu substituto, em vésperas do primeiro jogo oficial da época, contra um rival histórico, num encontro que irá determinar um troféu que, numericamente, tem um valor significativo particularmente importante.
E estavam fartos de novela? Pois então tomem mais esta, que se arrastava desde 15 de Junho (primeira notícia do jornal A Bola), e onde aparentemente só o Presidente tinha spoilers. O treinador, já sabemos, contava com o jogador. Azar dele, é que o Luis Enrique também. Mas as novelas no Benfica são desinteressantes na medida que têm todas o mesmo final: "não se pode cortar as pernas a um jogador que quer dar o salto". E como vi aí escrito por muitos adeptos, parece ser uma característica única no Benfica. Já outros clubes recusam a venda dos seus jogadores, que mesmo insatisfeitos por permanecerem num clube que não os quer vender, continuam a cumprir o seu contrato, mantendo as prestações.

Perante isto, em caso de perda na supertaça, quão segura está a direcção que os adeptos e sócios não lhe caiam em cima por esta gestão desportiva? Que por sinal, é recorrente e sem indicações que irá mudar no futuro? Haverá a convicção que o estado de graça pelo último campeonato permite perder contra este rival específico, dando-lhes de bandeja mais um troféu? Irão pedir calma e paciência perante a frustração dos adeptos, para confiarem no trabalho que está a ser feito e que já colheu frutos no passado? Ou seja, eufemismos para "esqueçam lá a asneirada que fizemos, pelo menos até voltarmos a repeti-la"?
Vejo muitos Benfiquistas usarem a expressão "zero ídolos" na saída de um jogador que fica entusiasmado por ir jogar numa liga melhor que a nossa, ou ganhar francamente mais do que aufere na Luz. Eu, que já trabalhei em vários países e em vários sítios diferentes, fico triste que o Benfica não lhes seja suficiente, mas entendo que como profissionais queiram um salário que mais se coadune com o seu valor, e que queiram jogar contra os melhores do Mundo regularmente. Entendo ainda mais que queiram sair do lamaçal que se tornou o futebol português nos últimos anos. Mas mais que isso, entendo que uns quantos jogadores sejam vistos como."

1 comentário:

  1. Excelente post. De notar que o novo guarda redes que aí vem, forçou a sua saída. A malta vai ficar a pensar que se fez ao clube formador, não vai fazer por cá, caso se dê bem.

    ResponderEliminar

A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!