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terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Amo o Benfica. E a seleção?


"A minha primeira memória da seleção é de estar embasbacado a ver pela televisão 120 mil portugueses no antigo Estádio da Luz a apoiar a equipa de todos nós rumo à conquista do Campeonato do Mundo. Foram agonizantes 120 minutos até aos penáltis e a euforia com o golo de Rui Costa. Para um miúdo de sete anos, como eu era, pouco me interessava se aquilo era juniores ou sub-20. Na minha cabeça, Portugal era campeão do mundo. E logo contra o Brasil! Aliás, bicampeão, pois dois anos antes já aquela seleção tinha feito semelhante feito, embora disso nada me lembrasse.
Depois há vagas memórias do apuramento falhado para o Mundial 94 e a primeira tristeza com o chapéu do Poborsky no Euro 96. Mas o auge foi aquele maravilhoso Euro 2000. Portugal a jogar um futebol delicioso e com tantos jogos épicos. O 3-2 à Inglaterra depois de estarmos a perder 0-2 logo no início. O golo no último minuto do Costinha à Roménia. O hat-trick do Sérgio Conceição à Alemanha, mesmo estando nós a rodar jogadores. O convincente 2-0 à Turquia nos 1/4 e aquela mão trágica do Abel Xavier nas 1/2 finais com a França.
O Euro 2004 ainda foi especial. Jogado no nosso país, como não vibrar com aquele jogo épico com a Inglaterra ou emocionar-me com o percurso do autocarro de Portugal de Alcochete até ao Estádio da Luz na final. E claro, aquela tragédia grega...
Depois... a ligação foi-se desvanecendo. Até ficamos em quarto lugar no Campeonato do Mundo de 2006, mas lembro-me de pensar que já não sentia o mesmo. E nos restantes 15 anos há um pico com o golo do Éder no Euro 2016. Se vibrei? Claro que vibrei! Fui mesmo à loucura, era ver Portugal Campeão da Europa e logo daquele modo dramático. Mas a importância que dei ao jogo foi tanta que estava a trabalhar nesse momento. Nem pedi para trocar o turno e oh se eu chateio os meus colegas para trocar turnos por causa dos jogos do meu clube!
Eu tenho orgulho em ser Português. Consciente que o local onde nasci é um acaso e desconfiado de nacionalismos exagerados, mas que razões existem para não gostar do meu país? Costumo dizer que temos tudo, só não temos é dinheiro. E a seleção representa o meu povo, as minhas cores e a minha língua. Mas amo a seleção? Não, não amo. Tenho que ser honesto. Tenho por ela um sentimento racional, doseado e momentâneo. Todo o oposto que sinto pelo meu clube, o Benfica.
Teria dificuldade em explicar a um alien o que sinto pelo meu clube de futebol. Amo-o perdidamente, sofro horrores quando perde e sinto-me um apaixonado quando ganha. Mexe com todos os poros do meu ser e não há nada em que pense mais do que no Benfica. Durante muito tempo até tinha vergonha de assumir tudo o que sinto, pois ainda me achavam doente ou fanático e me internavam num hospital psiquiátrico. Mas é o que sou e quase a fazer 40 anos já não o vou esconder.
Vivo a minha bela doença da forma mais feliz possível: aberta e apaixonadamente. E sinto-me um privilegiado, porque tantas alegrias me dá. Momentos, pessoas, vivências. Ser adepto de um clube dá todas as cores possíveis à vida de uma pessoa.
Com Portugal saí da caixa. Vejo-o do lado de fora. Há uma parte de mim que vê Ronaldo & cia e pensa «calma, são só 22 homens a correr atrás de uma bola». E quando se entra nesse mindset, o futebol perde muita magia. Mesmo a paixão que tinha pela seleção quando era jovem, às vezes penso se não teve a ver com o facto do Benfica não ser campeão nesses anos e eu ter ido em busca de alegrias futebolísticas a outro lado.
Lembram-se de ter dito que o Mundial 2006 já não me bateu igual? O Benfica foi campeão em 2005.
Se quero que Portugal seja campeão do mundo? Claro que quero! Se iria festejar imenso? Claro que sim! Mas vou fazer uma confissão: quando estou com os meus companheiros de roulotes nos prés e pós jogos do Benfica, muitas vezes já com umas cervejas bebidas, há um debate filosófico que temos e as respostas poderiam surpreender quem está fora deste nicho de fanáticos por um clube: «Preferias Portugal campeão do mundo ou o Benfica a vencer a Taça da Liga?»
Por decoro, não vou dizer qual é a minha resposta. Mas a verdade é que não ganhamos a Taça da Liga desde 2016..."

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