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terça-feira, 6 de dezembro de 2022

O complexo Eusébio


"1. O primeiro número deste jornal saiu para a rua no dia 28 de Novembro de 1942. E que tempos terríveis para a Europa eram essas que viram nascer, há 80 anos, o primeiro jornal de um clube desportivo português. O Benfica tem uma história linda de resistência e de coragem. O seu primeiro diretor foi José Magalhães Godinho, um homem notável, um democrata de todos os combates. Do Benfica para todos os benfiquistas, que O Benfica continue a ser um orgulho.

2. Decorre o Mundial do Catar, e não há Mundial que não ofereça à vasta plateia global o seu folclore, os seus fenómenos e as suas mistificações. Presentemente, há um caso que é tudo isso ao mesmo tempo. Este Mundial, não fugindo à regra e exagerando até mais não na nota folclórica, tem-nos contemplado com a materialidade daquilo a que se pode diagnosticar clinicamente como 'o complexo Eusébio'.

3. Referindo-nos à obsessão do capitão da selecção nacional e da imprensa devota em suplantar o legado de Eusébio da Silva Ferreira, o melhor jogador português de todos os tempos, através de uma mistificação institucionalizada.

4. Não deixa, no fundo de constituir uma extraordinária homenagem a Eusébio, e a tudo o que Eusébio significa na história e no imaginário do futebol português e mundial, esta operação de mistificação em curso a propósito do suposto 'recorde de golos de Eusébio' na sua única presença num Campeonato do Mundo.

5. Foram 9 golos em 6 jogos, eis a marca de Eusébio em 1966. Um feito notável, uma proeza sem par entre os futebolistas portugueses de todas as gerações. Mas não se trata de nenhum recorde. Em termos de goleadores em 22 edições de Mundiais, se há um recorde a bater, é o do alemão Miroslav Klose, o maior marcador de sempre da história da competição, com 16 golos em 4 presenças na fase  final. Mas esta é uma cifra que Cristiano Ronaldo, que já vai no seu 5.º Mundial, jamais igualará a menos que marque 8 golos nos restantes desafios de Portugal no Catar.

6. Sem capacidade de se aproximar de Miroslav Klose, o capitão da selecção portuguesa entendeu designar Eusébio como figura a ultrapassar na sua vitrina de prémios da boa vontade e da imaginação. Nunca o conseguirá.

7. Em primeiro lugar, porque não existe nenhum recorde de Eusébio. Em segundo lugar, porque jamais seria uma mancha na História de Eusébio que a maior máquina goleadora do futebol recente apresente um número decepcionante de golos apontados nos 5 Mundiais em que esteve presente. O resto são 'fake news', que é como hoje se designa a aldrabice."

Leonor Pinhão, in O Benfica

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