"Faltam só algumas horas para a última final. Vinte e dois profissionais, uma bola redonda e duas balizas do mesmo tamanho. Nada é garantido. Temo uma dramática demonstração da Lei de Murphy, um 'Maracanazo' à portuguesa, a inspiração do guarda-redes adversário, a arbitragem, o nervosismo. É terrível a angústia do adepto no momento da incerteza. Sabendo que irá dançar sobre as nuvens do paraíso, ou cair desamparado nos alçapões do inferno, não havendo terceira via por onde escapar. O futebol faz-nos passar por isto. Aperta o coração, brinca com as emoções divertindo-se sarcasticamente à custa do nosso sofrimento. Se os jogadores do Benfica entrassem em campo com metade desta terrível ansiedade, estaríamos perdidos. Mas confio naquela gente.
Se foram intérpretes da tantas sonatas, não iriam cair do palco agora que o pano já desce e a apoteose os espera. São fortes e não vão tremer. São campeões. Vão ser campeões. Faltam horas de agonia. E depois, noventa minutos de arrepiar. Uma vida em noventa minutos. Tinha razão o Shankly. Se calhar até a Florbela, quando escrevia:
'Minha alma de sonhar-te
anda perdida,
Meus olhos andam cegos
de te ver,
Não és sequer razão
do meu viver,
Pois que tu és já toda
a minha vida'
E a vida, essa vida, pode acaba ali. Ou não. Como numa roleta russa em que existe uma só bala para nos liquidar. Força, Benfica! Que tenhas mais força do que eu para viver as horas que faltam até nos voltarmos a encontrar em nossa casa. E lá, que Deus nos ajude a agarrar o que é nosso. Depois... depois não haverá amanhã que apague esta chama imensa.
Ai, chegaremos ao céu."
Luís Fialho, in O Benfica
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