"Muito se tem falado em Portugal sobre treinadores, particularmente dos portugueses que têm brilhado no país e no estrangeiro; desde o início do Séc. XXI, dentro de portas muito raros são os estrangeiros chamados a liderar equipas nacionais; e, no estrangeiro, muitos têm sido os portugueses a conquistar títulos em vários continentes, dando origem ao que se pode apelidar de "escola" de um futebol, ao mesmo tempo original, criativo e eficaz.
Nem sempre foi assim e muitos foram os obreiros que trilharam esse longo caminho desde meados do Séc. XX; seleccionámos aqueles oito que, em nosso entender, balizaram o percurso com modelos, reformas, estruturas, mentalidades e, naturalmente, êxitos: Otto Glória, Bella Gutman, Anselmo Fernandez, Carlos Queiroz, Artur Jorge, Scolari, Mourinho e Fernando Santos (3 estrangeiros e 5 portugueses), em que assinalámos os maiores destaques.
Otto Glória (brasileiro, 1917-1986). Foi, verdadeiramente, quem revolucionou o futebol em Portugal. Aterrou em Lisboa em 1954, foi treinador do Benfica até 1959 e depois entre 1968 e 1970, tendo ganho 4 Campeonatos e 3 Taças de Portugal; não só trouxe uma nova táctica (a "diagonal", 4x2x4), como inovou no treino, nas concentrações e nos estágios, e implantou uma disciplina rígida, que até proibia o Presidente de ir ao balneário... Treinou também o Belenenses (1959-61, 1 Taça), FC Porto (1963/65, finalista da Taça e 2 vezes vice-campeão) e o Sporting (1961/62, logo rendido por Juca, que foi campeão e 1965/66, campeão). No plano internacional foi treinador da selecção que conquistou o 3.º lugar no Mundial 1966 (seleccionador Manuel da Luz Afonso) e em 1982/83, na preparação do Europeu de 1984 (8 jogos).
Bella Gutman (húngaro, 1899-1981). Venceu tudo por onde passou, Holanda, Itália, Brasil, Uruguai, Hungria. Veio para treinar o FC Porto (campeão em 1958/59, com equipa experiente) e logo transitou para o Benfica, onde anteviu largo futuro, tendo sido bicampeão nacional (1959/60 e 1960/61) e levando, pela primeira vez, uma equipa portuguesa a um título europeu, duplo vencedor da Taça dos Campeões em 1960/61 (Berna) e 1961/62 (Amesterdão).
Anselmo Fernandez (1918-2000). Está incluído neste conjunto de grandes treinadores porque também foi um vencedor europeu. Arquitecto, treinou o Sporting na época 1963/64, rendendo o brasileiro Gentil Cardoso à 21.ª jornada (15 de Março) e após a derrota em Manchester para a Taça das Taças (1-4). No Campeonato pouco pôde fazer (1V- 2E-2D nas últimas 5 jornadas), confirmando o 3.º lugar. Mas na Europa conseguiu recuperar, derrotando o Manchester United na 2.ª mão (5-0 em Alvalade) e depois o Lyon nas meias finais; empatou com o MTK Budapeste na final (3-3) e venceu a Taça das Taças na finalíssima (1-0), com o célebre "cantinho do Morais". Ainda treinou na época 1964/65, durante escassos 2 meses (7 jogos), tendo rendido o francês Jean Luciano e sido rendido por Armando Ferreira.
Carlos Queiroz (1953). Criador de um modelo inovador, de base científica, que deixou um legado académico de grande prestígio e viria a traduzir-se na formação dos jogadores e treinadores portugueses, logo projectados para patamares até então inimaginados. Foi bicampeão mundial júnior (1989 e 1991); seleccionador nacional (1992) com projecto de estruturas, não concretizado porque adiantado no tempo e manifesta falta de apoio (falhou o Mundial 94); de novo seleccionador nacional (foi ao Mundial 2010), com êxitos relativos, mas conseguindo montar estruturas no futebol jovem, com treinadores que foram seus jogadores campeões mundiais e ainda perduram, em 2018, dos Sub-15 aos Sub-20: Filipe Ramos, Emílio Peixe, Rui Bento, Hélio Sousa (campeão europeu Sub-17 e Sub-19); também Paulo Sousa, no estrangeiro e Rui Jorge (que não foi daquelas selecções juniores, nos Sub-21). Treinou o Sporting (Taça de Portugal e Supertaça), foi adjunto de Alex Ferguson no Manchester United, treinador do Real Madrid e seleccionador de Portugal, Emirados Árabes Unidos, África do Sul e Irão.
Artur Jorge (1946). Um dos melhores pontas de lança portugueses, tirou o curso de treinador na ex-RDA e, após passagem por vários clubes, chegou ao FC Porto onde foi bicampeão (1984/85 e 1985/86), ganhou 1 Supertaça e a Taça dos Campeões Europeus (Viena, 1987). Treinou depois o PSG (Liga e Taça de França), de novo o FC Porto (1989-91 vencendo outro Campeonato, 1 Taça e 2 Supertaças), Benfica (1994/95) e, no estrangeiro, Espanha, Holanda, Arábia Saudita (campeão), França e Argélia. Foi também seleccionador de Portugal (1996-97, 12 jogos), Suíça e Camarões.
Luiz Filipe Scolari (dupla nacionalidade, Brasil/Itália, 1948). Foi campeão do Mundo pelo Brasil em 2002. Seleccionador português entre 2003 e 2008 (74 jogos), afastou alguns indiscutíveis do passado, investindo na motivação e na mística da bandeira. Foi 2.º classificado no Europeu de 2004 (final com a Grécia) e 4.º no Campeonato do Mundo de 2006 (derrotas com França e Alemanha). Treinou depois em Inglaterra (Chelsea), Uzbequistão, Brasil e China, voltando a ser seleccionador do Brasil no Mundial de 2014.
José Mourinho (1963). Intuitivo, controverso, inovador no treino, protagonista mediático, sempre à frente do seu tempo, marcou decisivamente o futebol do Séc. XXI; tornou-se o mais prestigiado treinador português e um dos maiores a nível mundial, deixando um rasto de admiração nos clubes, adeptos e jogadores com quem trabalhou. Em Portugal, depois do Benfica e União de Leiria, treinou o FC Porto, onde foi bicampeão e venceu uma Taça de Portugal, brilhando depois com a conquista da Taça UEFA (2002/03) e da Liga dos Campeões (2003/04). Foi depois campeão em Inglaterra (Chelsea), Itália (Inter) e Espanha (Real Madrid) e venceu outra Liga dos Campeões (Inter) e a Liga Europa (Manchester United).
Fernando Santos (1954). Começou a treinar o Estoril e o Estrela da Amadora, cujo 7.º lugar o levou ao FC Porto, onde concluiu o ciclo hegemónico de 5 campeonatos, tornando-se "o engenheiro do penta", além de 2 Taças e 2 Supertaças, em 3 épocas. Treinou depois na Grécia (AEK, Panathinaikos e PAOK) e pelo meio Sporting e Benfica, sem títulos. Pelo reconhecimento dos clubes, voltou à Grécia como seleccionador entre 2010 e 2014. Assumiu então a selecção nacional que conduziu até ao inédito título de Campeão Europeu (2016), a que se seguiu o 3.º lugar na Taça das Confederações (2017), a modesta participação no Mundial 2018 (oitavos de final) e a qualificação para a final four da Liga das Nações, a disputar em 2019.
Voltaremos a este tema."
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