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sexta-feira, 8 de maio de 2020

Dignidade europeia

"O objectivo máximo do Benfica tem de ser o de honrar os homens que fizeram do clube bicampeão europeu e disputar as competições da UEFA até Abril, pelo menos

O futebol parou e ninguém estava preparado para isto. Em quatro décadas que levo de dedicação ao jogo mais bonito alguma vez inventado, nunca tinha passado por tal paragem. A única pausa admissível no futebol é o defeso. Não estava preparado para este deserto. Nem eu, nem ninguém, porque o futebol sempre esteve acima de tudo e de todos entre Agosto e Julho. Nada pára o futebol. Guerras não param o futebol, tivemos um Liverpool - Boavista no mais famoso dia 11 de Setembro de sempre. Religião não pára o futebol, há o Boxing Day e jogos na Páscoa. Crises financeiras não param o futebol, o FMI esteve forte por cá e continuou a haver bola. Política não pára o futebol, o futebol é que faz o favor de desviar jogos em fins de semana de eleições.
Depois, a nível pessoal, o objectivo principal até chegar à idade adulta era conseguir a independência financeira e a compreensão familiar para dar prioridade total aqueles 90 minutos em que joga o Benfica. Objectivo conseguido e a vida flui de forma natural, o espaço compreendido entre o final de um jogo e o começo do próximo é para ser investido na responsabilidade profissional, cuidar da família e conviver com os amigos. Um carinho retribuído a todos os que não amuam por eu faltar a um adversário. Dia da Mãe ou do Pai, casamento ou baptizado, só porque não troco um jogo do Benfica por nada. É a lei da compensação na vida.
Serve esta introdução para contextualizar o verdadeiro sentimento de vazio dramático que se abateu sobre os adeptos de futebol por estes dias. Maldita Covid-19!
E agora? Podemos ser pessimistas e depremir ou aproveitar para parar, olhar para trás, para o presente a pensar no futuro. Nesse caso, o que pode ser o futuro imediato do Sport Lisboa e Benfica? Já temos bases interessantes. O clube respondeu à altura da sua grandeza e responsabilidade social, justificando o seu estatuto de utilidade pública. Direcção, técnicos, jogadores, Fundação e Casas, todos ajudaram de forma responsável e significativa no combate à pandemia.
A seu tempo,ouvimos várias figuras de peso no clube a mostrar os vários caminhos possíveis e os objectivos a atingir. Domingos Almeida Lima aceitou com classe o final abrupto das competições das cinco modalidades de pavilhão. Sem truques e sem excepções, mesmo naquelas que o Benfica ia bem lançado para vencer. Tudo vai mudar e no plano das modalidades espero que o Benfica continue e ser ecléctico, competitivo, mas que aproveite a oportunidade para se afastar de orçamentos surreais e sem retorno. A aposta na formação é o caminho. Um caminho que Domingos Soares de Oliveira também fez questão de reforçar na sua intervenção na BTV. Vamos ter novos desafios, por isso espero que o Benfica continue a encurtar a lista inexplicavelmente gigante de jogadores emprestados, por exemplo. Comprar jogadores que nunca chegam a vestir a camisola do clube tem de ser algo para ficar no pré-Covid-19. Por outro lado, gostava que o investimento previsto para melhorar o Estádio da Luz não fique adiado por muito tempo. Domingos Soares de Oliveira falou na aquisição de novos écrans para substituir os obsoletos 'marcadores electrónicos' da Luz e ainda uma actualização na iluminação do estádio com uma solução mais económica e amiga do ambiente
Tiago Pinto foi muito claro quanto ao objectivo imediato de terminar a Liga e decidir tudo dentro de campo. Todos os desenvolvimentos que conhecemos até aqui deram razão ao caminho traçado pelo director-geral do Benfica. Mesmo sem público, e eu não falho um jogo na Luz para o campeonato há décadas, assumo que é a melhor opção. Por muito que me custe.
Mas o grande mote para o futuro foi dado por Rui Costa de uma forma inesperada. No rescaldo de um excelente documentário de Ricardo Soares na Benfica TV sobre o título europeu ganho ao Real Madrid, Rui Costa identificou exactamente aquela que eu acho que tem de ser a prioridade do Benfica nos próximos anos: voltar a ser digno na Europa. Tem de ser este o objectivo máximo do Benfica, honrar os homens que fizeram do clube bicampeão europeu e andar nas competições europeias até Abril, pelo menos.
Neste tempo de reflexão vi na BTV velhas glórias a recordarem golos e jogos que os marcaram, muitos iam dar a noites europeias. Peças que valem ouro, feitas em condições difíceis e que muito valorizaram o canal do clube. Recordei o passado com ex-jogadores, e não só, no brilhante projecto, Benfica Independente no YouTube, imaginado pelo enorme Sérgio Engrácia, e todos iam parar às noites europeias. Temos de assumir este desígnio no futuro breve.
Finalmente, espero que o presidente do Benfica aproveite o balanço da FPF, que tomou conta, literalmente do futebol português, para ajudar a melhorar as competições. As prioridades são a remodelação da Taça da Liga. Acabar com o ridículo formato actual, promover um apurado para as provas da UEFA ou, até, acabar com a competição. Ajudar a melhorar a Taça de Portugal, acabar com as repescagens e meias-finais a duas mãos, os clubes profissionais podem entrar em cena mais cedo, por exemplo. Convencer a Liga Portugal e descer três clubes na 1.ª e 2.ª Ligas. Seria essencial para aumentar o nível de competitividade e não termos clubes e passear na parte final da época sem objectivos nos lugares seguros entre a descida e a zona europeia.
Por fim, é essencial que o Benfica continue a defender os interesses dos seus associados e recuse essa ideia macabra de um cartão de adepto que é a única bandeira de um sinistro secretário de Estado de Juventude e Desporto. Bem, a única não, a outra era jogos à porta fechada, essa vontade foi feita pelo vírus.
Antes desta pandemia, o rumo do Benfica estava traçado e era bem conhecido. Aposta na formação do Seixal e equilibrar a equipa principal com investimentos certeiros no mercado. É verdade que não estamos a imaginar uma compra no valor de 20M€ num futuro imediato. Mas também não deixa de ser verdade que um Weigl no pós-Covid-19 vai ter de valer bem menos. É nesta lógica que o Benfica tem de se posicionar porque vai continuar a ter um poder de compra superior aos rivais e até pode ser uma oportunidade para se aproximar de alvos que estavam absurdamente inflacionados.
Demasiado optimista? Prefiro ver este caminho. Quero acreditar que teremos sempre o futebol. E, especialmente, o Benfica."

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