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segunda-feira, 1 de abril de 2019

Do respeito. E, também, da falta dele

"É difícil respeitar quem não se dá ao respeito. Gente que não se importa de ser peão em jogos para os quais não tem capacidade intelectual

Tenho por Rui Pinto o respeito que sempre terei pelas pessoas que revelam a coragem de enfrentar forças muito superiores a elas. Correu o mais famoso hacker português, não tenhamos disso dúvidas, enormes riscos ao assumir - ou, pelo menos, dar por isso a cara, perceberemos, talvez, mais à frente... - uma guerra que podia perfeitamente não ter comprado, de certeza ciente (ele mais do que ninguém) de que não há, hoje, segredo que esteja 100 por cento seguro e que, por via disso, a sua identidade haveria, mais tarde ou mais cedo, por ser revelada. E que sofreria as represálias de quem nunca lhe perdoará a forma como denunciou esquemas que deveriam (no entender de quem os praticou, perceba-se..) ter ficado na obscuridade.
Recuso-me, ainda assim,a colar a Rui Pinto a imagem de Robin dos Bosques que muitos lhe pretendem associar. Em especial porque existe, ainda, muita coisa por esclarecer pela Justiça e só depois disso poderemos tirar conclusões efectivas sobre as motivações do jovem pirata informático, que convém recordar aos mais esquecidos, não está apenas acusado de acesso ilegítimo ou violação de segredo, crimes para muitos desculpáveis - numa teoria que, admito, até percebo - pelos muitos esquemas (uns já assumidamente criminosos outros que, se não são, assim parecem) que com isso ajudou a denunciar. Está, também, acusado de extorsão, que a provar-se faria cair por terra a ideia de tratar-se Rui Pinto de alguém que fez o que fez a pensar apenas no bem comum. Ou no interesse dos mais pobres. O melhor parece-me, portanto, esperar e só depois decidir se Rui Pinto será visto como herói ou vilão. Ou, até, algo entre uma coisa e a outra.
Mas tenho, neste caso, certeza de uma coisa: não podem as autoridades centrar-se apenas no mensageiro. Seria - além de inexplicável - um desperdício não aproveitar aquilo que Rui Pinto divulgou, ou ajudou a divulgar, para fazer uma cada vez mais necessária limpeza num mundo que sempre se achou acima das leis. Não está, tal como acima delas não está Rui Pinto. E se todo este episódio ajudar a tornar o futebol mais transparente, então o hacker luso terá, mesmo que por isso tenha de pagar criminalmente, prestado um enorme serviço à sociedade. E sim, seja qual for o desfecho das acusações a Rui Pinto, não me choca nada que peçam as autoridades a sua colaboração, aproveitando as suas aparentemente extraordinárias capacidades informáticas para combater actos ilícitos. Não era a primeira vez que aconteceria e não seria, certamente, a última.

Não tenho absolutamente respeito algum pelas duas figurinhas que esta semana nos fizeram perceber que o futebol português é, verdadeiramente, um poço sem fundo: quando nos parece que não pode descer mais baixo, há sempre alguém a mostrar-nos que não há, afinal, limites quando a ideia é mostrar o lado mais podre do mundo da bola. É triste perceber o mediatismo que assumem, não só por culpa de quem deveria perceber que não são ninguém, mas também de gente que, com responsabilidades, deles apenas deveria querer distância. Dizem saber todos os podres do futebol, reais ou fictícios, e e normal que saibam, de facto, alguns, porque o futebol português está mergulhado num lamaçal de podridão de que figurinhas destas precisam para sobreviver, social e, até, financeiramente.
Mas mais tristes ainda são, mesmo, as figuras que estão dispostos a fazer em nome não se entende bem do quê. Não percebem que não passam de peões num jogo de xadrez que não têm capacidade intelectual para jogar. E não é preciso ser nenhum Kasparov para saber que os peões são, sempre, os primeiros a ser sacrificados e nunca, mas nunca, poderão transformar-se em torres, cavalos ou bispos. São, e serão sempre, dispensáveis quando deixam de ser úteis. E saem do jogo sem que ninguém se lembre - ou tenha pena - deles.

É difícil ter respeito por quem não se dá ao respeito. O que os clubes estão a fazer na rábula da integração do Gil Vicente na Liga é inqualifivável. Já é maus saber que há um grupo a tentar alterar as regras que os próprios aprovaram há quase dois anos quando faltam menos de dois meses de acabar a época só porque podem, agora, ser despromovidos. Pior ainda é ouvir um presidente vir no final de uma reunião do chamado G15, dizer que os clubes precisam de ser esclarecidos sobre a norma que aprovaram. É incrível, não é? Perceber que nas Assembleias Gerais da Liga os clubes aprovam regulamentos que não sabem o que significam daria vontade de rir, não se tratasse de uma coisa demasiado séria para brincar.
Haver clubes que, perante o abismo da descida, recorram a todos os meios para evitar lá cair até se percebe. O que não se entende mesmo é haver outros que, absolutamente confortáveis, embarquem nesta loucura. Ou, se calhar, até se percebe. Porque aquilo que motiva este inesperado movimento, talvez não na sua origem mas no aproveitamento que deste caso está a fazer, será afinal mais profundo do que o que está à vista. E perceber-se-á em breve. É, como quase tudo no futebol português, um jogo de poder. E é também por isso que é cada vez mais difícil andar para a frente. Por causa disso e da falta de vergonha que por cá continua a cultivar-se como se fosse uma virtude.

Inqualificável é também que alguém que, pelas responsabilidades que tem, teríamos como minimamente inteligente, utilize as redes sociais para ter conversas (como lhe chamaria alguém sempre que a discussão aquece) de tasca. É verdadeiramente incrível aquilo em que a clubite transforma as pessoas."

Ricardo Quaresma, in A Bola

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