"O Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) nasceu com imensos anticorpos. Políticos, corporativos e desportivos.
Os primeiros traduzidos na votação da sua criação na Assembleia da República.
Os segundos através do escrutínio do Tribunal Constitucional que culminou na lei do TAD e dos diversos corpos das magistraturas e outros agentes do universo judicial que pura e simplesmente convivem mal com a sua existência.
Os terceiros no pouco entusiamo que manifestaram com a sua criação designadamente as entidades desportivas que tinham ouras fontes de regulação da justiça desportiva.
Mas tratando-se de uma entidade criada por uma lei da República cumpri-la é uma obrigação de todas as entidades públicas, sem prejuízo, nos espaços próprios, de exercer um escrutínio crítico sobre o seu funcionamento e procurar melhorias face aos constrangimentos unanimemente reconhecidos.
Ao Comité Olímpico de Portugal (COP) foram atribuídas responsabilidades de instalação e funcionamento que procurámos cumprir da forma que entendemos adequada e cujos resultados foram reconhecidos como positivos, no sentido de dignificar uma entidade crucial para valorizar e qualificar a justiça desportiva no nosso país.
Dos membros que constituem os diferentes órgãos do TAD espera-se naturalmente que tudo façam para prestigiar o Tribunal.
O mesmo se espera dos que desejam ser árbitros do TAD, indicados por várias entidades e sujeitos a uma seleção.
Seria pouco compreensível, que uns e outros, não estivessem na primeira linha de promoção do prestígio do TAD e ao invés apoucassem as suas decisões ou desvalorizassem o seu trabalho.
Ao longo dos anos da sua existência a qualidade do produto da sua atividade jurisdicional é relevante e não fica atrás das decisões dos tribunais do Estado ou de outros centros de arbitragem institucionalizados.
Mas tudo correu bem? Não. O acesso ao TAD não é difícil para algumas entidades desportivas? É. Não houve decisões polémicas? Seguramente que sim. Não houve decisões recorríveis e atendíveis? É óbvio que houve. Mas o mesmo ocorre nos tribunais do Estado. São consequências normais em qualquer instância de administração da justiça.
A importância e essencialidade do TAD sempre nos mereceram uma constante análise crítica à sua configuração e ao seu modo de acesso e funcionamento. Por esse motivo, não deixámos de apresentar propostas com vista à defesa intransigente de uma melhor e mais equitativa justiça desportiva no universo nacional.
Por outro lado, sempre entendemos que o insucesso do TAD seria muito penoso para o sistema desportivo atendendo ao histórico da sua criação. Mas compreendemos perfeitamente que outras lógicas conflituam com este nosso entendimento.
E que, no limite, haja quem defenda outras soluções perante o bem maior que é a justiça, e o desporto um mero apêndice da sua aplicação. Contudo, o valor da justiça deve ser adaptado às circunstâncias do desporto, como outras áreas também reconduzidas à arbitragem, por se considerar a melhor solução para combinar justiça com a especialização para certo tipo de procedimentos.
A vida democrática, de que a justiça é um seu regulador, faz-se com pessoas e instituições que transportam percursos e vivências e nem tudo é, como gostaríamos, ideal.
A jurisdição desportiva sob auspícios do TAD é uma realidade que levou o seu tempo a construir, que não é perfeita e que cabe a cada elemento que a compõe e ao universo desportivo melhorar e proteger. A desqualificação ou desvalorização do TAD é muito negativa para o sistema desportivo.
Esperar que o TAD, em tão curto espaço de tempo, cumprisse exemplarmente os objetivos da sua criação-especialização e celeridade- seria ignorar que nenhuma instância de justiça prescinde de maturidade organizacional que só tempo e o seu aperfeiçoamento constante melhor podem assegurar.
Ignorar que o TAD possa coabitar com outras instâncias de administração da justiça, sem conflitos, isento de tensões e disputas de autoridade é imaginar um mundo ideal que não existe.
Melhorar o funcionamento do TAD com certeza, desejando que a própria instituição se proteja, salvaguarde a necessária reputação e paute a sua intervenção por estritos critérios de qualidade, elevação jurídica e prestígio institucional é um imperativo imprescindível.
Neste contexto a realização do Congresso de Justiça Desportiva é um momento excecional para proceder ao balanço do caminho percorrido e acolher, através da participação de distintos especialistas, as reflexões indispensáveis a uma justiça desportiva que corresponda às expectativas de regulação de um sistema, o desportivo, cada vez mais exigente, mais complexo e socialmente mais escrutinado."
José Manuel Constantino, in Tribuna Expresso
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