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sexta-feira, 11 de setembro de 2020

O peixe, ou a pesca?


"A pesca, dirão os que acreditam na humanidade e no valor do trabalho. O peixe, reponderão os que acreditam na humanidade e no valor da dádiva. Ambos, talvez, em tempos diferentes conforme a urgência e a justeza das situações, dirão ainda outros, aqueles que acreditam que no meio é o lugar da virtude e que o mundo não é a preto e branco, mas um mosaico de nuances.
Certo é que o humanismo dos laicos, como a fé dos crentes, impele os mais informados de nós à acção de reparação de danos e injustiças que vemos acontecerem aos outros. O termo caridade, por estes dias celebrado nas Nações Unidas, não é consensual na sua tradução portuguesa, e há até quem tenda a reduzi-lo à mendicidade e cedência fácil da esmola que nada transforma e aprisiona o esmolado perpetuando a sua dependência num círculo vicioso. No mínimo há quem considere o assunto anacrónico, e o termo velho e ultrapassado.
Pode até ser verdade, pelo menos nalguns casos, mas nada seria mais injusto do que simplificar a questão a esse ponto e achar que assim, num ápice, se resumiu e resolveu o entendimento da pobreza. É claro que há muito mais em jogo. Como é também claro que nesse jogo todos participamos, quer queiramos, quer não, como árbitro, público e jogador, as mais das vezes um pouco em todas essas dimensões.
Por isso, se hoje damos destaque a esta causa humanitária da caridade, é porque o nosso querido Benfica, velhinho de mais de cem anos, há muito que pensa nisto. Mas não se limitou, nunca a pensar, engajando-se, pelo contrário, na acção. Empenhando-se em fazer tudo ao seu alcance para combater as desigualdades e a pobreza como mãe de todas as injustiças. Primeiro actuando pelo peixe, no exercício da caridade e da filantropia mais imediata e casuística, cheio de coração e mística a dizer 'presente' e 'aqui está'. Mais tarde, depois de viver toda a aprendizagem de um século XX em que a humanidade levou aos extremos o melhor, mas também o pior de si, o Benfica passou a estender a mão e a dizer 'vamos'. Encontrou-se com a sua dimensão gigantesca e disse para si mesmo que não poderia eximir-se à sua responsabilidade com o planeta e com a humanidade, no universo da língua portuguesa e não só. Dito e feito, em menos de uma década teve a ideia, criou e fez crescer a Fundação, voltando-a para o desenvolvimento humano como missão principal e para as missões humanitárias sempre que a urgência social a tal obrigue, enquanto condição inicial de reposição da dignidade humana para empreender os caminhos do desenvolvimento e da transformação social.
É por aqui que vamos na Fundação Benfica: peixe quando nada mais há a fazer, pesca como dignificação do ser humano, autonomia e liberdade para que cada pessoa conduza o seu próprio destino!"

Jorge Miranda, in O Benfica

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