"Tem se escrito muito sobre um eventual pacto nas modalidades entre Benfica-Sporting e Sporting-FC Porto. Algo que para muitos adeptos do Benfica tem parecido uma decisão “mansa” do Benfica. No entanto, na minha opinião, esta decisão pode fazer sentido. Vou tentar analisá-la ao pormenor aqui.
No passado recente (últimos cinco anos), que atletas foram “roubados” entre estes clubes?
a) Benfica - Sporting. O Benfica foi buscar Célio Coque, Afonso Jesus, André Sousa e Miguel Ângelo ao Sporting em Futsal e o Daniel Neves no Andebol. O Sporting contratou Gonçalo Nunes no Hóquei, Carlos Carneiro e Cláudio Pedroso no Andebol e Cláudio Fonseca no Basquetebol. Além destes atletas nas modalidades colectivas, houve uma série de trocas nas modalidades individuais. Os mais célebres foram no Atletismo, onde o Sporting contratou Nélson Évora, Hélio Gomes, Rasul Dabo, Tiago Aperta, Marcos Caldeira e Jorge Paula. Mas houve muitos mais. O Sporting também praticamente acabou com a equipa feminina de Atletismo e com a equipa masculina de Judo do Benfica, e ainda contratou nosso melhor jogador de Ténis de Mesa - o Diogo Carvalho, o que acabou por levar à despromoção do Benfica para a 2º Divisão da Modalidade. Já o Benfica foi buscar recentemente o Anri Egutidze do Judo e também contratou vários atletas de Atletismo ao Sporting, o mais popular foi o antigo medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Atenas 2004, Rui Silva. Aliás, segundo consta até foi a mudança de Rui Silva que gerou isto tudo. O Benfica foi ainda contratar o peruano André Carrillo ao Sporting, mas no futebol.
b) Sporting - FC Porto. Telmo Pinto, Vítor Hugo e Alvarinho no Hóquei, Pedro Spínola no Andebol e o Diogo Araújo no Basquetebol saíram do FC Porto para o Sporting. Já o FC Porto foi buscar Rui Silva no Andebol.
c) Apesar de não ser parte do pacto, pelo menos até agora, fiz também o levantamento das trocas Benfica - FC Porto. O Benfica foi buscar José Silva no Basquetebol. O Porto contratou João Soares no Basquetebol (que pelo meio esteve emprestado um mês a uma equipa da 3º Divisão Espanhola), António Areia no Andebol (que o Porto acabou por ter que indemnizar o Benfica, visto que ainda tinha contrato com o Benfica) e Hugo Santos no Hóquei.
Há mais jogadores com passados em mais do que um clube, mas nunca foram directamente de um lado para o outro. O Roberto Reis no Voleibol por exemplo esteve um ano no Espinho antes de ir para o Sporting. O Gonçalo Alves no Hóquei depois de sair do Sporting passou três anos na Oliveirense antes de rumar ao Porto. São dois bons exemplos. E claro, houve mais trocas no passado. Por exemplo Gonçalo Alves, Bebé e Davi no Futsal saíram todos do Sporting para o Benfica, mas há mais de 10 anos atrás.
Se olharmos para os nomes que falei, a verdade é que não houve assim tantas mudanças que tenham feito muita diferença. O Sporting e o Porto conseguiram tirar duas das melhores promessas do Benfica no Hóquei, mas nem Gonçalo Nunes, nem o Hugo Santos renderam grande coisa nos seus novos clubes para já. O Nélson Èvora não acrescentou nada ao Sporting e até fez com que o Benfica tivesse que se inovar acabando por contratar o Pedro Pichardo. Os jovens todos que o Benfica foi buscar ao Sporting no Futsal também não têm acrescentado nada ao Benfica. As mudanças mais significativas a nível desportivo acabaram por ser Rui Silva e António Areia no Andebol para o Porto e o Diogo Carvalho no Ténis de Mesa para o Sporting.
Apesar de não terem existido assim tantas movimentações, os clubes subiram imensos os seus orçamentos nas modalidades na segunda metade da década 2010-2020. No caso do Sporting temos os valores oficiais graças à auditoria que foi feita às contas da Direcção de Bruno de Carvalho. O relatório é público e é fácil de encontrar na internet. O Sporting passou a gastar 176 mil euros no Carlos Ruesga no Andebol, 186 mil euros no Dieguinho no Futsal, 116 mil euros no Nélson Évora e 153 mil euros no Pedro Gil no Hóquei, quando três anos antes, os atletas mais bem pagos nestas modalidades eram Pedro Solha (Andebol, 58 mil euros), Alex Martins (Futsal, 77 mil euros). Rui Silva (Atletismo, 33 mil euros) e ngelo Girão (Hóquei, 73 mil). Além destes atletas, todos os outros foram bem aumentados. O salário médio no Sporting em Futsal subiu 69% em três anos, 116% no Andebol e 124% no Hóquei. Só que isto não aconteceu só no Sporting. Aconteceu também no Benfica.
O Sporting conseguiu levar o Nélson Évora, mas não se ficou por aí. Tentou levar outros jogadores, como o André Coelho no Futsal, o Carlos Nicolia no Hóquei, a Telma Monteiro no Judo e certamente que outros atletas foram abordados. Estes foram as propostas mais “populares”. Nesta situação, a única maneira que o Benfica teve para segurar os seus melhores, foi aumentá-los e oferecer uma proposta equivalente aquela que o Sporting oferecia. O Benfica passou de gastar 4.6 milhões de euros em gastos com pessoal das modalidades em 2016-2017 (com mais duas modalidades do que o Sporting, Voleibol e Basquetebol) para gastar quase 8 milhões de euros em 2018-2019. O prejuízo das modalidades do Benfica passou de 5.8 milhões de euros em 2016-2017 para 12.1 milhões de euros em 2018-2019 - atenção à palavra prejuízo.
Havendo pacto, o Sporting não irá abordar jogadores do Benfica e o Benfica não irá abordar jogadores do Sporting. Vai haver maior disputa entre os clubes por atletas a nível nacional antes de eles assinarem pelos clubes, mas a partir daí, se o atleta quiser receber mais, terá que ir para o estrangeiro ou para uma Oliveirense ou Fonte de Bastardo ou Modicus, que tradicionalmente não têm as mesmas capacidades que qualquer um dos grandes tem. Os clubes com o passar do tempo vão começar a baixar os seus orçamentos e eventualmente até poderão contratar estrangeiros melhores, mantendo a mesma base da equipa, gastando menos dinheiro. O pacto será positivo para aquele clube que souber melhor identificar talento e captá-lo.
Mas lá está, o impacto deste pacto só será visível daqui por algumas épocas. Os contratos não vão começar a baixar da noite para o dia. No entanto, para já, parece ser algo que poderá beneficiar-nos mais.
Este pacto não é uma decisão desportiva. É uma decisão financeira."
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