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quarta-feira, 1 de março de 2017

O futebol feminino em Portugal: pequenas e gigantes

"A expressão do futebol feminino, em termos globais, encontra-se a viver uma etapa de franca expansão.
O último relatório produzido pela UEFA, acerca das 55 federações-membro, aponta uma grande evolução, em indicadores tão distintos como:
* Nº de jogadoras registadas (mais de 1,27 milhões, mais 6% que 2015/16)
* Nº de jogadoras profissionais e semi-profissionais (mais 119% de 2012/13 para 2015/16)
* Nº de árbitras (mais 17% que 2015/16) e treinadoras (mais 31% que 2015/2016) credenciadas
* Nº de selecções
* Budget atribuído ao desenvolvimento da modalidade (duplicou desde 2012)
* Cobertura por parte dos media e presença nas redes sociais
Naturalmente que, havendo cada vez mais top players, ou seja, atletas que por mérito próprio e, por vezes, com pouca ou nenhuma ajuda externa, começam a ter visibilidade e a conquistar o respeito público, o fenómeno de seguimento de “massas” começa a ser uma consequência natural e inevitável, traduzindo-se num acréscimo de praticantes a entrar na modalidade, especialmente nas camadas mais jovens (a saber, o referido relatório evidencia um crescimento de 73% no que toca às camadas jovens, com mais de 34 mil novas equipas registadas).
Este tem sido o trajecto das grandes potências da Europa (Alemanha, França, Inglaterra, Suécia e Noruega), todas com mais de 100.000 praticantes actualmente.
Este fenómeno, em contexto internacional, não tem passado despercebido dos grandes media, cada vez mais conscientes dos “dados” associados a grandes eventos, como foi o caso do último Campeonato do Mundo (Canadá, 2015), onde o retorno financeiro do evento disparou uns “simpáticos” 92%, com mais de 3,52 milhões de pessoas a assistir, directa ou indirectamente. 
PORTUGAL, país com tão longa história e tradição associada ao futebol, a par de Azerbeijão e Bósnia, teve um espantoso crescimento acima dos 300%, muito à custa de atletas, treinadores e dirigentes, muitas vezes quase anónimos que, por paixão, não desistiram da modalidade, impulsionando-a para o patamar em que se encontra hoje.
Por cá, e desde que a nossa selecção conseguiu um histórico apuramento para o Campeonato da Europa, que decorrerá em Junho na Holanda, esta modalidade tem suscitado cada vez mais a curiosidade do grande público, ganhando um importante contributo ao ver um dos grandes clubes de Portugal abrir o seu “palco principal” a jogos da sua equipa sénior, bem como a disponibilidade de um canal por cabo em se associar à divulgação da modalidade.
A confluência de todos este factores permitiu alcançar, no passado sábado, recordes históricos de audiência, mesmo quando comparamos com a realidade internacional:
a um jogo de uma modalidade dita “pequena”, correspondeu um gigante apoio do público, tendo estado presentes a assistir ao Sporting 1-0 Sporting de Braga no estádio José de Alvalade mais de 9.200 espectadores e, em casa, uma audiência média de 102.000 pessoas (e 213.000, no momento decisivo do jogo - dados FPF).
Poderá o futebol feminino estar a ganhar a sua quota parte de adeptos? Esperemos que esperemos que sim.
Bem se sabe que as questões de género no desporto (e também na esmagadora maioria de outros contextos de realização) são desde há muito motivo de grande polémica em virtude da diferença que existe entre o que é pago a homens e mulheres. Muitas são as atletas que dão rosto a este tema de "discriminação", como é o caso de Serena Williams, no ténis.
No entanto, se o argumento do "valor gerado" à volta da modalidade praticada por homens ou mulheres foi durante muito tempo uma espécie de "névoa" que foi fazendo a larga maioria acreditar que seria uma justificação válida, o caso paradigmático da selecção nacional dos USA, onde as atletas geram aproximadamente mais 20 milhões de dólares e têm melhor performance que a sua congénere masculina, recebendo, ainda assim, apenas 25% do que estes últimos, deitou por terra esta argumentação e terminou com uma queixa entregue em tribunal, por razões de discriminação.
De um ponto de vista muito abstracto, julgo que poderíamos hipotetizar que os "desportos de minorias" (sejam eles quais forem), acabam por ver os apoios substancialmente reduzidos por uma razão de... falta de "empatia".
De facto, é do conhecimento geral que algumas marcas, entre outros critérios, se associam a uma dada modalidade porque há "alguém" (com poder de decisão) que, de forma directa (porque foi ou é praticante...) ou indirecta (um filho praticante, por exemplo), acaba por se tornar simpatizante dessa mesma modalidade.
Em simultâneo, e aqui no caso do desporto no feminino, o facto da expressão de mulheres em posições de topo em empresas (logo, com poder de decisão) e todo o tipo de organizações, ser francamente diminuto, apesar da sua performance académica ser substancialmente superior (tema este, sobejamente discutido na "Grande Conferência Liderança Feminina", organizada pela Executiva, em Novembro de 2016), em nada beneficia a "vontade" das empresas apostarem genuinamente, neste tipo de desporto.
Em um ou outro caso, o fenómeno afectivo subjacente parece ser o mesmo: empatia ou falta dela (curiosamente, e no caso dos estudos que tem sido conduzidos na área da "liderança no feminino", aparentemente os homens que mais apoiam a causa... têm quase sempre filhas - e não filhos - novamente, empatia).
Há, contudo, uma mensagem inequívoca passada este sábado:
num "pequeno" país, um conjunto de atletas (e suas equipas técnicas, dirigentes e familiares que apoiam a sua escolha), de uma "modalidade pequena" (com pouco mais de 7.000 jogadoras), recebeu um declarado e gigante apoio de mais de 9.000 adeptos (quase 8 vezes mais do que a média das grandes potências, com mais de 100.000 jogadoras inscritas) que se deslocaram ao estádio e, em média de mais de 100.000 pessoas que escolheram ficar em casa a ver o jogo...
Um público (um país) que, desta forma, e se bem direccionado, tem todas as condições para ser o suporte motivacional que poderá alavancar uma cada vez maior vontade de superação das atletas da nossa selecção, no próximo Campeonato da Europa.
Em suma, e por todas estas razões, deixo aqui o voto de que o tecido empresarial português responda a este movimento, com uma espécie de "empatite aguda", no sentido de suportar esta e outras modalidades que, não beneficiando de visibilidade, tardam em ter a sua oportunidade, aguardando que um olhar mais atento (e empático) possa sustentar o seu crescimento consolidado.
Portugal tem já "história" de "decisões históricas" (como foi o caso da abolição da escravatura), na defesa dos direitos humanos, quando comparado com os restantes países... essa é também a sua "imagem de marca"... e, agora, tem novamente uma oportunidade uma oportunidade para também aqui se destacar.
Resta agora, observar quando é que o segmento empresarial (à semelhança do que aconteceu nos países nórdicos, onde o andebol feminino foi resgatado por este de uma quase extinção... até ao título olímpico!) passa a ter, também ele (e de forma massiva, uma vez que há já evidencia de empresas que agarraram esta causa), a "imagem de marca" de quem cria as condições para o sucesso, ao invés de "jogar pelo seguro" e associar-se ao sucesso já estabelecido (quando se associam apenas depois do resultado desportivo acontecer).
Fica o desafio."

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