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quinta-feira, 11 de julho de 2013

Chamar-lhe-ia mesmo prosápia

"Este ano o Benfica irá a Alvalade sem Cardozo, que se fartou de marcar golos ao Sporting. Um 'derby' à terceira jornada serve para se saber qual entra primeiro em crise.

NÃO sei se já se deram conta de que o optimismo dos nossos amigos portistas - e quem não tem amigos do FC Porto? - para a temporada de 2012/2014 está a bater todas as escalas possíveis e imaginárias. Chamar-lhe-ia mesmo prosápia, sem querer ofender ninguém.
Estamos a um mês do arranque da época oficial e há já dois dados adquiridos: o FC Porto voltará a ser campeão, o Benfica voltará a fazer papel de cabeçudo no fecho da prova no Dragão e, melho ainda, do ponto de vista portista, o FC Porto somará a sua terceira Liga dos Campeões no tapete verde do Estádio da Luz.
Lucho Gonzalez, o habitualmente comedido capitão do FC Porto, não se põe à margem deste entusiasmo galopante. «Seria lindo jogar a final da Champions na Luz», disse no início desta semana fazendo coro com as certificadas previsões dos adeptos.
Será assim que tudo vai acontecer?
O sorteio do campeonato oferece, uma vez mais, aquele pratinho especial de um encontro entre os candidatos ao título à beirinha do fim do campeonato. É por causa do sorteio condicionado, dizem os técnicos especializados em sorteios. Na verdade, em termos práticos, tanto faz jogar no princípio, no meio ou no fim. O campeonato é uma prova de regularidade, o importante é ser-se regular. Depois, logo se verá.
O Benfica tem um arranque de campeonato difícil que poderá tornar fácil se ganhar os jogos que a sorte lhe destinou: arranque na Madeira frente ao Marítimo para, à terceira jornada, ir até Alvalade defrontar o rival de sempre.
Jogar no campo do Sporting é sempre uma tarefa de monta. Este ano, tudo assim o indica, o Benfica irá a Alvalade já sem Óscar Cardozo que, enquanto foi jogador do Benfica, se fartou de marcar golos ao Sporting.
Um derby à terceira jornada serve para muita coisa. Por exemplo, para se saber qual dos emblemas entra primeiro em crise.
Do ponto de vista do Sporting, aguarda-se a resposta mais emocional dos adeptos ao populismo bem-disposto de Bruno de Carvalho quando o jovem presidente se vir, pela primeira vez , colocado perante aquela coisa da bola a rolar.
Do ponto de vista do Benfica, os primeiros jogos da prova servirão, para o bem ou para o mal, como teste à popularidade e, sobretudo, à autoridade de Jorge Jesus que parte naturalmente fragilizado pelo cúmulo de infelicidades que lhe custaram tudo nas últimas três semanas da última temporada.
Do ponto de vista do FC Porto, não já crise que lhe chegue. Campeonato, cabeçudos e Liga dos Campeões, já está feito.

VEM  aí o comboio do Benfica. A iniciativa foi revelada no último Congresso das Casas do Benfica. Trata-se de assegurar aos adeptos transporte ferroviário regular para que o maior número possível possa acompanhar a equipa de futebol nas suas deslocações pelo país. É uma boa ideia, sem dúvida.
Por falar em transportes, ainda bem recentemente o jornal I publicou uma curiosa notícia sobre uma das maiores empresas de camionagem do Estádio de São Paulo, no Brasil, que se chama precisamente e tão-só Benfica. Foi fundada nos anos 50 por três irmãos de Alvarelhos, concelho de Carregal do Sal, que emigraram para o outro lado do Atlântico à procura de melhor vida.
Eram do Benfica, naturalmente. A empresa mantém-se nas mãos da família e são hoje os netos quem trata do negócio, que é um bom negócio. Assumem-se como campeões do conforto e o volume do seu tráfego aponta para uma presença imponente nas estradas brasileiras. O jornalista do I que conversou com um dos administradores dos transportes Benfica perguntou-lhe se a frota dava muitos problemas. A resposta foi surpreendente... «Olha, há uns anos a equipa de juniores do FC Porto veio cá a São Paulo para jogar num torneio e recusaram-se a entrar quando viram o autocarro do Benfica à espera deles no aeroporto», disse o herdeiro dos irmãos de Alvarelhos.
Estrutura, meus amigos, estrutura...
A notícia termina com dados logísticos sobre as camionetas Benfica. E impressionam: uma frota de mais de 1500 veículos e cerca de 3500 empregados.
É muita gente. Pode ser que nestes 3500 exista um lateral-esquerdo.

SAIU um livro do Oriental. Na verdade, não é bem um livro. É um álbum profusamente ilustrado com fotografias e recortes de notícias de jornais, um volume de dimensão considerável com uma belíssima capa grená que sustenta o emblema do clube e ainda o título da obra em letras brancas: Clube Oriental de Lisboa, História do Nosso Clube.
O Oriental, em si, também é obra. E das grandes. Nasceu na noite magnífica de 8 de Agosto de 1946 da fusão de três clubes vizinhos da zona oriental da capital, o Chelas, o Marvilense e Os Fósforos, que decidiram congregar-se tendo em vista um poderio maior e, consequentemente, um futuro melhor.
Conseguiram-no, sem qualquer espécie de dúvida. Quatro meses depois da fusão, o novinho em folha Clube Oriental de Lisboa, C.O.L. para os fãs entre os quais me incluo, foi ao Campo do Lima vencer o FC Porto por 6-1 num jogo amigável e três anos mais tarde já o C.O.L. conquistava o acesso à divisão principal ombreando com os grandes, como se costuma dizer com toda a beleza e propriedade.
Muito à frente no seu tempo, o oriental foi a primeira equipa de futebol a usar números nas costas das camisolas, uma novidade arrebatadora à época como se constata pelo comentário de Cândido de Oliveira ao acontecimento: «A decisão do Oriental de numerar os jogadores merece relevo e é digna de ser seguida por todos os clubes. O número facilita grandemente a identificação por parte dos espectadores.»
Todos estes acontecimentos e dizeres nos surgem documentados no livro do Oriental de autoria de Vítor Figueiredo. No que diz respeito à goleada imposta pelo Oriental ao FC Porto na sua própria casa, termina assim a crónica do jogo reproduzida de um jornal da época: «Arbitragem à vontade do senhor Abel da Costa.»
A primeira curiosidade a assinalar é, obviamente, de tudo isto se passar num tempo em que os árbitros eram tratados pela imprensa por senhores. E mais nada.
A segunda não é propriamente uma curiosidade. É uma interrogação, uma grande interrogação.
- O que significaria em 1946 a expressão arbitragem à vontade?
Pois não sabemos. À luz da actualidade imaginar uma arbitragem à vontade no Dragão não é coisa do outro mundo. Mas já imaginar uma arbitragem à vontade terminando o jogo com uma derrota por 6-1 para os donos da casa é qualquer coisa de estratosférico.
Gosto do Oriental. Há muito que se deixou das altas instâncias do futebol profissional mas continua a ser uma força viva e aglutinadora de um conjunto de bairros de Lisboa. E contonua a ter aquela camisola grená que é todo um mundo.
O meu avô era da zona e, por razões lá dele e que nunca esmiuçou, foi sempre contra a fusão do Chelas, do Marvilense e d'Os Fósforos que deu origem ao Oriental. Pegando neste livro tentei perceber o porquê daquela velhíssima resistência mas não cheguei a conclusão alguma cobre as razões do meu avô que nem era pessoa de ser do contra, antes pelo contrário, e que era sobretudo 100 por cento benfiquista.
A quase sete décadas de distância desses acontecimentos, agora que os aprendi a fundo, com documentação e tudo, posso, no entanto, de um ponto de vista estritamente romântico avançar com as minhas razões pessoais, caso as tivesse, para ser contra a fusão.
É que Os Fósforos não podiam morrer.
Que nome maravilhosamente inusitado para um clube de futebol, os fósforos! Que pena terem acabado. Na assembleia geral d'Os Fósforos em que se votou a extinção do clube em prol do clube único que haveria de nascer, ainda houve 9 sócios que votaram contra. Mas houve 172 que votaram a favor e adeus fósforos. Na crónica de um jornal que cobriu o melancólico acontecimento apelidava-se de minoria sentimental o grupo dos 9 resistentes ao progresso. Passa agora a 10, apenas por literatura."

Leonor Pinhão, in A Bola

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