"Divulgação dos áudios dos árbitros tem o mérito de mostrar dúvidas e incertezas que contrariam a imagem de arrogância. A empatia nasce assim
Não foi assim há tanto tempo. Em maio de 2013, o então presidente da UEFA, Michel Platini, na sequência de um erro de arbitragem num Bayern-Barcelona para as meias-finais da Liga dos Campeões, propôs uma ideia vanguardista. «A partir do próximo ano solicitarei ao secretário-geral [da UEFA] que nos nossos jogos, para os quais sejam designados cinco árbitros, as conversas entre eles sejam gravadas. Não acredito que um não tenha visto a falta. É impossível. Porquê? Quero saber!», disse o dirigente francês. Recordar estas palavras dez anos depois revela-nos o quão revolucionária foi a criação do videoárbitro (de que Platini sempre foi contra) e o anacronismo de um discurso ainda fresco na memória, mas que já parece pertencer a uma outra era, para não dizer mesmo a outra dimensão.
Por muito que algumas vozes ainda se manifestem contra o VAR, é indiscutível que hoje já não faria qualquer sentido voltar atrás. Porque por cada erro de avaliação ou omissão que se comete no uso da tecnologia há quatro ou cinco que foram devidamente corrigidos. Basta a cada um dos leitores pensar nas últimas dez jogadas polémicas do seu clube do coração e fazer o seguinte exercício: tente imaginar como seriam as decisões sem o recurso à videoarbitragem e encontre um padrão.
Isto não significa que a ferramenta esteja isenta de críticas ou de melhorias. Mas finalmente deu-se um passo em Portugal que consideramos ter sido importante na tentativa de tornar menos opaco o trabalho dos homens de campo e da régie: a divulgação dos áudios. O que há 10 anos era uma espécie de visão futurista está hoje a tornar-se o novo normal. Pode questionar-se a distância temporal entre as conversas e objeto da análise, mas estamos em crer que com os devidos acertos relativamente ao timing e relevância são muito mais as vantagens do que as desvantagens a retirar deste serviço público a que temos vindo a assistir na Sport TV.
Há um benefício claro logo à partida: isto ajuda a humanizar a arbitragem e criar empatia. Quantos portugueses não passaram, só agora, a ouvir a voz dos juízes? Quantos adeptos de sã consciência, depois de assentada a poeira do momento, não se reveem naquelas conversas com todas as dúvidas e incertezas decorrentes de uma decisão que tem de ser tomada na hora, mas que é feita na corda bamba e que contraria a imagem de uma certa arrogância? A isto acresce João Ferreira: o antigo árbitro e hoje vice-presidente do Conselho de Arbitragem foi uma excelente escolha para explicar os lances porque fala de uma forma assertiva e transmite credibilidade, fator chave num tema tão volátil.
Falta o próximo passo. Com a maturidade dos intervenientes e do público, acreditamos que não serão precisos dez anos para Platini ouvir, ao vivo e em direto, na bancada ou no sofá, o futebol do futuro."
Sem comentários:
Enviar um comentário
A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!