"Na passada quinta-feira, a FIFA anunciou mudanças nas regras dos empréstimos a serem efetivadas já na próxima época desportiva. Aos clubes apenas será permitido integrar nos seus planteis um número máximo de oito jogadores emprestados e ceder a título de empréstimo exatamente o mesmo número de atletas a outros clubes, sendo que dois emblemas apenas poderão ceder ou receber entre si um limite de três futebolistas.
A FIFA justifica a medida pela necessidade de combater a acumulação de jogadores nos clubes e promover o equilíbrio competitivo das competições. Por outro lado, ao isentar desta regra os atletas até aos 21 anos de idade e aqueles que tenham cumprido integralmente a formação no clube com o qual mantêm vínculo contratual, aquele organismo parece seguir na peugada de outro dos pressupostos desta medida que passa pela promoção do desenvolvimento dos jogadores jovens.
Pese embora o organismo máximo do futebol não o indique abertamente, parece-me claro que estas novas regras constituem, em grande medida, uma forte oposição às estratégias de gestão assentes na circulação de mercadoria humana.
Conhecemos de cor a política, bem lusitana, de compra amontoada de passes de jogadores. Sim, dificilmente podemos apelidar de coisa diferente as múltiplas transferências em que os atletas nem por uma só vez vestem a camisola do clube que os contrata e passam diretamente, de empréstimo em empréstimo, até que uma venda a qualquer outro clube, acabe por consumar o verdadeiro objetivo da operação.
Outra iluminada habilidade cá da terra é a aquisição de atletas, não para reforçarem o clube comprador, mas apenas para impedir o ingresso desses futebolistas nos planteis das equipas rivais e possam, dessa forma, ser utilizados para gratificação e promoção do bom e cordial relacionamento com diversas outras coletividades.
Este modus operandi, mais não seja pelos largos anos de vincada implementação, é difícil de combater, mas a verdade é que movimentações deste calibre, colocam fortes entraves à evolução do futebol e à possibilidade de lidarmos com uma modalidade cada vez mais competitiva, justa e limpa de esquemas ética e moralmente reprováveis.
Todas as medidas amigas de um melhor espetáculo desportivo são louváveis. Mesmo sabendo que estas em concreto, possam constituir apenas um passinho de criança num longo e sinuoso caminho, devem ser valorizadas e apoiadas para que outras lhes possam seguir e o seu resultado seja cada vez mais impactante.
Nesse sentido, espera-se e deseja-se que a FIFA dê continuidade à reforma desenhada em 2017 e inclua no seu plano de intervenção uma atenção especial a outras matérias para que, apoiados em regulamentação específica, possamos todos usufruir de competições mais dignas.
Entre essas temáticas parece-me de grande oportunidade refletir, por exemplo, sobre o número de jogadores de um só plantel representados pelo mesmo agente e, mais interessante ainda, quantos desses jogadores têm o mesmo agente que o treinador da equipa.
Eventualmente, à primeira vista, este requerimento pode suscitar alguma incompreensão, mas será assim tão descabida uma maior atenção à atividade dos agentes? Há algum tempo, um amigo e pai de dois futebolistas ainda em formação, comentava comigo a sua preocupação relativamente ao desenvolvimento da carreira atlética do seu mais velho.
Dizia-me que atualmente nenhum jogador consegue evoluir e construir uma carreira não tendo um agente que lhe trate dos contactos e lhe arranje propostas de contratos. Ele justificava esta afirmação complementando que nenhum clube aceita a prestação de provas - no meu tempo chamava-se "ir à experiência" - sem que ela venha solicitada pela intervenção de um agente, ou seja, quem não se faça representar, não tem oportunidade sequer de mostrar o seu potencial.
Observo esta situação como muito preocupante, mas infelizmente há mais. O que dizer da apetência de alguns treinadores para a contratação de jogadores representados pelo também seu agente? Recentemente, tivemos oportunidade de verificar na imprensa situações em que os treinadores encontram recorrentemente respostas às suas necessidades no portfólio de que eles próprios fazem parte.
Será todo este enredo ilegal? Bom, vamos acreditar que não. Já no que respeita a ser eticamente admissível e moralmente aceitável, tenho inúmeras reservas. Pensemos em questões práticas: um jogador observa que um número considerável de colegas que ocupa repetidamente o onze titular são representados pelo agente do treinador. Sentirá o atleta que todos aqueles elementos têm muito mais talento e que a questão do agente é apenas e só uma coincidência?
Alguns contratos entre atletas e clubes comportam elevados valores mediante o cumprimento de objetivos individuais e/ou coletivos. Será que este clausulado tem impacto nas escolhas do treinador no momento de optar entre premiar jogadores com ou sem ligação ao seu agente? E aqui, têm mais peso na decisão das convocatórias, a defesa dos interesses desportivos ou financeiros do clube? Por fim, será que a escolha de um treinador tem por base o conjunto de jogadores em carteira no escaparate do seu próprio agente? Bom, se assim for, talvez se explique o constante rebuliço das alterações de comando nas equipas.
Estas e outras interrogações são legítimas e devem continuar a merecer o cuidado da FIFA para que não esmoreça, na vontade e na ação, a tentativa de alterar o status quo vigente e para que todos possamos beneficiar de um futebol mais puro e de um espetáculo mais justo."
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