"Caro Glorioso,
Escrevo-te por ocasião do teu 116.º aniversário, com o principal intuito de te parabentear: muitos parabéns! Parece que foi ontem que a Farmácia Franco viu Cosme Damião dar à luz aquele que viria a ser o maior de Portugal, naquele domingo 28 de Fevereiro, ano bissexto de 1904, decorria o reinado de D. Carlos I, antepenúltimo rei de Portugal (seguiram-se D. Manuel II e Eusébio da Silva Ferreira).
Parece que foi ontem por uma miríade de razões. Eu destaco duas: o tempo que não anda, corre, e os jogadores que não correm, andam.
Parece que foi ontem que nasceste, Benfica, tal foi a displicência e a ingenuidade demonstrada ontem por uma equipa que não quis nem soube ganhar; que não quis nem soube honrar minimamente 116 anos de história, muitos deles passados a cravar o nome Sport Lisboa e Benfica na Europa.
Muitos deles passados… Ah, todos eles passados… Passados… Perdoa-me a pungência das minhas palavras e o desvio da narrativa, mas tinha que tirar isto do peito. Eu compreendo a natural tendência de olhar para trás no dia de aniversário, mas está na hora – na verdade, já tarda – de olhar para a frente.
Os nossos anos gloriosos não podem estar confinados ao século passado. O “Glory Days” do Springsteen não pode ser o nosso novo hino: chega de olhar com nostalgia para os “glory days” que lá vão; vamos em busca dos que estão por vir. Foi também com o objectivo de te tentar dar este “abanão” que decidi escrever-te. Peço-te, então, que subvertas as palavras de Edmund Burke. O filósofo irlandês afirmou que “quem não conhece a história está condenado a repeti-la”.
Mas é preciso repeti-la, Benfica. É o momento de conhecer a nossa história para repeti-la. Ainda que Burke não goste, ainda que o seu fantasma venha assombrar-nos, temos que reverter o pensamento que a citação do irlandês encerra. E, sejamos sinceros, entre o fantasma de Burke e a maldição de Guttmann, que venha o primeiro.
O futebol está bem diferente, bem sei; no entanto, com certeza haverá no nosso passado algo que poderá ser replicado ou adaptado no presente para dar frutos no futuro. Algo como a mística, a crença e a raça tantas vezes incorporada por Humberto Coelho, algo como o virtuosismo e a classe de Chalana, algo como a veia goleadora de José Águas ou de Eusébio (no caso de Eusébio não era uma veia, era um sistema cardiovascular completo).
Não será fácil, mas “se fosse fácil não era para nós”, já dizia Rui Vitória (é estranho: não estamos a jogar grande coisa, ganhámos um jogo nos últimos seis e mesmo assim ainda não tenho saudades dele, como preconizado no “Programa da Cristina”). Ainda assim, nós, benfiquistas, tudo faremos para tornar tudo mais alcançável, ainda que o “Inferno da Luz” me pareça “coisa do passado” (apesar da expressão ser atirada aos quatro ventos por quem, claramente, não viveu, nem ouviu falar do real “Inferno da Luz”).
Aproveito para te pedir para que, nos entretantos, não descures todo o ecléctico universo que te compõe. Temos condições para nos impormos em todos os panoramas desportivos nacionais e em alguns europeus (casos do hóquei e do futsal, em ambos os géneros, e do voleibol masculino). Além disso, é necessário construir uma marca forte e com capacidade de expansão – algo que creio já estar em curso.
Sei que te peço muito (e que nada me deves) – e muito mais tinha a pedir -, mas faço-o por te saber capaz e por acreditar que a concretização dos meus pedidos deixaria milhões extasiados. No entanto, não esqueço o principal motivo da minha epístola: 28 de Fevereiro é, e sempre será, dia de festa e de celebração, incondicionalmente. Porque é dessa forma que vivo a minha paixão por ti.
Muitos parabéns pelo 116.º aniversário, que sejas muito feliz, Sport Lisboa e Benfica! A tua felicidade é, verdadeiramente, a minha. E a de milhões.
Até sempre e para sempre,
Um orgulhoso benfiquista"
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