"Albert Stubbins: muita gente nunca terá ouvido falar de Albert Stubbins..
Gosto de nomes. Os nomes desenham personalidades. Vamos lá ver: Eusébio não seria Eusébio se se chamasse Ernesto. E Pelé? Seria o quê se não lhe tivessem dado essa alcunha mágica que se confunde com futebol?
Não são perguntas fáceis de responder.
Eu não sei responder a elas.
Mas sei que não há ninguém mais napoleónico do que Napoleão ou mais garboso do que Greta Garbo.
Ou mais salazarento do que Salazar.
Há nomes que se adjectivam. Albert Stubbins não é um deles.
Bob Spitz escreveu um livro extraordinário sobre os Beatles: verdadeira enciclopédia.
Refere, a determinada altura, que John Lennon era, basicamente, desligado do desporto. E do futebol em particular.
Talvez não fosse bem assim.
Albert Stubbins foi um avançado-centro do Newcastle United e do Liverpool dos anos-40 e 50. John Lennon usou-o para aporrinhar Paul McCartney e, de facto, eles eram especialistas em aporrinharem-se mutuamente.
A brincadeira surgiu durante a escolha de personagens históricas que haveriam de compor aquela capa inesquecivelmente psicadélica de Sergeant Pepper’s Lonely Hearts Club Band Hearts Club Band.
O facto é este e já o contei por mais de uma vez: no meio de Fred Astaire, Groucho Marx, Alistair Crowley, Aldous Houxley e outros quejandos, Paul decidiu incluir um rapaz que cometera a proeza de marcar 60 golos num campeonato com a camisola do Everton. John não quis ficar atrás: Gandhi, Nietzsche, H.G. Wells, o Marquês de Sade e Albert Stubbins figuravam na sua lista.
Bem, mas eu quero é falar de George Robledo: Jorge Robledo Oliver, nascido no dia 14 de Abril de 1926, em Iquique, no Chile, filho de pai chileno e mãe inglesa.
Aos 5 anos já estava na Europa. Em Inglaterra, pois claro! Em Brampton, que não é dos lugares mais cosmopolitas da Grã-Bretanha mas que tem minas de carvão nas quais o jovem Robledo começou cedo a escarafunchar.
Nos intervalos da fuligem, jogava como avançado no Huddersfield. Em 1946 assinou um contrato profissional com o Barnsley e mandou às malvas o chapéu com a lanterninha na pala.
Dir-me-ão: a que propósito aparece aqui este tal de Robledo, vindo de parte nenhuma com o Che?
E eu respondo: por causa de John Lennon.
Em 1951, Jorge Robledo tornou-se no primeiro sul americano a disputar a final da Taça de Inglaterra. Ah! A Taça de Inglaterra!!! Quem não gostaria de jogar uma final da Taça de Inglaterra?
Robledo jogou duas. E venceu ambas. Com a camisola do Newcastle United, derrotou o Blackpool na primeira e o Arsenal na segunda, logo no ano seguinte. E aí ficou para a história.
Minuto 84: uma bola vem lá de um lado qualquer pedindo - «chutem-me! Chutem-me por favor!».
Jorge Robledo era um cavalheiro. Não ficava imune aos desejos de uma dama, sobretudo quando essa dama era a mágica senhora das paixões: a bola.
Por isso não pediu licença nem fez uma vénia: simplesmente chutou.
Foi golo.
E Jorge, que nessa altura já era George, ficou congelado numa fotografia no momento do remate, preso ao golo indefensável e irretocável.
Em 1974, John Lennon editou Walls and Bridges. Vivia uma fase conturbada da relação com Yoko Ono e aproveitou para se escapulir para a Califórnia com a assistente pessoal de Yoko, May Pang. Talvez tenha sido uma certa influência oriental a conduzi-lo para um disco com muito de saudosismo. Nobody Loves You /When You-re Down and Out, Scared ou Old Dirty Road, revelam um Lennon muito entregue aos seus próprios fantasmas.
Talvez por isso tenha decidido ilustrar o álbum com desenhos seus de infância. Entre eles há um que fica particularmente bem emoldurado na parede branca de uma crónica: é de John Winston Lennon com apenas 11 anos; representa o golo de Jorge Robledo ao Arsenal na final da Taça de Inglaterra.
Difícil seria, apesar do que dizem os compêndios, que um rapazinho de Liverpool não gostasse de futebol.
Um fascínio como o que sentia por uns olhos verdes. E cantava: The green eyed goddamn straight from your heart.
Isso! Direito ao coração. Como o golo de Robledo."
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