"Acho que a defesa está a melhorar na sua eficácia e Seferovic é mesmo um caso de um jogador que parece estar no clube já há alguns anos.
Inês Henriques - Ouro
É gostosamente imperativo (passe o quase paradoxo) que comece esta crónica por Inês Henriques, medalha de ouro na novel prova de 50 Km marcha feminina nos Campeonatos do Mundo e nova recordista planetária. Uma saborosa vitória numa competição duríssima e que só pode ser alcançada com estoicismo, resistência física e psicológica, determinação e muito, muito trabalho e sacrifício na prova e nos treinos. Este feito é ainda mais assinalável (a Bola fê-lo ontem e anteontem como justamente se impunha, não só na capa, como em reportagens) num tempo em que somos submetidos diariamente no totalitário futebol.
Façanha inédita de uma portuguesa que, aos 37 anos de idade, atinge o patamar mais elevado, sem deslumbramentos e sem exibicionismos tontos («Seria impensável vir na capa dos jornais» disse a atleta na chegada a Lisboa).
Atafulhados pelo futebol jogado, mas sobretudo pelo que à sua volta se consome entre gritarias, desvarios e, não raro, pouca-vergonha, é refrescante para a mente e reconfortante para o espírito ver Inês Henriques levantar bem alto o orgulho de sermos portugueses.
Além de um desporto belíssimo, o atletismo é o que dá mais sucessos à lusa pátria. Nos Jogos Olímpicos, nos Mundiais ao ar livre ou pista coberta, nos Europeus, nas taças europeias de corta-mato, temos um extenso rol de atletas exemplares e vencedores. Não há outro desporto com tal produção de medalhados e medalhadas. Não há bandeiras nas janelas por causa destas atletas, nem programas de horas a fio a falar dos seus feitos. Prefere-se uma palermice de um qualquer craque ao enaltecimento do trabalho árduo e da persistência silenciosa de nobres atletas.
Estes acontecimentos despertam-nos para a ideia de que, afinal, sempre há desporto para além do futebol.
Já nesta coluna o disse, mas repito-o. Lamento a ausência de uma televisão portuguesa, em particular da pública, nos Mundiais de atletismo, aqui ao lado, em Londres. Creio que, de há tempos para cá, é a primeira vez que tal sucede. Desta vez, nem sequer foi em longínquas paragens. Mais um contraste com o futebol que tudo engole em orçamentos, custos e publicidade. É decepcionante. Fosse um treino da selecção de futebol e teríamos directos da Cochinchina e jogadores em conferências de imprensa a debitar banalidades.
Já agora, um pormenor: Portugal com 2 medalhas (ouro e bronze) derrotou a Espanha que saiu de Londres como entrou...
Por fim, assinalo a circunstância da escalabitana Inês Henriques ser atleta do Clube de Natação de Rio Maior. Não é do Benfica, não é do Sporting ou de ouro clube e nem sequer entrou na guerra passada para o atletismo de transferências que procuram replicar expressões doentias de aparente rivalidade.
Parabéns, Inês Henriques. E obrigado.
O besouro de uma liga videoformatada
Está concluída a 2.ª jornada do Campeonato. Primeiro facto a registar: para os 16 jogos efectuados foram precisos 10 (!) dias, em estilo gota-a-gota que retira sabor à competição (isso mesmo, competição). Bem sei que há jogos europeus e que a imposição televisiva tudo comanda, mas que diabo, esta salamização das jornadas não será excessiva?
Entretanto, parece que, no nosso futebol, vem ái um novo dialecto: o videoquês. Quer dizer, um linguajar tecnovirtual para todos os gostos e momentos, à escolha de cada um. Sobretudo para aqueles que querem erradicar (uso este verbo literalmente) a naturalidade do erro humano, ainda que o seja por milímetros ou não permitindo sequer margem para dúvidas. Devo começar por dizer que, para mim, o videoárbitro (VAR) tem sido positivo nestas primeiras provas. Desde logo, na parte menos visível, mas mais importante, qual seja a da prevenção inculcada na consciência dos jogadores de que agora há mais olhos (humanos e tecnológicos) a olhar para eles, e traduzida em menos faltas graves ou faltas (farsas) cavadas. Mas também na reposição da verdade indiscutível face a erros dos árbitros de campo (é o caso do golo mal anulado do Porto na 1.ª jornada).
Estas duas semanas também serviram para nos serem dadas mais informações sobre o VAR. Aliás, bom seria que fosse pública toda a regulamentação e funcionamento do VAR, até para que os comentadores de serviço (incluindo ex-árbitros) opinassem com cabal e completo conhecimento deste complementar meio de arbitragem.
Percebi agora que o VAR só deverá intervir em casos de erros grosseiros (ou claros) que não ofereçam quaisquer dúvidas e que violem nitidamente a verdade desportiva. Ou seja, aqueles casos situados na margem da incerteza ou na aceitável interpretação do árbitro principal não deverão ser intervencionados pelo VAR. Parece-me defensável este modo de agir, numa boa tentativa de encontrar a melhor síntese entre a interferência e a fluidez do jogo jogado.
Assim sendo, acho que foi compreensível por exemplo, no Benfica-Braga sancionar a invalidação de um remate do Braga (o fora-de-jogo ou não é uma questão milimétrica) e a não marcação de penálti sobre Jardel (ainda que a sua marcação fosse mais correcta). Já no Sporting-Vitória,a grande penalidade que ofereceu o triunfo aos leões, claramente forçada, está na fímbria da intervenção do VAR. Mas, neste caso, não se levantaram os clamores e as trombetas caso se tratasse de um alegado benefício ao Benfica. No penálti (indiscutível) de Tiba do Chaves sobre Jonas, para que servem tantas câmaras para o VAR) Estavam a dormir?
Creio que, mais do que nos fora-de-jogo que são fundamentalmente uma questão métrica, a principal dificuldade do VAR estará nas faltas merecedoras de grande penalidade, em função das sempre invocadas intensidade e intencionalidade.
A normalidade na luta pelo tesouro da Champions
Terminou a segunda jornada. Na frente, tudo normal, com a boa intromissão do tranquilo Rio Ave. Segundo A Bola de ontem, a circunstância de os 3 grandes fazerem o pleno nas duas debutantes jornadas já não acontecia há 23 anos! Todavia, sofreram para ganhar por um minguado 1-0. Mas, em qualquer dos casos, merecido. O Sporting parece não se ter libertado do fantasma de Alvalade apesar do apoio de um estádio quase repleto. O Porto, que verdadeiramente ainda não teve um teste difícil quer na Liga, quer na pré-época, venceu com um futebol algo baço. Por fim, o Benfica falhou mutos golos, mas jogou com a habitual coesão e ligação diante de um Chaves que será muito difícil de bater no seu reduto. Acho que a defesa está a melhorar na sua eficácia e Seferovic é mesmo um caso de um jogador que parece estar no clube já há alguns anos. Estão empatadas as 3 equipas, mas os jogos do Benfica, foram contra equipas, em teoria, bem mais difíceis.
Contraluz
- Palavra: Prélio.
Em desuso no futebol, significando luta, disputa ou competição (do latim proeliu). Uma alternativa semântica à palavra jogo, depois de esgotadas outros substantivos, tais como encontro, partida, embate ou disputa, umas mais bélicas, outras menos (de facto, um jogo pode ser uma batalha, sobretudo quando se alcandora o adversário à categoria de inimigo).
- Número: 24.
Golos nos jogos dos principais candidatos da Liga inglesa (Man. United, Man. City, Chelsea, Arsenal e Liverpool). Por cá, nos dos três grandes apenas 3 golos. Viva o futebol com golos!
- Lição: «O que eu fiz hoje foi muito duro, mas o que a minha mãe faz todos os dias é muito mais duro»
(depoimento tão belo quanto expressivo de Inês Henriques, em entrevista ao Público, após a medalha de ouro).
- Preferências: (minhas claras)
Arsenal na Inglaterra, Bayern na Alemanha, Barcelona em Espanha, Roma em Itália, Ajax na Holanda. Tudo vermelho ou perto disso..."
Bagão Félix, in A Bola
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