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quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Casos de polícia


"Adiar jogos é mau, mas o problema está nos bandidos e não na polícia

SE a SIC acabou com o programa «Casos de Polícia», em 1999, não foi por culpa do futebol português, que continua a produzir conteúdo para várias temporadas, até quando assume o papel de vítima.
O adiamento do Famalicão-Sporting levanta constrangimentos óbvios, da deslustrosa dificuldade para encontrar nova data à dispensável interferência na classificação, caso a diferença no número de jogos se arraste por muito tempo. Mas dentro da sua bolha, o futebol português não pode cair no erro de extrapolar o seu papel na sociedade.
É difícil ignorar que o protesto dos agentes tem contornos muito discutíveis, como a questão das baixas médicas ou a ameaça apontada às eleições legislativas, mas é preciso medir também o descontentamento de pessoas cansadas de arriscar a vida enquanto trabalham em esquadras frias, conduzem carros sem manutenção e enfrentam o crime sem equipamento adequado. Isto em troca de ordenados que estão, em média, muito longe de compensar o risco, injustamente excluídos do suplemento atribuído à Polícia Judiciária.
É provável que o futebol tenha sido palco privilegiado para o protesto, por força da sua exposição mediática, mas antes isso que instrumentalizado para aproveitamentos políticos, financeiros e/ou pessoais. Na ânsia de tomar uma posição forte, a Liga precipitou-se com um discurso (excessivamente) duro, a contrastar com o silêncio que impera noutras ocasiões, como os repetidos episódios de cargas policiais desmedidas nos estádios.
Também há telhados de vidro nas carrinhas de intervenção, mas se os clubes gastam milhões de euros em segurança, não é menos verdade que estar de serviço no futebol já devia justificar um subsídio adicional aos agentes. Desde logo para aturar adeptos como aqueles que foram a Famalicão para arranjar confusão, e não para ver futebol. Estes é que fazem com que o futebol seja cada vez menos um espaço para famílias, que seja um risco levar uma criança ao estádio, ou que dois amigos, adeptos de clubes rivais, mas não inimigos, não possam ir juntos a um qualquer dérbi ou clássico.
O problema não está nas claques, está nos indivíduos que as usam como capa para o crime, seja para atirar garrafas, vender bilhetes em mercados paralelos, tráfico de droga ou para atropelamentos mortais.
As regalias oferecidas a grupos organizados são um erro indesculpável, até porque promovem uma injustiça relativamente a outros adeptos que, a título individual, fazem esforços iguais ou maiores para apoiar a equipa. E nesse pressuposto também será errado exigir algo mais para vender um bilhete a quem pertence a uma claque.
Adiar jogos pode ser uma chatice, mas a preocupação do futebol português deve passar por contribuir para uma polícia mais forte, capaz de afastar os bandidos que corroem o desporto por dentro, estejam eles no topo da bancada ou nos gabinetes."

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