"Pepe foi o primeiro jogador a manifestar solidariedade e reconhecimento por Fernando Santos, minutos depois de anunciado o despedimento do seleccionador, no que foi seguido por quase todos os colegas da seleção, alguns dos quais nem sequer estiveram no Mundial.
Pepe esteve à altura do posto que assumiu, ainda que interinamente, com dignidade e responsabilidade, quando necessário, no Catar.
Podemos nem saber que um capitão se situa normalmente entre tenente e major, sendo por isso da categoria dos oficiais intermediários, abaixo dos oficiais superiores, mas a nenhum outro reconhecemos a força e o poder da liderança, comando e incumbência. Porque a sua matriz, o latim “caput”, significa precisamente “cabeça” e evoluiu semanticamente na Idade Média para “chefe” ou, mesmo, “comandante”.
Temos pelo “capitão” maior identidade e confiança do que pelo “general” ou pelo “almirante”, sabemos que ele é a reserva do bem, que não se deixa possuir pelo autoritarismo, que não falha quando os outros se escondem, que é o último a abandonar o navio que se afunda.
Capitão é Abril, é verdade, coragem e dádiva, é a “nossa bandeira”, como diz Pepe - é um de nós.
Ora, todas as equipas de futebol devem ter um capitão, embora a única função prevista nas leis do jogo, Lei 3, seja a participação representativa no acto da escolha de campo, prévio ao jogo, e a recepção do troféu ganho, após a partida. O homem da braçadeira responde pelo comportamento do conjunto em campo: “o capitão não tem estatuto especial nem privilégios, mas assume um grau de responsabilidade pelo comportamento da equipa” - determina o International Board.
É precisamente no seio do grupo que ele desempenha, por missão e carisma, esse papel natural de liderança, muitas vezes erradamente confundida com antiguidade, como acontece por tradição e defeito na seleção de Portugal.
Nos primórdios do futebol, era o primeiro ajudante do treinador, inclusive na escolha dos jogadores: uma equipa podia nem ter treinador, mas tinha sempre capitão. Aliás, da história das grandes competições, recordamos mais capitães do que treinadores.
Sabemos, até à eternidade, quem estava lá, na tribuna a receber a taça das mãos dos dignitários, mas já se nos varreu da memória quem era o técnico desse triunfo: como o “capita” brasileiro Carlos Alberto, superior hierárquico de Pelé, ou Bobby Moore, o príncipe inglês no reinado de Bobby Charlton, Daniel Passarella como referência de Kempes, Lothar Matthäus a equilibrar Völler e Klinsmann, Didier Deschamps na sombra de Zidane, Iker Casillas a dar dimensão nacional aos génios catalães, o Cafu vulgar como tutor do fenómeno Ronaldo. E tantos outros.
O capitão não tem de ser forçosamente o dono da bola, o melhor ou mais famoso e influente jogador, o que marca mais golos ou estabelece mais recordes. O capitão é aquele que dá a cara pelo colectivo nos bons e sobretudo nos mais difíceis momentos. É o líder firme, a cabeça do grupo, que pensa, que enfrenta, que decide, que assume, que se faz ouvir, que se deixa seguir pelo exemplo.
Os melhores anos de Eusébio foram os tempos de Mário Coluna, o “grande capitão” a quem ele tratava por “senhor”, quando o prestígio e o respeito eram superiores hierárquicos da celebridade e do mediatismo.
A nova seleção de Portugal, além de um novo selecionador, também precisa de um novo capitão.
“O Captain! my Captain! our fearful trip is done;
My Captain does not answer, his lips are pale and still;
The ship is anchored safe and sound, its voyage closed and done”"
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