"P'ra todo o sempre! Somos tão pequeninos, mas tão grandes, que tu conseguiste a proeza de ligar dois continentes, que afinal têm uma língua comum e identificam-se em tantas coisas.
Em 1961 vieste para o Sport Lisboa e Benfica e demoraste 30 horas para chegar. Quem diria que essas 30 horas se tornariam em anos de sucesso!
Desde lições de humildade, genialidade, grandeza, traços esculturais e divinos, tudo se transformou numa simbiose entre ti e o Benfica e o Benfica e tu. Portugal e tu e tu e Portugal. O Mundo e tu e tu e o Mundo.
Como se diz hoje na juventude perdida, 'estavas muito à frente' naquela época!
Consciência de ter ver jogar nos primeiros anos da minha existência que distam de 1963, não tenho! Mas a palavra, os gestos, a mística passada pelo meu Pai e pela minha Mãe, foi mais que suficiente para apreender a diferença entre a realidade vivida e o sonho!
Algures no tempo, recordo em consciência de te ver jogar a primeira vez. Para mim, já eras um mito vivo!
Mas para um miúdo que ouviu falar dos feitos que fizeste a partir de 1961 neste País à beira-mar plantado, com o desempenho que tiveste em 1966, ter o privilégio de recordar após este tempo todo, os teus três golos na final do Jamor contra o Sporting, é realmente porque és imortal! O teu terceiro golo de livre directo a quatro minutos do fim do prolongamento, deixaram-me encantado no meio de 45000 espectadores!
E na época de 1972/1973, quando o Benfica defrontou o Sporting no Estádio da Luz, eu lá estava para ver os teus quatro golos. Já estavas no firmamento há muito tempo!
Os miúdos da Rua, da minha Rua, gritavam pelo teu nome e jogavam à bola num 'campo' inclinado, tentando imitar-te nos teus remates! Mas a debalde o faziam porque Eusébio só havia um! Eras tu!
As tardes de Domingo no Estádio da Luz eram a minha casa e em 1976, ingressei nos Iniciados do Benfica, vindo dos Infantis do Mister Biri, porque tinha interiorizado um clube que hoje ainda amo e tu tinhas criado a vontade de jogar Futebol aos Portugueses.
É evidente, que mesmo que não tivesse o problema que Deus me deu numa vista, jamais teria sido um jogador de Futebol que sequer chegasse aos teus calcanhares!
Mas o Benfica e tu, para mim, passaram a ser só um! Durante muitos anos tive de me fazer à vida e nunca pensei que um dia me desses a honra de poderes ir ao meu casamento - é certo o meu segundo, que também não deu certo, mas por culpa minha -, mas que bastou ter a tua presença para nunca mais o poder esquecer!
Que melhor prenda se pode pedir?
Guardo religiosamente um fotografia tua, com a minha mãe e o meu pai, também ambos já partidos deste Mundo!
Conhece-ti pessoalmente uns meses antes desse evento graças aos meus aos meus amigos de longa data, Carlos Pereira Cruz, Marina Cruz, teus compadres e teus grandes amigos durante uma vida inteira. Foi, obviamente, na Adega da Tia Matilde!
Mas eu imaginaria lá que o meu ídolo um dia pudesse estar sentado à mesa comigo e falar sobre os seus feitos e sobretudo do Benfica? E que pudesse ir a um casamento meu?
A tua simplicidade era corrosiva. A tua humildade e, ao mesmo tempo, Mística, enchiam o ar de eprfume. Respirava-se Eusébio e respirava-se o Benfica!
Como sabes, nunca foi muito de andar nos eventos sociais. Tranquiliza-me o facto de existires, simbolizares o Benfica, teres voltado novamente a ter o teu lugar na História do Clube, ter surgido uma Direcção que ressuscitou a cultura e a sua história.
Claro que em bom rigor tu não precisavas de ser preservado, porque te evidenciavas a ti próprio! Mas esta vida é madrasta e todos acabamos por fazer o caminho de todos os seres humanos.
Um dia sou surpreendido com a notícia da tua morte. Sinceramente, nunca tinha pensado nisso como uma perspectiva real! Falava nisso nos meus comentários, mas nunca senti isso! Para mim era sempre uma lenda viva!
Mas há um dia em que tudo acaba e partimos para outro lado qualquer que só saboreamos quando isso nos acontecer.
Ficam duas emoções muito diferentes! Ao ver a homenagem que te fizeram no Estádio da Luz, percebi que existirás sempre em nós! E que o Benfica é uma instituição que trata bem os seus! E que organização fabulosa que em tão pouco tempo se construiu para te homenagear!
As pessoas que espectacularmente trabalham nessa organização merecerão o teu carinho para o resto da vida. Porque, para todos nós, tu sempre existirás!
A outra emoção, é aquela que sentimos quando estamos mais sozinhos e realistas! Não te vou poder ver mais! E cada vez que olhava para ti, só via juventude, genialidade e Benfica!
Aqui chegado já me custa escrever mais.
Não sou ingénuo ao ponto de acreditar no Menino Jesus e julgar que tudo será vitorioso daqui para a frente em tua homenagem. Que os Benfiquistas vão saber ficar unidos na diferença! Mas há algo que todo e qualquer benfiquista te quererá dedicar, porque tu para todos nós és, e será sempre, eterno.
Oxalá todos os benfiquistas saibam e façam erguer bem alto o teu nome e realizem a tua vontade!
Tu, entretanto, descansa para todo o sempre e observa como nos movemos! E vai-te rindo, ou melhor, sorrindo!
E hás-de ir para o Panteão porque é aí que pertences!
Obrigado por tudo Eusébio! Até sempre!
(...)"
Pragal Colaço, in O Benfica
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