"O Madaleno teve a ideia e pô-la em prática: queria na rua Herculano uma sucursal das trampolinices da Casa Iluminada Logo a Seguir ao Cemitério. O Madaleno sempre sonhou em invadir a Capital do Império. E tascar-lhe fogo. Sempre sonhou ver a cidade branca escurecida pelas poucas-vergonhas imaginadas pelo seu cérebro caliginoso. Estranhava que não lhe dessem valor a Sul. O seu lema - 'Vergonha é Roubar e não Saber Subornar um Juiz' - não se aplicava a todo o comprimento do Rectângulo e isso incomodava-o a ponto de se ver no centro de um vendaval de flatos. O Madaleno gosta de homenzinhos de cócoras. Os homenzinhos de cócoras são muito úteis na sua senda podre de enganar e destruir a verdade, e limitam-se a mendigar bilhetinhos para as grandes festas de tafularia.
O Madaleno trata os homenzinhos de cócoras como eles merecem: isto é, abaixo de cão. Ou mesmo abaixo de porco. O chefe dos homenzinhos de cócoras ergue-se nas patas traseiras e arfa de alegria, ganindo na ânsia de um afago nas orelhas. Acabou por ter um prémio: foi nomeado presidente da Sucursal. Na Sucursal da rua Herculano escolhe a dedo os homenzinhos de cócoras que não vêem mãos. Isto é: falsifica, abastarda, adultera, perverte, vicia, corrompe aquilo que se supunha ser limpo. É essa a sua missão e ele cumpre-a sem desvelo. Semana após semana observa a sua obra. Os seus sequazes marcham alegremente a Penouços para receberem medalhas de lata da boa obediência das mãos de um cavernoso pinto de bico recurvo e olhos de carneiro sinistro. São paus-mandados. Bem mandados para o mal."
Afonso de Melo, in O Benfica
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