"Mário Rosa Gomes: em Marrocos era um guarda-redes marcador de penáltis; em Lisboa passou oito épocas no Benfica apesar da vontade do tio que o levou a treinar no Sporting.
HOJE vamos à baliza. Isto é: vamos falar de Mário Rosa Gomes. Há muita gente que lhe rouba o Gomes do nome, mas parece não haver motivo para tal injustiça.
Mário Rosa não foi um dos históricos, mas teve história. E uma história curiosa por sinal. Primeiro porque veio de Marrocos directo a Lisboa; depois porque foi logo disputado por Benfica e Sporting.
Veio a bordo do «Formese», proveniente de Casablanca.
Sabem-se algumas coisas sobre a sua carreira, sobre como representou o Benfica, de 1938 a 1959, sempre com interrupções, sempre sem verdadeiramente se conseguir impor, não indo além de 47 jogos com a camisola 'encarnada' que, no caso dos guarda-redes, até costuma ser tudo menos encarnada, como mandam as regras. 1944/45 foi a sua melhor época: assumiu-se como titular.
Também se sabe, na generalidade, que nasceu em Vila Real de Santo António, lá nos confins do Algarve, raia de Espanha, de onde viria também um dos grandes jogadores que passou pela Luz, Domiciano Cavém.
Tinha 11 anos quando a família embarcou para Casablanca. Por necessidade e espírito de aventura.
Mário foi, desde logo, um amante do Desporto, da cultura física. Foi nadador, apaixonou-se pelo Futebol. Era ágil, corajoso: o posto de guarda-redes ficava-lhe bem.
Do Roches Noires ao Benfica
AOS 17 anos, Mário Rosa Gomes chegou às primeiras categorias do seu «team» marroquino, o Roches Noires. E era mecânico de automóveis.
Vivia-se o tempo do que se chamava, por toda a parte, o Marrocos Francês. Um tratado assinado em Fez, no dia 30 de Março de 1912, entre franceses e marroquinos, proclamou naquele território um protectorado francês. Durou até 1956. Algo que valeu, por exemplo, com que Larbi Ben Barek, a primeira grande estrela do Futebol africano, conhecido pela «Pérola Negra», viesse a ser internacional pela França.
Roches Noires de Casablanca francesíssimo sem surpresa. Um dos bairros coloniais de Casablanca, a meias com o Belvèdére um dos mais elegantes da cidade. Quando Mário chegou à baliza do Club des Roches Noires, o clube atravessava uma fase de penúria de títulos. O português foi arauto da fortuna e a sua equipa ganhou o Campeonato.
Foi escolhido para a selecção regional de Casablanca: defrontou Oran e Tânger.
Não chegou: vieram as desavenças. Mário Rosa Gomes troca o Roche Noires por um dos rivais deste, o Union Sportive Athlétique, campeão em 1927 e 1929, entretanto desaparecido. Estávamos em 1934. A vida não tardaria a empurrá-lo na direcção da foz do Tejo e da luz transparente de Lisboa.
Não veio por gosto, no entanto. Veio forçado, contrariado. Os pais não renegavam nem a pátria nem os sacrifícios que por ela se fazem. No dia 13 de Abril, ao cumprir 21 anos, marcha (com toda a propriedade do termo) para Portugal e para a incorporação no serviço militar. Mas não esquece o Futebol nem as balizas.
Dizem os repórteres da época que não era nem muito alto nem muito baixo, aí metro e setenta e dois, exibindo boa estampa e parecendo vender saúde.
Falava um português «retorcido», dizem outros. Assim com laivos afrancesados.
Um amigo de Casablanca põe-lhe nas mãos uma carta de recomendação para alguém ligado ao Benfica. Só que, pelo caminho, Mário Rosa Gomes, treina-se no Sporting. Estranho? Ele próprio explicava: «O meu tio, em casa de quem estou, é adepto do Sporting. Perguntou-me se tinha preferência pelo Benfica e disse-lhe que não. Perante a minha resposta afirmou que gostaria de me ver nos 'leões'. Para mim, repito, é indiferente. E fui a dois treinos no Sporting».
Em Casablanca jogava no mais puro dos amadorismos. Em Portugal, Mário procura a melhor proposta possível. «Em caso de igualdade visto ser agradável ao meu tio, escolherei o Sporting», diz.
Marcador oficial de penáltis nos seus clubes marroquinos, vangloriava-se de ser, todas as épocas, um dos melhores goleadores. «Era infalível!», exclamava.
Os jornais estranhavam: «Um guardião ganhador de castigos máximos? Entre nós nunca tal houve. Mário é, pois, uma novidade digna de atenção...» Em Portugal iria esquecer os golos.
Mário Rosa, apesar de indiferente, jogou no Benfica. Estreou-se contra a Académica, nas Amoreiras, para o Campeonato Nacional. O Benfica venceu, por 3-1. Hpuve um penalti contra a Académica. Mário não marcou. Marcou Rogério «Pipi»: e falhou.
Ter-lhe-á arrancado um sorrido... Continuou a ser o único infalível."
Afonso de Melo, in O Benfica
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