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sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Ronaldo ou Messi, a decisão final


"Cara ou coroa, Messi ou Ronaldo. Eu tenho um preferido. Escolho alguém que é uma inspiração para a humanidade, desde os miúdos nas ruas das nossas cidades até aos confins da Ásia ou África.

Há quinze anos que uma questão apaixona o mundo inteiro: quem é melhor, Cristiano Ronaldo ou Lionel Messi? Durante os próximos minutos vou provar que a questão não ficou encerrada com o último Mundial. Além da análise não poder ser estática, são dois seres humanos diferentes e teremos de analisar os seus pontos fracos e fortes. Mais do que a visão habitual dos números das duas carreiras em termos de golos, títulos e prémios, é fundamental sermos mais detalhados, específicos, tendo em atenção a complexidade do atleta de alta competição: a evolução da carreira, a mentalidade e as capacidades físicas, bem como a sua correta afetação às situações de jogo de futebol, como a técnica, a tática, a velocidade, o drible, a movimentação defensiva, a explosão atacante, a eficácia e a mentalidade. Embora este não seja um contributo científico com aspetos numéricos, é uma introdução que pode servir para que, no futuro, algum investigador se foque nas variáveis que aqui apresento e as correlacione devidamente. Para fazermos uma comparação entre os dois jogadores, é necessário dividirmos quatro estádios comuns das respetivas carreiras: início, desenvolvimento, auge e fim da carreira.
No início da carreira de Cristiano Ronaldo, ninguém poderia adivinhar aquilo em que se tornaria. É certo que todos vaticinavam que seria um grande jogador, mas não tinha o físico ou o drible de um Maradona ou Pelé. Seria apenas mais uma promessa entre tantas outras que todas as épocas saem nas primeiras páginas dos jornais. Sendo certo que a margem de progressão seria grande, não era consensual até que ponto. Alex Ferguson acreditou nele e foi para o Manchester United, um local onde poderia progredir muito. Enquanto isso, Messi chamou logo à atenção dos grandes clubes europeus quando era criança e estreou-se pelo Barcelona com dezasseis anos. Todos já vibravam com a sua técnica, habilidade natural, jogadas artísticas e espírito de equipa. Ficou com a camisola e o lugar de outro grande jogador, que estava em final de carreira, Ronaldinho Gaúcho, tendo a tarefa hercúlea de o substituir na equipa. E não demorou a ser bem sucedido.
 O desenvolvimento do Cristiano no Manchester não foi de um dia para o outro. E aqui surge a sua imagem de marca: jogador com vontade de ferro, sempre a treinar e a colocar tudo de si para melhorar, progredir e evoluir, tanto na velocidade como nos aspetos técnicos do jogo. Podia não ter o talento natural de outros, mas tinha a atitude certa, junto com uma humildade inspiradora. Pouco a pouco, de dentes cerrados, foi escalando uma montanha e só ele sabia que o propósito era chegar ao cume dos deuses do futebol. Aqui ninguém ainda acreditava, nem os colegas do Manchester United, onde jogava para a equipa, fazia muitas assistências e poucos golos. Enquanto isso, Messi já dava muito nas vistas, apesar de ser mais novo do que Ronaldo. Além das fintas geniais, típicas de alguém com a estatura baixa e com o centro de gravidade mais próximo do esférico, começava a fazer golos. Aos poucos, começavam a ser os colegas de equipa a trabalhar para ele e não o contrário.
O auge dos dois jogadores foi quase simultâneo. Cristiano Ronaldo ganhou o primeiro prémio de melhor do mundo ainda no Manchester United, sendo já um jogador consolidado. Mas reparemos no rapaz frágil e sonhador que saiu do Sporting e observemos o homem que ganhou este primeiro prémio: parecem dois seres humanos completamente diferentes. Pode ter arranjado os dentes e o cabelo, mas o fundamental era a grandeza física, agora capaz de verdadeiras explosões, uma velocidade incrível, um drible sensacional e os primeiros golos inesquecíveis. Espicaçados pela comunicação social e a transferência de Cristiano para o Real Madrid, começava aqui uma rivalidade nunca antes vista. Era uma tempestade perfeita, que se completava por Messi estar no grande adversário do Real em Espanha, o Barcelona, que, até por razões políticas, sempre rivalizou com o clube da capital. O resto é História: Messi ganhava nos quatro anos seguintes e o português recuperava a desvantagem com outros quatro prémios, sendo que no meio Messi ganhou um e empatou a contenda. E foi assim até 2018, ano em que Modric ganhou o prémio. Completaram-se dez anos de uma competição a dois e em que não houve um vencedor, mas sim milhões deles: adeptos de futebol espalhados pelo mundo e maravilhados com o que se fazia dentro de campo. Foi um tempo irrepetível e que tivemos a sorte de testemunhar.
O final de carreira tem sido outro aspeto a diferenciar os dois atletas. É algo triste e fatal, mas natural para qualquer ser humano: o corpo envelhece, começa a perder força e não funciona como antes. Seria óbvio que Cristiano Ronaldo começasse a decair mais cedo que Messi, por duas razões essenciais: em primeiro lugar, por ser mais velho e esta é a resposta mais óbvia; no entanto, há uma segunda questão, que está relacionada com o respetivo estilo de jogo, já que o português baseou a sua vantagem na explosão física e é evidente que com a idade já não teve a mesma capacidade de resposta às situações das partidas. Já Messi, apesar de perder alguma velocidade, continuou a ter na intuição a sua grande arma, sendo ainda hoje capaz de fazer a diferença em todos os jogos. A ida de Ronaldo para a Juventus terá sido o canto do cisne, pois teve que se adaptar a uma equipa completamente diferente, num campeonato italiano muito variado do espanhol. Messi continuou na mesma equipa, o que lhe deu uma vantagem adicional. E mesmo quando mudou para o PSG teve (e tem) como co-pilotos jogadores como Mbappé e Neymar. Por tudo isto, foram “normais” os recentes êxitos de Messi e os pretensos falhanços de Ronaldo, mas tudo fica claro se perspectivarmos de acordo com os pontos fortes e fracos, perante os respetivos estádios de carreira. Ou seja, um Messi menos forte ainda é suficiente para contribuir decisivamente para uma vitória no Mundial, ao contrário de um Cristiano, já sem a maioria das armas que o fez chegar onde chegou.
A conclusão é que só podemos comparar o comparável: dois atletas fenomenais no auge das suas carreiras. Nos dois primeiros estádios aqui considerados, início e desenvolvimento da carreira, nenhum dos dois ainda tinha os instrumentos que fizeram deles os melhores. E no final de carreira, ser mais jovem beneficiou duplamente Lionel Messi, além das vicissitudes das trocas de clube e da paragem pelo covid. Enquanto o campo não esteve inclinado para nenhum dos lados, a questão fica em aberto e quem responde é a paixão por este jogo maravilhoso e subjetivo. Ronaldo ou Messi, cara ou coroa, Messi ou Ronaldo. Eu tenho um preferido, todos temos. Escolho alguém que é uma inspiração para a humanidade, desde os miúdos nas ruas das nossas cidades até aos confins da Ásia ou África, aquele que começou com pouco mais do que nada, sem a vantagem da intuição ou talento natural, transformando-se e esculpindo-se a si mesmo como uma obra de arte. Comparo Cristiano Ronaldo a um pintor e escultor, Miguel Ângelo, com a diferença de que o artista renascentista não conseguiu dar vida ao seu David. Outros podem ter outras razões para escolher Messi, mas perante o empate na razão, a paixão é o que importa."

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