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sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Por uma máquina de lavar


"Pelé aceitou jogar a primeira parte. Já não pisava um relvado há mais de um ano e não conseguiu sequer encontrar um par de chuteiras à sua medida.

Pelé terá sido, certamente, o primeiro jogador de futebol cujo nome se confundiu com o termo publicidade. Muitas das vezes em que me cruzei com ele foi quando fazia promoção dos patrocinadores de campeonatos do mundo, ou de marcas de refrigerantes, ou de cartões de crédito e outro material do qual se tornou embaixador, sobretudo após a sua experiência no futebol dos Estados Unidos. Uma vez contou-me que, em 1978 ou 1979, já tinha pendurado as chuteiras, se viu em Lagos, na capital da Nigéria, num evento promovido por uma gama de eletrodomésticos que coincidiu com uma digressão ao país do Fluminense. O ministro dos Desporto apressou-se a pedir-lhe que desse o pontapé de saída de um encontro entre o Flu e o Racca Rovers. Ele aceitou e a confusão instalou-se: uma estação de rádio anunciou que Pelé iria jogar durante 45 minutos com a camisola do Flu e, de um momento para o outro, numa excitação incrível, os mais de 30 mil bilhetes para o desafio estavam vendidos. Um sarilho. As autoridades nigerianas aproveitaram a aldrabice como puderam e não negaram a notícia. Pelo contrário. O ministro dos Desportos, até aí tão solícito, avisou Edson que se não jogasse não podia garantir a sua segurança no estádio que, naturalmente, ficaria cheio de gente com muito má vontade contra ele. Contrariado, mas também pressionado pela malta dos eletrodomésticos que viu, de um momento para o outro, uma simples apresentação pública transformada num acontecimento de estadão, Pelé aceitou jogar a primeira parte. Já não pisava um relvado há mais de um ano e não conseguiu sequer encontrar um par de chuteiras à sua medida. “Andei lá, de um lado para outro, no campo, com os pés doendo, sobretudo quando tinha de tocar na bola e o público pedia um golo. Não marquei nenhum. E, pela primeira vez até não me importei. Não contribuí mais ainda para a palhaçada”. No dia seguinte tinha um voo marcado para Dakar, tal e qual como a delegação do Fluminense. Pelé fez uma das suas fintas: trocou o voo e foi para Londres. Não ia correr mais riscos só por causa de uma máquina de lavar louça."

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